sexta-feira, 1 de julho de 2011

RECORTES...

EL MUNDO, Madrid (adaptado)
Hugo Cristóvão, alguresaqui.blogspot.com

SOBRE ESTATISTAS E LIBERAIS

"Nos últimos meses, para classificar Passos Coelho, tem-se usado muito a palavra neoliberal. Não sei bem o que é hoje um neoliberal. Sei que há pessoas com um pensamento mais liberal e outras que acreditam mais no Estado. E não havendo "liberais puros" nem "estatistas puros" (não há ninguém que hoje defenda a liberalização ou a estatização a 100%), há diferenças de mentalidade entre uns e outros que não são de desprezar.
Os "LIBERAIS" querem facilitar a vida às empresas, considerando que são elas que dão emprego e criam riqueza; os "ESTATISTAS" defendem que ao Estado também compete um importante papel na vida económica. Os "liberais" acham que o Estado tem de ser ligeiro para não asfixiar a economia; os "estatistas" acham que tem de ser forte para poder ser um bom regulador. Os "liberais" defendem que deve haver menos impostos, porque cada cêntimo que vai para o Estado é um cêntimo retirado à economia; os "estatistas são adeptos de mais impostos, considerando que o Estado deve ter mais dinheiro para poder fazer obra social. E assim sucessivamente.
Há dez anos que começo as minhas aulas na Universidade Católica colocando a seguinte pergunta: "Porque razão Portugal é um país atrasado?" E a resposta começa pela seguinte constatação: porque a sociedade civil nunca se autonomizou em relação ao poder do Estado. Porque nunca se formou em Portugal uma burguesia empreendedora e com vida própria.
No momento em que nos países hoje desenvolvidos se afirmava uma burguesia com iniciativa, autónoma, independente, em Portugal a incipiente burguesia viveu sempre enfeudada ao Estado central. Nunca se libertou dele. E este foi o nosso fado até hoje. A dependência do país em relação ao Estado tem sempre estado na base do nosso atraso.
Só que, se essa situação foi até agora possível -embora com as consequências conhecidas- a partir de agora deixou de ser suportável. Por duas razões principais. Primeira, porque uma excessiva concentração de poder nas mãos do Estado não é compatível com o nosso sistema de partidos. Os partidos tendem a usar a máquina do Estado e as empresas públicas como coutada sua, o que produz grandes traumas sempre que o poder político muda de mãos. Ora isto só se resolve aligeirando o Estado e dando mais força à sociedade civil.
Segunda razão: Porque num mercado aberto, e na era da globalização, a viabilização da economia passa pela existência de uma classe empresarial autónoma e empreendedora. Uma economia aberta não é compatível com uma cultura estatizante. Noutro plano e noutra escala, os chineses entenderam isto muito bem, quando inventaram a fórmula "Um país, dois sistemas" . Eles perceberam que, num mundo global, sem iniciativa privada forte, nenhuma economia pode desenvolver-se.
Quando alguns socialistas dizem que o PSD de Passos Coelho tem uma matriz liberal "que não está na tradição portuguesa", estão cheios de razão. Só que, sem quebrarmos essa tradição,não vamos a lado nenhum.
Até hoje, sempre que em Portugal se começou a formar um embrião de lasse empresarial com alguma autonomia, veio uma crise ou uma revolução que lhe cortou as pernas. Agora não há opção. O país precisa de um choque liberal. Seja ele qual for, valerá sempre a pena. Será uma lufada de ar fresco, uma machadada no poder centralista, um golpe no triste fado que tem sido o nosso.
Sem um choque liberal, a nossa economia não terá qualquer futuro."


José António Saraiva, Sol, 01/07/2011, página 3
O título e os negritos são de Tomar a dianteira.

1 comentário:

Anónimo disse...

"
Sem um choque liberal, a nossa economia não terá qualquer futuro.
"

- Meu caro A.Rebelo, nunca esperei vê-lo subscrever tais ideias. Mas também nunca pensei concordar consigo.

Conde da Venda da Gaita