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sexta-feira, 4 de novembro de 2011

"O Titanic do Ocidente"

Foto inserida por Tomar a dianteira

Na sua habitual crónica "Viver para contar", o director do SOL José António Saraiva escreve esta semana sobre os sinais de decadência nas sociedades do tipo ocidental. Dado tratar-se de um trabalho demasiado extenso para um blogue, cita-se apenas a metade final.

"O quadro de valores e de referências em que nos movemos mudou radicalmente. A família, por exemplo, deixou de ser uma instituição a preservar. A percentagem de divórcios já iguala a de casamentos. Só que isto, aplaudido por alguns, é um drama tremendo para a esmagadora maioria.
A família é o primeiro veículo de integração de um indivíduo na sociedade. E o primeiro apoio de que um indivíduo dispõe em situações adversas, quer ao nível material quer no plano afectivo. A família é uma rede -que ampara o indivíduo quando cai, como ampara o trapezista  quando falha o trapézio. A  destruição da família entrega as pessoas a si próprias, ainda por cima num ambiente muito competitivo como é a selva urbana em que se tornaram as grandes cidades- e daí as depressões, as exclusões, os suicídios, que aumentam regularmente.
A família também é essencial para o crescimento equilibrado das crianças. É a família que lhes oferece um ambiente estável e lhes transmite segurança. Uma sociedade de família desestruturadas começa a produzir crianças problemáticas.
A legalização dos casamentos gay, com a aceitação explícita de casais estéreis, foi mais um sinal do esvaziamento da ideia de "família" nos tempos que correm.
E os problemas das famílias prolongam-se nas escolas, sendo responsáveis por fenómenos como a indisciplina nos estabelecimentos de ensino, que se tornou uma praga. Assistimos a alunos a agredirem professores em plena sala de aula -o que não devia sequer poder passar pela cabeça dos alunos quanto mais poder acontecer.
E a seguir vêm as drogas, o consumo crescente de drogas, com o seu rosário de problemas. Drogas que têm como objectivo explícito a alienação, a fuga à realidade, a marginalização do quotidiano. E depois temos a inscrições nas paredes, os gangues suburbanos, o aumento da criminalidade. E assistimos ainda ao aumento dos desvios sexuais: multiplicam-se os travestis, os transexuais, as trocas de casais (o swing), para já não falar da pedofilia.
A ostentação da homossexualidade tornou-se também uma moda. Em Paris, jovens homossexuais descem o Boulevard Saint Michel ou os Campos Elísios de malas femininas penduradas nos braços, imitando as senhoras.
Todos os sinais aqui apontados, repito, são peças de um mesmo puzzle e são típicos das sociedades em crise. E não adianta fechar os olhos nem vale a pena lutar contra o inelutável. Os economistas, os financeiros, os políticos esmifram-se a procurar "saídas para a crise". Mas a crise não tem saída porque a questão não é económica e financeira: a crise económica e financeira em que estamos mergulhados  é apenas um dos sintomas do descalabro geral.
Já percebemos que temos de nos habituar a viver com menos. Mas o grande problema não é esse. Antes fosse...
O grande drama é que o mundo onde cada um de nós julgava que iria viver sempre, entrou numa decomposição acelerada. O barco onde navegámos durante séculos chegou ao fim do prazo de validade e está a afundar-se. E isso vê-se em tudo. Basta abrir os olhos. Vê-se no afundamento cultural -com a desqualificação da pintura, da escultura, da literatura e da música. Vê-se na desvalorização do casamento e na desagregação da família. Vê-se na desagregação da autoridade e da disciplina, particularmente nas escolas. Vê-se nos desvios sexuais, na proliferação das drogas, na perda de valores e de referências positivas.
E tudo isto é simbolizado pelos jovens com os quais comecei este artigo: esses jovens vestidos de preto, com a pele furada por argolas e manchada por tatuagens, que parecem os corvos anunciadores da desgraça. Aves de mau agoiro."

José António Saraiva, SOL - Revista TABU, 04/11/11, páginas 72/73