quinta-feira, 4 de outubro de 2012

O equívoco dos presidentes de junta

Conforme se previa, a AM de Tomar rejeitou ontem a reforma das freguesias, a impropriamente chamada "Lei Relvas". E aqui reside uma parte do problema. Quando se fulanizam as leis de um país, tende-se depois a agir em consequência. Neste caso, como o patrono da lei não se encontra agora na mó de cima da opinião pública, por razões de todos conhecidas, a referida legislação também parece não agradar a ninguém. Naturalmente naquele costumeiro estilo árabe, ou não tivéssemos nós todos umas costelas berberes. Parece que estou a ouvir: "Reforma das freguesias? Mas com certeza! Vamos a ela quanto antes e com determinação! Na minha freguesia não, que as pessoas já estão habituadas assim e seria uma asneira alterar hábitos seculares. Mas nas outras todas, força!"
Em particular no concelho tomarense, a coisa transformou-se num combate de galos, cada um procurando obrigar o outro a baixar a crista, abandonando a luta.  Como bem mostram os comentários à votação de ontem da AM, tratou-se sobretudo de derrotar Relvas, quase todos movidos pela aversão pessoal e na expectativa de que a lei acabe por não ir avante.
E agora? Agora, a prevista verba adicional de 15% já está fora de causa, tal como a principal vantagem da democracia em que vivemos: a liberdade de escolher o modo como acabamos todos por ser "cozinhados" e depois "comidos" pelo governo de Lisboa. Este ou qualquer outro. Doravante a Unidade Técnica tem a faca e o queijo na mão. Ou, melhor dizendo, os mapas concelhios e as tesouras. Pode cortar como melhor entender, tendo como únicos limites os consignados na legislação em vigor. Assim, no nosso concelho, apenas poderá escapar a freguesia da Madalena, por ter mais de três mil habitantes, o que lhe dá o direito de ficar como está, caso tal seja a opinião maioritária livremente expressa pelos seus fregueses, através dos órgãos eleitos. As outras quinze ficam assim à mercê do legislador e do seu braço executivo. Tal como antes do 25 de Abril, quando os presidentes não eram eleitos e as ordens vinham sempre "de cima". Tanto podem sobreviver 2 como 5, 10 ou mais freguesias, consoante o que for decidido em Lisboa. É isso que se pretendia e pretende?
Parece-me que não. Interesses contraditórios levaram a que paire agora na opinião pública a ideia algo difusa de que esta e outras reformas não irão para a frente porque o governo está a prazo. Como indicia a intervenção de ontem do ministro Gaspar, ao usar deliberadamente o vocábulo ENORME para qualificar o aumento de impostos. Acham que um ministro a prazo falaria assim? Trata-se portanto de mais um equívoco de pesadas consequências. E mesmo que o governo estivesse mesmo a prazo -o que está longe de ser o caso- o que viesse a seguir seria forçado a trilhar exactamente os mesmos sulcos, impostos pelos nossos credores: reduzir despesa, reduzir o peso do estado, reduzir os órgãos administrativos. O que significa que a extinção de freguesias é apenas a primeira etapa na simplificação da divisão administrativa do país, seguindo-se a breve prazo a redução de concelhos. Só não vê quem não quer. Ou quem usa óculos partidários que lhe toldam o horizonte.
Votaram contra e depois? Quando a Unidade Técnica determinar e mandar publicar a futura organização "freguesal" do concelho, segue-se o quê? Uma revolta, tipo Maria da Fonte? Umas manifestações vãs como aquelas contra a reforma da saúde? Uns votos de indignação no executivo e na AM? Isso era dantes! Agora estamos em mudança acelerada. Por conseguinte, convinha a todos deixarem-se de atitudes folclóricas para inglês ver e tratarem  de dar o corpo à curva quanto antes. Sob pena de serem projectados contra as protecções laterais da auto-estrada do futuro.

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