segunda-feira, 8 de outubro de 2012

O mal os remédios e as bulas

Num curto intervalo, tivemos direito a dois congressos; um em Tomar, outro em Lisboa; este das ditas esquerdas. É natural. Padecemos da mais longa crise de que há memória, por alguns já apelidada de mal do século ou doença terminal do capitalismo. Acossados e assustados, os das classes ditas liderantes, ou com pretensões a tal, sentiram necessidade urgente de congregar ideias, tendo em vista vencer o monstro. Adoptaram a démarche médica: observação e anotação de sintomas, diagnóstico da maleita e prescrição medicamentosa integrada em determinada terapêutica. Foi a isso que se assistiu, embora em escala diversa, na capital do país e na capital dos templários. 
Tudo bem, portanto? Infelizmente não.
Como é tradicional, mesmo excluindo as usuais "moscas do coche", os cabotinos que apenas procuram algum protagonismo, tanto junto ao Tejo como nas margens do Nabão, vários foram os congregados que olvidaram ao que vinham. Limitaram-se a debitar evidências banais, mais para se ouvirem que para convencerem, omitindo o essencial: ir para além dos sintomas. Idealmente até pelo menos à prescrição.
Outros foram realmente mais profícuos. Apresentaram comunicações por assim dizer limpas, integrando sintomas. diagnóstico, terapêutica e "receita". Infelizmente, mesmo estes congregados ou congressistas serão de parca utilidade para a ultrapassagem do monstro, apesar da indiscutível qualidade das suas prestações. Simplesmente porque, ainda que acertando com a origem dos sintomas, com o diagnóstico, com a terapêutica e com a "receita", nunca tencionaram estar à cabeceira do doente quando se tornar necessário explicar aos enfermeiros de serviço como devem proceder. O tal modus faciendi, que quase sempre é omitido, dado que no ensino português se ensina a saber dizer, não a  saber fazer. Não terá sido por mero acaso que logo a seguir ao 25 de Abril a esquerda pura e dura resolveu abolir o ensino técnico-profissional, promovendo as até então escolas comerciais e indusdriais em liceus. No papel, claro. Destruir é fácil, mas edificar algo perene é outra história... 
Sem a bula que obrigatoriamente acompanha todos os medicamentos, mas que infelizmente nunca é lida pelos que nos governam, não poucas vezes a terapêutica mais não faz do que agravar a doença, provocando autênticas catástrofes económicas e sociais. É o que está a acontecer neste momento em Tomar. A troco de confortável remuneração, pessoas desconhecidas dos tomarenses elaboraram um documento de trabalho, que agora se constata ser um perfeito disparate. Quando já pouco ou nada se pode fazer para superar os estragos entretanto causados, porque o dito projecto nunca foi sequer apresentado aos eleitores ou aos eleitos, quanto mais agora debatido. Apesar disso, as obras nele propostas foram sendo realizadas, um pouco ao acaso, justamente por faltar a tal bula indicando o modus faciendi. Os resultados aí estão à vista de todos. Esse execrável documento -uma das causas da nossa presente desgraça- dá pelo nome pomposo de "Tomar 2015 -  Uma nova agenda urbana". Um desastre, digo eu. Por falta de bula, explicando como proceder. Mas também por excesso de ganância e falta de escrúpulos.

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