domingo, 30 de janeiro de 2011

OS GOVERNOS "AUSTERITÁRIOS" VÃO SOBREVIVER?

O primeiro-ministro inglês durante a sua intervenção  na "Fórum mundial de Davos (Suiça) - Foto Johannes Eisele/AFP/Le Monde
Nota prévia
Ouvindo ou lendo a comunicação social portuguesa, bem como entrevistando os políticos locais, fica-se com a impressão de que os portugueses em geral, incluindo os políticos locais, continuam persuadidos de que a actual situação de austeridade é uma coisa transitória. Que as vacas gordas já vêm outra vez a caminho. Dos quatro responsáveis políticos nabantinos que tive o gosto de entrevistar até agora, no programa À mesa do café, transmitido em directo pela Rádio Hertz, ao sábado, das 11 ao meio-dia, só Miguel Relvas mostrou estar preparado para a inadiável mudança, tornada indispensável pelo que aí vêm. Com ou sem FMI; com ou sem BCE; com ou sem vontade. O que tem de ser, tem muita força.
Embora neste país e nesta terra se fale o menos possível de tão melindroso assunto, a triste verdade é que nos esperam dois desafios cruciais incontornáveis, tanto a nível nacional como local: 1 - Reduzir o défice para menos de 3% do PIB até 2013/14; 2 - Gerir o país e cada uma das autarquias de maneira a que o défice não volte a subir, sob pena de severas penalizações. Em termos singelos, se já é difícil conseguir reduzir tanto o nosso nível de vida em tão curto espaço temporal, agora imagine-se o que vai ser mantê-lo tão reduzido, em virtude de sermos forçados a viver unicamente com aquilo que ganhamos, sem crédito mais ou menos fácil. Eis o problema! Tão delicado que até os dirigentes mundiais já se interrogam -Conseguirão os regimes democráticos sobreviver a tão duras medidas restritivas na área económica?

"Em Davos, houve debate sobre o "handicap" das democracias perante as suas dívida públicas.
Participantes oriundos de economias "emergidas" suscitaram a questão: Terão os Estados  Unidos, o Japão e a Europa  capacidade política suficiente para implementar todas a medidas impopulares necessárias?"

"Será que as democracias liberais têm condições para enfrentar um dos principais desafios económicos futuros -acabar com o endividamento de uma vez por todas? Foi este o problema dominante em muitos debates, entre 26 e 30 de Janeiro, no Fórum Mundial de Davos, na Suiça. Jogando à defesa, a Europa, os Estados Unidos e o Japão foram de forma cortês desafiados pelos participantes oriundos das economias "emergidas" (já não se diz emergentes, que lhes parece mal) a acabar com a dívidas públicas, consideradas como uma das mais graves ameaças ao crescimento económico mundial.
Essa admoestação dissimulava também, quase sempre, uma segunda interrogação, mais política, apenas sugerida, mas apesar de tudo audível à medida que iam decorrendo as sessões de debate: Será que as democracias liberais estão em evidente desvantagem,  em relação aos regimes autoritários, para implementar medidas tão impopulares como o aumento dos impostos ou a redução das despesas públicas?
A reunião anual nesta pequena localidade dos Alpes Suiços, de mais de 2.500 "decisores económicos" mundiais é sem dúvida um dos raros encontros em que governos, universitários, especialistas, empresários , sindicalistas e representantes de ONG (Organismos Não Governamentais) podem debater abertamente tais problemas.
Em 2009 e 2010, Davos festejou o regresso de Estado à economia, tanto na América como na Europa, na qualidade de insubstituível actor de uma saída de crise que não se transformou em depressão, mas apenas em recessão. Em 2011, a música é outra. Tanto a Europa como os Estados Unidos surgiram atormentados porque sobre-endividados, por conseguinte sem grande margem de manobra. O Secretário do Tesouro americano (equivalente do nosso Ministro das Finanças), Timothy Geithner, o Presidente da República francesa, Nicolas Sarkozy, o Primeiro-ministro britânico, David Cameron e a Chancelerina alemã Ângela Merkel foram unânimes: a redução do défice é a prioridade das prioridades para os próximos anos.
Desta vez Davos parecia dividida em dois campos. De um lado, as economias emergentes, lideradas pela China, equilibrando as suas contas públicas e acumulando montanhas de poupanças e de reservas em divisas. Do outro lado os sacos rotos da Europa, do Japão e dos Estados Unidos, com os orçamentos no vermelho e vergados sob o peso das dívidas. "A nossa situação orçamental é insustentável a longo prazo", reconheceu na sexta-feira, 28 de Janeiro, o Secretário Geithner, para logo acrescentar que terá de ser liquidada entre cinco e dez anos. Também admitiu que há uma grande dificuldade para conseguir reunir no Congresso dos Estados Unidos uma maioria, obrigatoriamente bipartidária, capaz de se comprometer para um tal espaço de tempo, "enquanto que os chineses têm uma admirável capacidade para fixar objectivos a longo prazo".
Procurando enfrentar o cepticismo de alguns sobre a eficácia das democracias liberais na presente conjuntura, Geithner formulou uma pergunta e deu-lhe logo resposta: "Será o sistema americano capaz de responder a este tipo de desafio e as todos os desafios do futuro? Quase sempre com grande confusão, mas não tenho qualquer dúvida. A resposta é sim! O sistema político americano sempre foi capaz de se elevar à altura dos desafios a vencer."
E para acalmar os espíritos mais inquietos expressou a sua convicção de que os europeus também vão conseguir resolver as actuais dificuldades da eurozona: "Não tenho qualquer dúvida a esse respeito, pois já adoptaram medidas tendentes a fornecer oxigénio aos países com mais falta de ar da união monetária". 
A mensagem foi clara: Nada de duvidar das capacidades das democracias liberais. David Cameron, o primeiro-minsitro conservador inglês, aproveitou para reforçar a posição do governante americano: "Duvidam dos nossos valores? Ousam vir-nos falar da eficácia dos regimes autoritários? Pois estão enganados. Pelo contrário, devemos realçar os nossos valores, nós os Europeus. De onde vêm as inovações, os novos produtos, as boas ideias? Das sociedades abertas e livres."
Não era bem uma resposta à pergunta feita, a da capacidade das democracias para tomar medidas duras, mas dita no palco  da maior sala de reunião de Davos, num tom de quase desafio, reconheça-se que tal profissão de fé impressionou pelo seu "panache".

Alain Frachon, Davos, Suiça, Le Monde, Economie, 30/01/11, página 13

Nota final
Depois não me venham dizer que ninguém vos preveniu a tempo e a horas!

1 comentário:

Anónimo disse...

Talvez...
Mas Tomar não. Está condenada ao colapso.