sábado, 13 de abril de 2013

Para eventuais comparações...

"Não há crescimento sem o direito de enriquecer"

"Imagine um empresário francês que se vangloriasse de ter conseguido em poucos meses, graças a uma empresa que fundara, uma fortuna pessoal de mais de 132 milhões de euros. O escândalo seria imediato e enorme. Pois esta semana, sem qualquer indignação de quem quer que seja, um francês anónimo ganhou o mesmo montante, jogando apenas alguns euros no Euromilhões. Único premiado entre mais de 42 milhões de apostas em toda a Europa.
Esta ocorrência ilustra bem a estranha relação entre os franceses e a riqueza. Enriquecer por mero acaso (ou, vá lá, graças a uma actividade artística ou desportiva) é tolerável. Enriquecer graças ao trabalho pessoal, sobretudo quando se dirige igualmente o labor de outros trabalhadores, é intolerável. A esquerda recusa-o devido a sua ideologia marxisante (concebida por gente que nunca leu Marx, primeiro grande admirador da burguesia). A direita recusa-o também devido à sua ideologia religiosa (concebida por gente que nunca leu a Bíblia, grande admiradora do enriquecimento, desde que colocado ao serviço do próximo). Aqueles fazem a apologia da igualdade; estes da pobreza. Uns e outros detestam aqueles que ganham muito dinheiro dirigindo empresas. Uns e outros apenas toleram as fortunas herdadas, cuidadosamente protegidas pelo fisco.
Apesar disso, tanto a esquerda como a direita buscam afanosamente as alavancas do crescimento económico. Procura vã, enquanto se recusarem a reconhecer que, desde a alvorada dos tempos, a possibilidade de enriquecer é o principal motor do crescimento mercantil.
Nos países onde enriquecer criando produtos ou serviços é possível, e onde os que assim enriquecem são aplaudidos e glorificados, uma grande parte dos cidadãos empreendedores  esforça-se para o conseguir. Inovam, fundam empresas, criam empregos e riqueza. É o caso dos Estados Unidos, da Alemanha e da Inglaterra (países protestantes, para os quais  a pobreza é escandalosa, e não a riqueza), e doravante também em vários países emergentes, onde aparecem grandes grupos industriais e a micro-finança reconhece a qualquer pobre o  direito de enriquecer.
Em países como a França, em que enriquecer é cada vez mais mal visto, em que aqueles que apesar de tudo porfiam como empreendedores são cada vez mais desconsiderados e onde o fisco confisca a maior parte do que ganham, o tal motor desaparece. Há cada vez menos empreendedores e os que restam vão trabalhar para outros países. No total, é nos países onde é mais fácil enriquecer de modo lícito que o nível de vida aumenta mais depressa., porque a emulação é um dos principais factores do bem-estar colectivo. É portanto imperativo que esse direito seja acessível a todos, tanto os dos bairros  difíceis como os descendentes das classes dirigentes.
Não se trata da única alavanca do crescimento. A educação, os equipamentos colectivos, o Estado de direito, a saúde para todos e a justiça fiscal são outras tantas, que devem tornar possível a cada um tornar realidade as suas aspirações, sejam elas quais forem, desde que honestas e legais. E em particular, se tal for o caso, ganhar honradamente muito dinheiro. Mas enriquecer não deve constituir o objectivo final. O lucro deve ser como um pincel para o pintor: uma maneira de transformar a sua vida, a dos outros e a dos habitantes de todo o planeta em obras de arte.
A França nunca reencontrará a via do crescimento sem esta imensa viragem ideológica, que nenhum dos actuais e lamentáveis debates está a preparar. Urge portanto colocar o direito de enriquecer na nossa caixa de ferramentas nacional."

Jacques Attali, Perspectives, L'Express, 10/04/2013, página 82
J@ATTALI.COM

Uma pergunta final: Será só em França?

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