sábado, 1 de junho de 2013

Política às avessas

"Je t'aime...moi non plus!"

É bem conhecido o dito segundo o qual "O país é Lisboa, o resto é paisagem". Exagerado sem dúvida. Em todo o caso energicamente desmentido com trabalho produtivo pelos nortenhos. Mas por vezes de uma cruel realidade. Como agora, em plena crise. 
Culminando uma daquelas vagas subterrâneas que os sociólogos talvez um dia consigam explicar, a quase totalidade da fina-flor política alfacinha resolveu reunir-se para proclamar que o PR não está à altura do cargo e que o governo deve ser demitido ou derrubado quanto antes, indo-se para eleições legislativas intercalares. Porquê? Simplesmente porque a situação sócio-económica é cada vez mais desconfortável. A tal ponto que, entre outras barbaridades, vejam bem! o governo até foi constrangido a cortar umas centenas de milhares de euros na subvenção anual à Fundação Mário Soares. Que  descaramento! Ousar ir à bolsa de um dos monumentos do regime...
Certo certo é que uns por isto, outros por aquilo, quase todos lá estiveram, abstendo-se no entanto de enunciar de forma clara a argumentação para a ansiada queda do governo PSD/CDS, (que dispõe de sólida maioria na AR), ou sequer a nova política global, caso a esquerda unida (???) viesse a vencer as inevitáveis eleições subsequentes. (Renegociar o memorando? E a troika iria nisso? Influenciada pela Senhora de Fátima?). À portuguesa, em suma: Avançamos! Depois logo se vê! A gente logo se desenrasca!
Mais sensatos e menos desenrascados, embora com problemas semelhantes, os nossos vizinhos ibéricos começam a trilhar outro caminho, imposto pela dura realidade. O líder socialista Rubalcaba, do PSOE, já se declarou disponível para pactar com o governo PP um acordo de entendimento global, tendente a enfrentar a crise com maiores possibilidades de êxito. Outros ares, outras ideias. Hay que hablar, coño!
Mas nem é preciso olhar além-fronteiras para encontrar atitudes opostas perante a maior crise de sempre do sistema capitalista. Em Tomar, a apenas uma hora de Lisboa, o microcosmo político local insiste em agir às avessas. À moda dos caranguejos, como é usual.
Mesmo com um executivo municipal minoritário e desacreditado, candidatos pouco credíveis, ausência de programas pertinentes e a poucos meses da próxima consulta eleitoral, em vez de procurarem unir-se, adoptando um programa robusto e realista, não senhor! As forças políticas locais continuam a fazer finca-pé no individualismo bacoco e sem perspectivas. No estado actual das coisas, tudo indica que em Setembro ou Outubro vamos ter  cinco ou seis listas concorrentes. Para um mini-eleitorado de 38 mil inscritos, mais de metade nem sequer irá votar, por evidente falta de escolha. 
Tendências suicidas? Também não é caso para tanto. Mas que a situação nabantina é cada vez mais desesperada, a  exigir terapêutica eficaz e urgente, disso não há dúvidas!

2 comentários:

templario disse...

DE: Cantoneiro da Borda da Estrada"

Em Espanha não há troika; nem a esquerda nem a direita berraram por ela. Pelo contrário. E isso faz toda a diferença.

Há quem escreva sobre isso muitíssimo melhor que eu.

Ontem no Diário Económico:

Pedro Silva Pereira, Em defesa de Lobo Xavier e Pacheco Pereira:

"Vítor Gaspar sentiu-se atingido por Lobo Xavier e Pacheco Pereira terem reconhecido, com honestidade, que a verdadeira razão que levou Portugal a ter de pedir ajuda externa foi o assalto ao poder lançado pela direita com a rejeição do PEC IV, que tinha recebido o apoio do BCE e dos nossos parceiros europeus.

A resposta de Gaspar insiste na falsificação da história.

O ministro das Finanças aproveitou a sua ida ao Parlamento para responder aos comentadores da direita na Quadratura do Círculo e contrapor que o Governo socialista devia ter pedido ajuda externa mais cedo. Acontece que a historieta de Vítor Gaspar não tem qualquer fundamento na verdade histórica: Lobo Xavier e Pacheco Pereira é que têm razão.

Em primeiro lugar, Gaspar passa ao lado do argumento principal de Lobo Xavier e Pacheco Pereira, que se refere à própria necessidade do pedido de ajuda: se havia uma garantia formal (escrita) de apoio do BCE e da Comissão Europeia ao PEC IV, a aprovação desse PEC podia ter evitado o pedido de ajuda externa, garantindo junto dos mercados financeiros uma protecção do BCE análoga à que é dada a outros países poupados a um resgate. Podemos todos especular sobre o que teria acontecido se essa solução tivesse sido adoptada, o que não podemos é adulterar a história: a alternativa ao resgate existia, tinha apoio europeu e foi rejeitada. Como confirmou Carlos Costa, Governador do Banco de Portugal, ao Público (1-4-2012): "Testemunhei que a Comissão Europeia e o BCE não queriam que Portugal fizesse um pedido de assistência financeira, igual ao grego e ao irlandês, e estavam empenhados na aprovação do PEC IV".

Sendo estes os factos, a conclusão de Lobo Xavier e Pacheco Pereira está certa: o pedido de ajuda externa não era uma inevitabilidade, foi, isso sim, uma escolha das lideranças do PSD e do CDS que, na ânsia de chegarem ao poder, optaram por rejeitar o PEC IV e desprezar o apoio europeu, mesmo sabendo as consequências dramáticas que isso iria ter junto dos mercados financeiros.

Em qualquer caso, Vítor Gaspar também não tem razão quanto ao ‘timing' do pedido de ajuda. Comecemos por recordar as datas: o "chumbo" do PEC IV foi anunciado por Passos Coelho na noite de 11 de Março de 2011. A partir daí, tudo se passou rapidamente: a votação no Parlamento teve lugar a 23 de Março (provocando a imediata demissão do Governo) e o pedido de ajuda foi apresentado menos de 15 dias depois, a 6 de Abril. Tudo em menos de um mês."


C O N T I N U A . . . .

templario disse...

DE: Cantoneiro da Borda da Estrada

. . . . C O N T I N U A Ç Ã O

"Quem queira sustentar que o pedido de ajuda externa devia ter sido formulado antes da crise política, isto é, antes de Março, tem de recordar o que o próprio PSD dizia no mês de Fevereiro. E o que dizia Eduardo Catroga era isto: "Não defendo, nas actuais condições de acesso, o recurso ao FEEF em parceria com o FMI, porque as experiências da Grécia e da Irlanda correram muito mal" (v. Diário Económico, 21-2-2012). O próprio Passos Coelho também era contra: "Portugal só deve encarar uma solução externa quando as condições forem racionalmente vantajosas. Portugal não tem uma dívida sustentável mas o tipo de financiamento do FMI ou do FEEF também não o é". E acrescentou um argumento bombástico: "Se Portugal recorresse ao tipo de ajuda da Irlanda ou da Grécia, dentro de dois ou três anos não estaríamos em condições de cumprir" (Lusa, 10-2-2011).

Estes factos históricos chegam e sobram para provar que Vítor Gaspar não tem razão: nem o pedido de ajuda externa foi apresentado "demasiado tarde", nem era sequer inevitável dado que a Europa apoiava outra solução. Mas as declarações de Passos Coelho, feitas um mês antes do "chumbo" do PEC IV, mostram que o líder do PSD provocou uma crise política com plena consciência das graves consequências para o País de um pedido de ajuda externa naquelas circunstâncias. Como ele próprio disse, com um tipo de ajuda como o concedido à Irlanda ou à Grécia, "dentro de dois ou três anos não estaríamos em condições de cumprir". Mas isso era no tempo em que Vítor Gaspar não era ministro das Finanças e Passos Coelho ainda acertava nas previsões."