terça-feira, 4 de janeiro de 2011

O COSTUME? OU RUMAR AO CUME?

E agora, Manuel M. Carrilho, Sextante Editora/Porto Editora, Setembro 2010, 200 páginas, 14,85 euros na Book it/Modelo/Tomar

"Portugal poderia ser o exemplo escolhido para um manual de política económica dedicado ao tema "Como fazer tudo (ou quase tudo) ao contrário do que deveria ser feito". Provavelmente, também seria um bom exemplo para um manual de ciência política, ou ainda para outro de sociologia, subordinados à mesma temática geral.
Não me proporciona qualquer satisfação constatar que há muito que, em companhia de alguns outros economistas, historiadores, politólogos ou mesmo pragmáticos com sentido do interesse geral (recordo, em particular, Pedro Ferraz da Costa), tenho vindo a avisar para as consequências dos erros de sucessivos governos, de boa parte da nossa elite económica e financeira e, de facto, da maioria esmagadora dos meus concidadãos.
Durante 20 anos fizemos tudo ao contrário, na ilusão de que já éramos ricos (fomo-nos sentindo ricos, vivendo sempre acima das nossas posses, todos os anos desde 1994): engordámos a Função Pública (a partir da súbita e extrema generosidade do ano de 1991), tornámo-nos um país de proprietários endividados (aceleradamente após 1992), fomos criando um sistema de pensões insustentável e particularmente injusto para as gerações mais novas (desde 1980 e apesar das correcções de 2006, perdida a oportunidade de regeneração de 1997), incentivando muita gente em idade produtiva à madraça e à acomodação (após 1997), criando a ilusão de que basta um diploma qualquer para se ser útil e realizar com competência uma profissão (após 2005), ou enchendo o país de infra-estruturas subutilizadas ou simplesmente inúteis, promovidas por políticos incompetentes para gáudio de populações embrutecidas e de empreiteiros gananciosos. Infelizmente, esta é apenas uma brevíssima resenha do nosso desvario colectivo.
... ... ...
O país vive nas vésperas do embate final com o concreto. Ou seja, com a impossibilidade de financiamento externo que já não é autónomo desde, pelo menos, 2009, não o esqueçamos), num momento de verdadeiro estupor colectivo. O primeiro-ministro fez um discurso de Natal tão desfasado da realidade que não merece sequer comentário ou reacção, sob pena de se baixar irrecuperavelmente o nível do debate.
Os portugueses, na sua maioria, comportam-se como se tudo se mantivesse na mesma (com excepção da metade de milhão que constitui o primeiro contingente de baixas do regime), e vão lamuriando contra a maldade do governo que lhes corta salários ou benesses, mesmo quando convencidos que qualquer alternativa verdadeira lhes cortará salários e benesses. Os opinadores, em regra tão capazes quanto os políticos que regularmente fustigam, dedicam as suas excelsas inteligências a coisas tão extraordinárias como a validade dos famosos testes PISA, ou pura e simplesmente dizem mal de quase tudo e de quase todos. Propostas concretas, caminhos a seguir, em suma, o que fazer, nada; nicles! Os autarcas dão entrevistas lamentando a falta de dinheiro para as suas obras (que têm, em boa medida,servido a função social que o circo servia em Roma) e, finalmente, os aparelhos partidários preparam-se para defender ou tomar o poder, como se o seu exercício futuro fosse, em 2011 e nos anos que se lhe seguirão, algo semelhante ao que tem sido.
Perante tudo isto, não me restam dúvidas de que 2011 não só será colectivamente um ano muito mau, como, provavelmente, mais difícil do que se imagina. À dificuldade económica, à impossibilidade financeira, ao deslaçar das estruturas sociais, acresce algo de consequências imprevisíveis e que afectará a maioria dos portugueses: o difícil acordar do estupor em que têm vivido para o pesadelo em que todos já entrámos, só alguns sentimos e poucos ainda percebemos."

António Nogueira Leite, SOL, Economia e Negócios, 30/12/10
(Nogueira Leite é economista e militante do PSD)

"... ... Estas são algumas ideias que, entre muitas outras que se podiam avançar, mostram como é possível -se quisermos-  colocar Portugal na senda da construção de um projecto colectivo. E isso é, neste momento, o mais importante -deixarmos de ser o país onde nada parece possível, que resiste à mudança e à prestação de contas, que desconfia do risco e da inovação, para nos tornarmos num país de projecto. Como recentemente dizia Eduardo Lourenço, em entrevista ao jornal PÚBLICO, (05/04/2010), precisamos de "um projecto de âmbito nacional, não subordinado aos proveitos de ordem quase privada da classe política", um projecto que possa repor "a representação simbólica de Portugal à altura da nossa própria História. Quer na ordem interna, quer na ordem externa".
Numa época que resiste aos voluntarismos e já não se ilude com vanguardismos de espécie alguma, chegou a hora do desassombro: estamos num momento em que se vai decidir o nosso destino por muitas décadas. E ou a humildade, o trabalho, a competência o diálogo e a criatividade se impõem, ou nada nos poupará ao declínio, como povo e como nação. A escolha será nossa."

Manuel Maria Carrilho, obra citada, Paris, Maio de 2010
(Carrilho foi ministro  da cultura e é militante do PS)

Como habitualmente, o negrito é da responsabilidade de Tomar a dianteira e indica as passagens com as quais estamos mais de acordo e que melhor se aplicam à realidade tomarense, mediante as indispensáveis adaptações (autarcas em vez de políticos, presidente da câmara em vez de primeiro-ministro, cidade/concelho em vez de país/nação, projecto local em vez de projecto nacional, etc.

9 comentários:

Anónimo disse...

Estes homens,HOJE,no pós poder,têm CARRADAS DE RAZÃO.

Mas a MEMÓRIA é TERRÍVEL!

Ocorre-me à memória o Carrilho-ministro de Guterres que gastou 60.000 euros na remodelação do WC do seu gabinete ministerial.

Sou assaltado pelo Nogueira Leite-secretário de Estado de Guterres,co-responsável directo do que agora critica como nóvel dirigente do PSD.

E fico na retranca,desconfiado,inseguro.

INTERROGO-ME :

Porque não foram PRATICANTES quando estiveram sentados nas cadeiras do PODER?

Será que apenas querem aliviar a má conciência e distrair-nos da sua praxis.

É que eu CONCORDO com tudo o que dizem agora.

NÃO CONCORDO é com o que fizeram enquanto governantes,enquanto senhores do poder,enquanto co-responsáveis não assumidos do que agora JUSTAMENTE CRITICAM.

A BOTA não dá com a PERDIGOTA!

HAJA VERGONHA!
HAJA COERÊNCIA!
HAJA PUDOR!

Anónimo disse...

"
Os autarcas dão entrevistas lamentando a falta de dinheiro para as suas obras (que têm, em boa medida,servido a função social que o circo servia em Roma) e, finalmente, os aparelhos partidários preparam-se para defender ou tomar o poder, como se o seu exercício futuro fosse, em 2011 e nos anos que se lhe seguirão, algo semelhante ao que tem sido.
"

- Desenganem-se os que pensam que tudo irá continuar na mesma. Acordai para a cruel realidade dos números e da falta de financiamento. Bem vindos ao insustentável mundo dos serviços e das infra-estruturas que o povo não irá querer manter. Bem vindo aos anos da degradação dos bens coletivos porque na maior parte dos casos não foram desejados.
Afinal, quando não há dinheiro não há vícios...

Anónimo disse...

Para anónimo em 11:33

O seu comentário, cheio de razão, é porém de um rancor, de uma intransigência que assusta. Acha realmente que quem pecou uma vez, ou mesmo várias, nunca mais se vai emendar? Por exemplo a presidentA Dilma, que a dado passo da sua vida andou de arma na mão, agora que foi eleita, vai outra vez assaltar bancos para conseguir fundos para o seu partido?
O Manuel Alegre, se fosse eleito, ia outra vez apelar à revolta contra o regime para a rádio de Argel?
E o Fernando Nobre, a ser eleito iria montar uma ONG médica no Palácio de Belém?
As pessoas são um produto da história, ajudam a fazer a sua própria história, agem e mudam em função do contexto. Se assim não fosse, esta vida seria de uma chateza sem fim.
Contestar, sim! Perder a esperança nas eleitoras e nos eleitores, nunca!

Anónimo disse...

"
A Europa, em 25 anos, fez de nós um país de caloteiros e agora pede o impossível: que paguemos.
"
Pedro Tadeu, DN, 4-01-2011

Anónimo disse...

Resposta ao Dr. Rebelo:

UM metro tem 100 cm,sempre!

Não tem 80 ou 110,conforme as conveniências circunstanciais.

Confundir "rancôr e intransigência que assusta" com MEMÓRIA E COERÊNCIA sobre factos e actos praticados há meia dúzia de anos,no mesmo ciclo político,é INQUALIFICÁVEL!

Socorrer-se dos exemplos de DILMA ROUSSEF ou de MANUEL ALEGRE num quadro de luta contra ferozes ditaduras e ditadores,é INTELECTUALMENTE DESONESTO.

É A MAIS ABJECTA DEMAGOGIA!

IMPRÓPRIA de um indivíduo com formação académica superior e que chegou a ser professor.

Infelizmente COERENTE com muitas outras baboseiras em que é pródigo.

Por isso não é RESPEITADO.

Por isso é REJEITADO por todas as forças e movimentos políticos,SEM EXCEPÇÃO.

Não passa de um BOBO que faz falta na Corte.

Para gáudio e divertimento das ELEITORAS e ELEITORES.


Se o meu estilo directo e frontal,porventura cáustico,lhe fizer azia...temos pena!

Rodriguinhos e punhos de renda não são o meu forte.

Anónimo disse...

Para anónimo em 15:54

O anonimato facilita o trânsito entre cada homem e o lobo que nele vive. O que me parece que fundamentalmente nos separa é a posição oposta face à relatividade das coisas. Talvez também falta de cosmopolitismo, de mundo, para usar um termo mais corriqueiro. Quiçá se tivesse percorrido, como eu fiz, a URRS enquanto existiu e a Rússia actual, bem como os USA e todos os países ditos socialistas que restam, excepto a Coreia Norte, é muito provável que a sua autoproclamada e louvada coerência fosse menos exacerbada, menos inquinada por 300 anos de inquisição, mais tolerante em suma. Mas pronto, cada um é como cada qual. Não tenho o direito de o julgar, nem enveradarei pelo seu estilo grandiloquente, que de resto não aprecio. Quanto à feroz ditadura portuguesa, para usar os seus próprios termos, também cá vivi nesse tempo e até fui obrigado a emigrar para não morrer de fome. Muitso tomarenses ainda se lembram disso. Sei, por conseguinte, do que estou a falar. Em qualquer caso,sendo condenável e ilegítima, causou incomensuravelmente menos mortos que o regime do camarada Estaline, por exemplo.
Sobre as suas repetitivas apreciações negativas a meu respeito, que já vêm de longe, pense o que quiser. Mas olhe que o facto de as dizer não significa de modo algum que seja verdade ou que tenha razão. Mostra apenas uma doentia tendência para tomar os seus desejos por realidades, sendo um sintoma de evidente paranóia, que convinha ser debelada quanto antes, para seu bem, pois denotam óbvia perda de contacto com a sociedade envolvente.

Cordialmente,

António Rebelo

Anónimo disse...

ESSA DE RUMAR EM DIRECÇÃO AO CUMA LEMBRA-ME UM POEMA "FAST FOOD" QUE É...MAIS OU MENOS ASSIM:

No cimo daquele cume mandei plantar uma roseira.
Quanto mais a rosa abre,
Mais o cume cheira!

Anónimo disse...

O mal deste blogue é que o seu administrador, quando confrontado, depressa o transforma numa discussão de comadres desavindas.

Anónimo disse...

Sr. Dr. Rebelo,

No seu comentário das 16:39 de ontem,fez-me várias acusações.

Respondi-lhe sem papas na língua,sem floreados barrocos,como é meu hábito.

Presumo que,pela censura e não publicação,não lhe terá agradado.

Tocou-lhe nos "parentes",foi?

Mas eu não fui educado para lhe agradar e fazer vénias.

Se esse é o seu conceito de democracia,proíba os comentários,como fazem outros demócratas.

É mais coerente!

A censura de Salazar não se escondia. Vinha,preto no branco,escarrapachado na 1ª página dos jornais:

ESTE NÚMERO FOI VISADO PELA CENSURA

E o que é que ele mandava censurar?

Todas as notícias que pusessem em causa as suas teses ou a sua figura.

E o que é que o demócrata Rebelo censura? Com que critérios?

EXACTAMENTE OS MESMOS !

NOTA - Se for mais um comentário censurado,pode crer que não vou desistir de dar combate cerrado a estes seus comportamentos