domingo, 3 de fevereiro de 2013

Resposta à Odete

Minha amiga:

Como vai a cidade, perguntas tu. E perguntas bem. A situação não está para brincadeiras e as pessoas disso não se dão conta. Por enquanto? Tenho a impressão que anda tudo um bocado desorientado. O que tende a agravar ainda mais a coisa. Só para te dar um exemplo, aconselho-te a ida a vamosporaqui.blogspot.pt Aí verás um conhecido dirigente partidário local a mostrar já algumas saudades do Sócrates. A tal ponto que até manifesta simpatia política por um outro, por acaso um militante do PCTP/MRPP, porém ferrenho adepto socratino. Com trinta cabazes de melancias!
A mim o que me preocupa não são tanto essas derrapagens pessoais. É a situação bloqueada em que  se encontra esta terra. Repara: enquanto algumas cabeçorras abalizadas alertam para o facto de estarmos face a uma mudança de civilização e já não frente a uma crise, mesmo grave, aos tomarenses que saídas nos oferecem? Os dois grandes partidos do arco do poder, PSD e PS, são controlados pelas cúpulas nacionais, através dos dirigentes distritais, tal como acontece com todos os outros. O que já não faz qualquer sentido, tendo em conta que de facto os distritos só subsistem para fins partidários e eleitorais. Até os governadores civís já foram dar uma volta ao bilhar grande.
Se dúvidas houvesse a tal respeito, bastaria atentar no processo de escolha dos candidatos já conhecidos para Outubro próximo. No PS, uma Comissão Política de contornos algo indefinidos no que toca à sua eleição, composição e funcionamento, escolheu novamente um discípulo do usual dono da casa, neste caso uma discípula, uma vez que se trata da sua própria companheira. A escolha, depois votada no Convento de Cristo à moda da Coreia do Norte, mereceu a bênção do presidente da distrital, que estava presente. Agora só falta conhecer a amplitude do desastre eleitoral, salvo muito improvável surpresa.. Logo se verá.
Já no PSD, parece ter havido mais ousadia. Pelo menos, a respectiva Comissão Política arriscou indicar um candidato com as mãos limpas. Um militante alheio às lides autárquicas tomarenses dos últimos quinze anos, que até já agoniam muitos nabantinos. Pois não lhes valeu de nada! Foram chamados a Lisboa, repreendidos e forçados a aceitar, como futuro cabeça de lista, o actual alcaide em exercício. Queres melhor prova do desprezo que têm pelos eleitores locais? Se até o Portas afirma que são os militantes da terra que melhor sabem o que lhes convém...
Há, é certo, uma formação política independente, não subordinada a este tipo de abusos do centralismo partidário, acoitado na obsoleta lei eleitoral em vigor. Infelizmente, até agora de pouco ou nada nos serviu essa relativa autonomia local. Os dois mandatos já quase concluídos mostram, sem margem para dúvidas, que caso não integrassem o executivo, o resultado seria praticamente idêntico. O que evidencia a sua redundância, para não dizer inutilidade.
E não podia ser de outro modo. Mesmo dispondo da maioria, nunca a actual oposição conseguiu entender-se de forma durável e produtiva, apesar de ambos os grupos proclamarem a defesa dos interesses locais, é verdade que abstendo-se sempre de especificar quais. Acresce que nenhuma das três formações do presente executivo dispõe de qualquer roteiro político, adaptado ou não ao novo contexto. Parece-me que estão lá apenas para marcar presença, evitar fazer ondas e auferir as respectivas retribuições, enquanto for havendo dinheiro para lhes pagar. 
Restam as pequenas formações, com votações locais inferiores a 10%. Das situadas à esquerda do PS não adianta aguardar por eventuais façanhas, posto que, previsivelmente, se limitarão a animar a campanha eleitoral primeiro, as sessões da AM depois. O habitual. Quanto ao CDS, anda tudo muito calado, excessivamente calado. E começa a fazer-se tarde para uma pré-campanha vertebrada, sem a qual também não irão longe. A menos que haja coligação. Nesse caso teremos um daqueles pares de antigamente, só que agora com um coxo e um moço.
Nestas condições, achas que se deve ir votar? Em quem? Em quê? Para quê?
É isto, querida amiga. Está um frio dos diabos e nada mostra que em termos políticos as coisas venham a aquecer até Outubro. Depois, julgo que será a continuação da nossa funesta via dolorosa. "Eles não sabem nem sonham/que o sonho comanda a vida/que sempre que um homem sonha/o Mundo pula e avança/como bola colorida/entre as mãos de uma criança", escreveu Gedeão na Pedra Filosofal. A tragédia tomarense -a nossa tragédia, Odete- radica no facto de termos políticos e eleitos que nem sequer sabem que não sabem.
Vai ficando por Leiria, que é terra mais abrigada, mais próxima do mar largo, menos virada para o que já foi e por isso menos bloqueada.

Taciturnamente,

A.R.



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