domingo, 7 de dezembro de 2008

TENTAR COMPREENDER A CRISE - 5

A CRISE NA EUROPA
António Rebelo
Dada a crescente globalização, as diversas economias europeias têm sido, e continuam a ser,
fortemente fustigadas pela crise dos subprimes, com origem nos Estados-Unidos, como vimos. Desde há meses em recessão, com falências, consumo e desemprego a aumentar, os americanos viajam menos para o estrangeiro, e compram menos produtos, importados ou não. Se recordarmos que França, Espanha e Itália, por esta ordem, são os países que mais turistas recebem no Mundo, perceberemos a gravidade da presente situação nesse sector.
Além do já apontado, é facto que, mesmo antes da crise originada nos USA, as coisas não iam nada bem na Europa, embora com algumas raras excepções, como se verá mais adiante. Não é este o local, nem o momento, para recuar demasiado na história europeia, pois não se trata de nenhum trabalho de índole universitária, ou para especialistas, mas apenas de uma descrição analítica, tanto quanto possível neutra, com o intuito de levar à compreensão possível do mundo em que vivemos.
No final da 2ª guerra mundial, em 1945, grande parte da Europa estava em ruínas, tinha havido milhões de mortos e quase tudo estava por fazer, ou para reconstruir. Com abundante mão de obra, resultante da desmobilização, com matérias primas baratas, com os recursos do Plano Marshal e os ensinamentos de Keynes, foi o início daquilo a que mais tarde se veio a chamar os 30 gloriosos, referindo-se à época situada entre 1945 e 1975. Foi um período de pleno emprego, aumentos anuais de salários, construção de infraestruturas, reconstrução e edificação de alojamentos, crescimento anual do PIB superior a 3%. Só a Espanha e Portugal não beneficiaram inicialmente da tal progresso, pois não tinham participado na guerra e por isso foram excluídos do plano americano. Eram também, na altura, países de regime ditatorial, pouco do agrado dos americanos, embora Portugal já estivesse na NATO, desde 1950.
Dada a convergência de interesses na luta comum contra o nazismo, na qual participaram tanto americanos como russos, bem como a subsequente divisão da Europa, decidida em Yalta, havia partidos comunistas fortes (entre 20 e 30% de votos) na Itália e em França. Neste último, tinha até havido já, (em 1936), um governo de Frente Popular, integrando ministros comunistas, durante cuja vigência se instituiu, pela primeira vez, o princípio da obrigatoriedade de férias anuais pagas para todos os trabalhadores. Esta decisão marcou, indubitavelmente, o nascimento do turismo moderno.
Num ambiente de paz, de pleno emprego, de matérias-primas abundantes e baratas, e com incontestável superioridade tecnológica, os empresários beneficiavam de altas taxas de valor acrescentado, mesmo após pagamento dos impostos, das prestações sociais, das férias dos trabalhadores, dos salários e dos respectivos aumentos salariais, negociados com os sindicatos sector a sector. Foi-se criando assim, de cedência em cedência por parte do governo e do patronato, incomodados com a hipótese de os comunistas poderem vir a governar, na sequência de vitórias eleitorais, aquilo a que chamamos agora, por vezes com orgulho, o "modelo social europeu". Resumidamente, emprego para toda a vida, escola gratuita, salário mínimo, assistência médica gratuita, rendimento mínimo, alojamento social, liberdade sindical e de opinião, assistência na velhice, reformas e aposentações sob égide estatal, transportes subsidiados. E tudo continuaria pelo melhor no melhor dos mundos possível, diria Pangloss, se não fora a evolução permanente, que ninguém consegue parar, embora muitos tentem.
A primeira crise do petróleo, a perda das colónias e das respectivas matérias-primas baratas, o progressivo envelhecimento da população e a nítida diminuição da natalidade, foram os primeiros sinais de alarme a indiciar que o bom tempo estava a acabar. A queda do muro de Berlim, as subsequentes deslocalizações de fábricas, a perda da superioridade tecnológica europeia, a emergência da India, da China, do Brasil, e outros, bem como a nítida perda de influência dos partidos comunistas e dos sindicados por eles controlados, no seguimento da implosão da União Soviética e dos países de leste, contribuiram para transformar, paulatinamente, o modelo de sociedade em que vivemos em algo de dificilmente sustentável a médio e longo prazo. Salvo se os países emergentes vierem a ser constrangidos, de alguma maneira, a adoptar um modelo semelhante, coisa que a actual situação chinesa não permite, de modo algum, pressagiar. Que fazer então? É o que tentaremos ver no próximo trabalho. Até lá!


A

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