segunda-feira, 1 de julho de 2013

Para os crentes mais teimosos...

Para os crentes mais teimosos, nada melhor que a palavra do próprio Cristo. Neste caso de Alexandre Homem Cristo:

Foto Philippe Wojazer/Reuters

-Qual é a pressa? Sim, qual é a pressa?!?


"Hollande: obituário de uma fé socialista

A queda de Hollande arrasta consigo toda uma fé socialista que apregoava a solução do investimento público e do optimismo para vencer a crise

Quando foi eleito presidente da república francesa, François Hollande elevou a sua vitória a "uma grande data para a França, um novo início para a Europa e uma nova esperança para o mundo". As expectativas não podiam portanto ser mais altas. De tal modo que a esquerda (francesa, portuguesa e europeia) ficou extasiada. Eufórica mesmo. Nas palavras de António José Seguro, com Hollande chegara a "nova primavera para os povos europeus". Ora isto foi há 14 meses.  O que mudou entretanto? Quase tudo. Após a euforia inicial, veio a queda: um ano depois, Hollande viu-se com os mais baixos índices de confiança de que há memória (24%).
Enquanto candidato presidencial, François Hollande multiplicou-se em promessas a dois níveis. Primeiro, recuar em várias medidas impopulares de Sarkozy (uma abordagem populista). Segundo, dar um novo fôlego no combate à crise europeia, sem recorrer à austeridade (uma abordagem irrealista). Em boa verdade, e para infortúnio dos franceses, cumpriu a primeira parte. Acabou com a regra da contratação no Estado de apenas um funcionário por cada dois que saíssem. Reduziu a idade da reforma novamente para os 60 anos. E entregou na Assembleia a legislação para a contratação de 60 mil funcionários no sector da educação. Três medidas emblemáticas que significam um aumento acentuado da despesa do Estado.
Mas a sua esperada incapacidade em cumprir a segunda parte do seu compromisso eleitoral foi-lhe fatal. No plano europeu, não conseguiu negociar o Tratado Orçamental Europeu, nem impor os eurobonds, e muito menos mudar o rumo da política económica europeia. E por isso, no plano interno, apesar dos discursos contra as políticas de austeridade, impôs um aumento recorde de impostos, evitando os cortes na despesa do Estado. Assim, tudo somado,  (aumento da despesa do Estado, adiamento de reformas estruturais e aumento de impostos), a França está oficialmente em recessão, com o desemprego a subir e a atingir níveis só comparáveis a 1998. Os avisos acumulam-se.
Em termos de finanças públicas, a Cour des Comptes (o Tribunal de Contas francês) foi clara: são necessárias medidas de urgência. E já sem margem do lado dos impostos, é obrigatório arranjar soluções para a redução  da despesa pública -nomeadamente reduzir o número de funcionários públicos, congelar salários e bloquear progressões nas carreiras (ou seja, o contrário do que Hollande fez). Por outro lado, em termos políticos, a subida do Front National [extrema-direita nacionalista] foi um óbvio sinal de alarme. E a resposta do governo francês, que pela voz do ministro da Recuperação Produtiva (a ironia do cargo diz tudo), em vez de assumir a sua incompetência, responsabilizou Durão Barroso pela subida da extrema-direita, foi o sinal que faltava para confirmar o desnorte.
Já ninguém, mesmo entre os seus seguidores iniciais, tem dúvidas: atropelado pela realidade, Hollande é hoje um cadáver político. Não há aqui motivo para celebrações: a evolução da situação francesa é também determinante para o futuro europeu e, forçosamente, para o português. Mas, se a situação tem um lado preocupante, tem também um outro lado útil, pois a queda de Hollande arrasta consigo toda uma fé socialista que apregoava a solução do investimento público e do optimismo para vencer a crise. Que o caso sirva, pelo menos, de lição aos socialistas portugueses, e que estes deixem, por fim, de ser o bloqueio às necessárias reformas de que o país carece. Se assim acontecer, a morte política de Hollande não terá sido em vão."

Alexandre Homem Cristo, investigador, jornal i, 01/07/2013


Sem comentários: