terça-feira, 17 de maio de 2011

A GRÉCIA TERÁ DE REESTRUTURAR A DÍVIDA

Irlanda e Portugal na corda bamba


"O mecanismo europeu de financiamento indefinido das dívidas soberanas é ineficaz. A zona euro tem de encontrar outra solução."

"É conhecida a história daquele homem condenado à morte pelo seu rei, a quem este promete salvar a vida, caso ele consiga ensinar o cavalo do monarca a falar em menos de um ano. O condenado aceitou e logo lhe perguntaram porque aceitou semelhante desafio. "Porque tudo pode acontecer. O rei pode morrer entretanto; eu posso ir parar ao cemitério e até o cavalo real pode muito bem aprender a falar. Nunca se sabe!"
A atitude dos governantes da zona euro perante as crises orçamentais é semelhante. Resolveram ir dando tempo ao tempo, esperando que os países endividados acabem por conseguir restabelecer a sua solvência. Até agora falharam: em vez de diminuir, o custo dos empréstimos é cada vez maior. No caso da Grécia, as hipóteses de conseguir obter de novo empréstimos privados em condições aceitáveis, são ínfimas. Mas continuar a protelar o dia em que terão de ser admitidas tais dificuldades, não melhora mesmo nada a situação grega. Pelo contrário. Tornará ainda mais dolorosa a inevitável reestruturação da dívida.
A dívida soberana grega já ultrapassa nesta altura 160% do PIB. Infelizmente, poderá aumentar ainda mais. A Grécia poderá não conseguir atingir os seus objectivos orçamentais, seja devido ao impacto negativo das medidas de austeridade sobre a economia, seja por causa das resistências às medidas já tomadas. A desvalorização real necessária para restabelecer a competitividade provocará  o aumento do racio da dívida em relação ao PIB, mas não proceder a essa depreciação poderá dificultar ou até tornar impossível a ansiada retoma. Se entretanto o euro subir em relação ao dólar, a degradação da competitividade grega acentuar-se-á. Enfim, como as desgraças voam sempre em esquadrilha, os bancos podem muito bem cessar o seu apoio à economia.
Tendo em conta o peso da dívida, as possibilidades do governo grego se financiar nos mercados em condições que permitam a sua redução, são extremamente fracas.
Imaginemos que a taxa de juro da dívida grega a longo prazo é de 6%, em vez dos 16% actuais. Imaginemos também que o PIB nominal cresça 4%. Trata-se, como é óbvio, de hipóteses extremamente optimistas. Pois mesmo nestas condições, só para estabilizar a dívida, o governo grego teria de conseguir um excedente primário (antes do pagamento dos juros da dívida) equivalente a 3,2% do PIB. Para que a dívida grega se situasse até 2040 abaixo de 60% do PIB, limite fixado pelo Tratado de Maastricht, o país teria de conseguir um excedente primário de 6%, o que implicaria que o povo grego aceitasse, livremente ou pela força, pagar bastante mais em impostos do que aquilo que recebe sob a forma de despesas públicas.
Nada conseguiria convencer os investidores que uma tal perspectiva é plausível para justificar o financiamento da Grécia. E não esqueçamos que 6% seria um spread inferior em pelo menos três pontos em relação aos títulos alemães. Mesmo sem considerar que o risco de incumprimento é muito elevado, tal hipótese é pouco ou nada atractiva.
Em resumo, a Grécia está perante um dilema insolúvel: os credores sabem que o país não dispõe da credibilidade necessária para conseguir nos mercados empréstimos com taxas de juro suportáveis. Continuará portanto a depender de montantes cada vez maiores de financiamento oficial (FMI, BCE, UE). O que lhe arma uma ratoeira ainda mais grave.
Imaginemos que metade da dívida grega esteja nas mãos de credores oficiais. Suponhamos também que a redução da dívida, indispensável para conseguir empréstimos em condições aceitáveis nos mercados privados, seja de 50% do seu valor nominal. Neste caso os credores privados seriam eliminados. Perante um tal risco, nenhum investidor responsável aceitaria propor dinheiro em condições suportáveis. Por conseguinte, a recompra da dívida grega pelas instituições oficiais torna ainda mais improvável o regresso ao financiamento privado.
Caso se aceite a posição avançada por Lorenzo Bini Smaghi, um membro italiano influente do directório do BCE, segundo a qual deve ser afastada qualquer hipótese de reestruturação da dívida grega, então será necessário que as fontes oficiais financiem a Grécia indefinidamente. Além disso, terão de aceitar fazê-lo em condições assaz generosas, que tornem possível a redução a longo prazo do peso da dívida. É possível. Mas seria um verdadeiro pesadelo político. A Grécia perderia, durante um período indefinido, quase toda a soberania e os ressentimentos mútuos atingiriam o ponto de ebulição. Além de que os membros não europeus impediriam o FMI de semelhante generosidade por tempo indeterminado. O fardo cairia então nos ombros dos europeus, sendo pouco provável que fosse possível preservar a longo prazo o indispensável consenso.
A alternativa seria uma reestruturação preventiva da dívida, que poderia fazer-se já em 2012. Uma vez que os mercados nos indicam que é isso mesmo que esperam, tal decisão não deveria perturbá-los. Uma reestruturação deveria idealmente melhorar a solvabilidade do país e dar uma boa ajuda às incitações aos investidores, tendo em vista o apoio a um programa de estabilização e de reformas. Além disso, graças a uma reestruturação preventiva planificada, as autoridades poderiam preparar igualmente o apoio de que os bancos necessitam, tanto na Grécia como no exterior.
Há muitas maneiras de reestruturar uma dívida, algumas mais coercivas do que outras. Felizmente, 95% da dívida soberana grega foi emitida no quadro do direito nacional, o que deveria em princípio reduzir os problemas jurídicos resultantes da implementação de uma profunda reestruturação.
Mas é útil lembrar que isso provocaria ainda assim problemas graves. E nada garante que semelhante operação recolocaria a Grécia na via do crescimento económico, uma vez que o país sofre igualmente de falta de competitividade.No quadro da zona euro, não existe qualquer método simples para aumentar a competitividade, pelo que a Grécia poderia estar condenada a uma longa deflação.
Por muito impopular que seja a hipótese de uma reestruturação, a alternativa ainda seria pior. A dívida pública teria então de ser financiada indefinidamente. Outros países periféricos -como a Irlanda e Portugal, por exemplo- seriam afastados durante muito tempo dos mercados privados. Dada a extrema dificuldade das situações à partida, um regresso à saúde orçamental não está de forma alguma garantido, tanto num caso como no outro.
Os países sobre-endividados na sua própria moeda sofrem da inflação. Mas os países que obtêm empréstimos em divisas são arrastados para o incumprimento. Integrando a zona euro, os países membros transitaram de uma situação para a outra. Caso se afaste qualquer reestruturação, os maiores e mais fortes Estados terão de financiar e de disciplinar os mais pequenos e fracos. E terão de o fazer até que os cavalos aprendam a falar. É esse o futuro que desejam?


Martin Wolf, Financial Times/Le Monde Economie, 17/05/2011, página 2
Negrito de Tomar a dianteira

3 comentários:

Anónimo disse...

E Portugal irá reestruturas a seguir... Até Passos Coelho já o dá a entender quando diz que não iremos conseguir suportar os juros da dívida.

Anónimo disse...

Julgo que ainda ninguém percebeu que o melhor para Portugal e Grécia dois destinos turísticos de excelência é fazer junto do povo alemão uma grande pressão mediática para vender, e porque não a preços que igualem as mais-valias dos BMWs,os nossos destinos turísticos; é que só com uma grande invasão dos alemães é que nós poderemos resolver a diferença na balança de transacções.

Anónimo disse...

FRANCISCO LOUÇÃ ENGANOU-SE NAS CONTAS

Francisco Louçã atirou Passos Coelho ao tapete quando extrapolou a dívida do Jornal da Madeira para a dimensão populacional do país, referindo que aquela dívida seria equivalente a 250 milhões de euros, ou seja, cinco vezes mais. Mas o número é bem maior do que o referido pelo líder do BE, Francisco Louçã enganou-se nas contas, se usarmos números redondos a Madeira tem quase 250 mil habitantes e a população portuguesa é de pouco mais de 10 milhõe e meio, então os 50 milhões de euros deveriam ser multiplicados por 42. Isto é, o equivalente nacional da dívida do pasquim do PSD pago pelos contribuintes seria de 2.100 milhões de euros!

Seria muito interessante comparar a dívida da RTP com a do Jornal da Madeira.

Aditamento:

Agora, aplique-se o mesmo critério à dívida da Madeira, mesmo esquecendo que parte da dívida portuguesa inclui essa mesma dívida e que uma parte da despesa do Estado na Madeira é suportada pelo governo da República. A dívida da Madeira atingia 683,4 milhões de euros no final de 2009, nesse ano aumentou 37,6% (!!!) em relação a 2008. Em 2009 a dívida atingia os 863,9 milhões de euros, tendo crescido 17,6% em relação a 2009.

Além desta dívida o governo regional assumiu ainda a responsabilidade financeira por 1195,2 milhões de euros sob a forma de garantias, deste montante 93% refere-se a avales a empresas públicas.

Recorde-se que para além deste endividamento a Madeira recebe do país recursos muito superiores aos das outras regiões que não contam com governos regionais que recorrem sistematicamente à chantagem independentista.

Se multiplicarmos o montante da dívida de 2009 (o aumento dos dois anos seguintes é um bónus para o Alberto) por 42 obtemos a bela quantia 36.283,8 milhões de euros, isto é metade do montante do resgate que o governo negociou com a troika! E quanto a garantias teríamos a enormidade de 50.198,4 milhões de euros, quase tanto como o montante do resgate! Resta agora saber qual o montante total da dívida das empresas, isso no pressuposto de que as contas da Madeira não estarão aldrabadas, isto é, que não existem mais esqueletos no armário nem que uma parte tenha sido varrida para debaixo do tapete.

Agora imagine-se que todos os distritos do país eram governados à Alberto João e façam-se as contas. Pois, para os responsáveis do PSD que tanto falam da Madeira esta região já é independente, pelo menos na hora de gastar sem qualquer controlo.

Compreende-se o empenho de Alberto João numa vitória da direita, depois de ter ridicularizado Passos Coelho no último congresso do PSD. se a direita conseguir uma maioria absoluta, um cenário cada vez menos provável, o governo ficará nas mãos dos deputados do Alberto João no parlamento, voltamos ao tempo da primeira maioria absoluta de Cavaco Silva quando estes mesmos deputados chantageavam o agora Presidente da República sempre que era apresentado um Orçamento de Estado."
O JUMENTO