quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

CONCEITOS INADEQUADOS PROVOCAM DECISÕES INCORRECTAS

Rara é a vez que se fale de A, B ou C para encabeçar determinada lista eleitoral, sem que se oiça imediatamente a pergunta estrambótica: O que é que essa pessoa já fez por Tomar? Salvo melhor opinião, a questão não é essa, nem a eventual resposta poderá ajudar a esclarecer as coisas, pois são conceitos inadequados, em contextos equívocos. Comecemos como recomenda o Lapalisse.
Ao longo dos séculos, houve tanto em Portugal como por essa Europa fora, salvo excepções locais/regionais, uma sociedade humana com três classes sociais -o clero, a nobreza e o povo. No nosso país, a partir do liberalismo do século XIX, o clero perdeu a maior parte da sua importância social, pelo que o seu posicionamento sociológico terá deixado de ser em primeiro lugar. Pouco mais tarde, com a implantação da República, chegou a vez de os nobres deixarem de constituir, em termos oficiais, uma classe social, uma consequência directa mas retardada da razia operada pela Revolução Francesa.
Com a ascensão da burguesia urbana, fenómeno típico do século vinte no nosso país, surgiu então uma divisão dicotómica da sociedade, que foi partilhada conceptualmente em duas categorias sociais, as boas famílias e as outras, por sua vez subdivididas em urbanas e rurais.
Em Tomar e noutras zonas do país, (no Porto, ou em Alcobaça, por exemplo), dado nunca ter havido nobreza residente, sempre coexistiram apenas o clero (regular ou não) e o povo. Aqueles para mandarem, estes para obedecer e para o trabalho manual. Naturalmente, nas margens nabantinas e em Alcobaça, nomeadamente, a extinção das ordens religiosas em 1834, veio criar um vazio social no topo, provocando por assim dizer o deslizamento para a acima referida dicotomia entre boas famílias e o povo anónimo. Situação esta que procuram manter nos nossos dias os que dela cuidam poder vir a beneficiar. Trata-se porém de conceitos equívocos e pouco definidos, inúteis para fundamentar quaisquer hipóteses sérias de trabalho. Seja a expressão "boas famílias". Qual o seu real significado? Boas em quê? Porquê? Em relação a quem? Os direitos constitucionais não são iguais para todos? Então como se consegue estabelecer a distinção entre boas famílias e as outras? Estas outras serão todos más famílias?
Semelhantes equívocos e conceitos errados têm provocado estragos abundantes por esse país fora e também em Tomar. Nas sucessivas listas eleitorais, quase sempre se procura (embora sem nunca o admitir) alguém "de boas famílias" para as encabeçar, daí resultando as desgraças observáveis um pouco por todo o lado, salvo raríssimas excepções. O leitor fará o favor de efectuar o recenceamento local dos candidatos, dos eleitos e das desgraças nabantinas. Poderá até ter em conta uma situação anómala a nível nacional, afinal a excepção que confirma a regra: Cavaco é o bom candidato de más famílias; Alegre é o mau candidato de boas famílias, que em tempos terá andado por maus caminhos e agora "paga as favas".
Entretanto, se a ideia é mesmo ultrapassar a crise tomarense, talvez não fosse mau servir-se de outra utensilagem para seleccinar os candidatos a cabeça de lista. Por mim, proponho a usual ferramenta europeia, que divide todas as cidadãs e cidadãos, independentemente de qualquer outra carcterística (família, religião, fortuna, rendimento, cor do cabelo, cor da pele, etc.) em dois amplos grupos -os herdeiros e os conquistadores. Os primeiros vivem sobretudo do que lhes deixaram como herança, acabando em geral por se finarem mais pobres e mais abaixo no conceito dos concidadãos. Pelo contrário, os conquistadores vão procurando subir na vida pelos seus próprios meios, o que em geral conseguem. Temos assim, por conseguinte, que não adianta indagar o que X já fez por Tomar, mas sim aquilo que já fez em benefício próprio e que poderá vir a ser capaz de fazer em prol dos seus conterrâneos. Apesar de continuar a ser considerado "de más famílias", como acontece com Belmiro de Azevedo. Filho de um modesto artesão carpinteiro, apesar de agora ser titular da 2ª maior fortuna do país, os seus pares continuam a chamar-lhe depreciativamente "o merceeiro", tal como o Américo Amorim, que é quase analfabeto, continua a ser "o das rolhas". Somos assim e não parece haver grande coisa a fazer.
Mas já sabem -se a crise tomarense vos está mesmo a incomodar, e se pretendem arranjar alguém que seja mesmo capaz de a tentar ultrapassar, escolham e aconselhem a escolher entre os conquistadores. Se continuarem a insistir nos herdeiros, creio que não vamos sair tão cedo da caldaça nauseabunda. Ou estarei enganado?

5 comentários:

António Freitas disse...

Concordo em absoluto com os seus comentários. Em Tomar padece-se da fobia "de boas famílias" ou "é de que Famílias"

Já me aconteceu a mim perguntarem " é de que famílias tomarenses"? Olhe sou filho de um pedreiro que emigrou e que trabalhou até aos 75 anos e que criou dois filhos e os mandou à escola e que depois tiveram que ir à vida!
Há dias uma jornalista com fibra nascida nos arredores de Tomar, Licenciadac pela escola Superior de Comunicação Social ao serviço de um grande jornal entrevistava um senhor de Tomar e a pergunta veio " é de famílias de Tomar'" A rapariga, cujo pai tem um pequeno comércio, registou a pergunta com tristeza.

Que raio só os filhos de gente de bem é que são homens ou mulheres deste país?

O Presidente da República não era filho de um aldeão e depois pequeno industrial de Poço de Boliqueime'

Estas mentes retrógadas de alguns tomarenses?

Anónimo disse...

Esta análise,se mais aprofundada e no caso de Tomar,conduz-nos a outra dimensão do problema :

É que há conquistadores e "conquistadores",como há meios e "meios".

Porque há meios legítimos e ilegítimos.

Porque há quem não olhe a "meios" para atingir os fins.

Há que seja capaz de cavalgar e até "matar" tudo e todos para atingir os seus fins,para ser um "grande conquistador".

Os partidos políticos e todos os escalões de poder estão enxameados destes "conquistadores".

Fora os que gravitam em torno dos ditos cujos.

O problema é de carácter,de capacidade,de entrega,de intervir para servir e não para servir-se.

O problema é entre aqueles que se apresentam por dever cívico e sem interesses pessoais a defender ou servir e aqueles que são impelidos pela vaidade,pelo desejo de se servirem,seja para auferir benefícios e proveitos para si e para os amigos ou simplesmente para massajarem o ego e terem protagonismo e notoriedade social.

O problema das relações entre o ser humano,o poder,a ambição,o servir ou servir-se é muito mais complexo e profundo do que a esta análise superficial e voluntarista pretendem fazer crer.

Resumir a questão a herdeiros e conquistadores é absolutamente redutor e uma mistificação de um grave problema que corrói a democracia portuguesa e o regime tal qual hoje existe.

A sociedade e as estruturas do poder estão minadas por gente desqualificada,por arrivistas e oportunistas de todo o tipo.

Esperemos pelas autárquicas de 2013em que centenas de caciques ("herdeiros" e "conquistadores") vão ser legalmente obrigados a largar o poder que exercem há dezenas de anos,favorecendo clientelas e fomentando todo o tipo de desvergonhas,especialmente no que se refere à utilização de cargos e de dinheiros públicos.


Júlio Inconformado

Anónimo disse...

Esses ainda têm mais valor, chegam longe com menos oportunidades.

Anónimo disse...

Tomar está como este blogue: cheira a mofo!!!

Anónimo disse...

Está podre.
E não é de ontem...