sábado, 4 de maio de 2013

Dar o braço a torcer

A persistência da crise provoca cada vez mais estragos a nível psico-somático. Angustiados ante o desemprego, a austeridade, a pobreza, os eleitores viram-se para um dos dois grandes grupos em que actualmente se divide a sociedade portuguesa. De um lado os que estoicamente aceitam as medidas impopulares do actual governo, conscientes de que não há outra via, ao contrário do que proclamam as oposições, que todavia têm sempre o cuidado de se esquivar a dizer qual ou quais são as saídas. Preferem enveredar pelo radicalismo fácil: derrubar o governo, sair do euro, rasgar o acordo com a troika, mudar da rumo, e outras falácias do mesmo estilo. O irrealismo da esquerda já atinge tais proporções que mesmo responsáveis dessa área começam a criticar os argumentos fantasiosos e as recusas de Seguro.
Numa altura em que até Rubalcaba, líder do PSOE, já encara favoravelmente a hipótese de uma união consensual com o governo do PP, esta sátira de António, publicado hoje no Expresso, é particularmente oportuna e certeira. Porque Portugal não precisa de "Uma maioria assim, deste tamanho". Mesmo "Com toda a clareza", que o mesmo é dizer sem clareza nenhuma. Necessita, isso sim, de políticos realistas, sensatos, capazes de pensar e de trocar ideias. Sem se armarem em padrecos detentores do catecismo rosa, sempre de espada em riste para combater os incréus, que ousam questionar as verdades evangélicas vindas de cima. Como está a acontecer no PS - Tomar.


Além de António, também por essa Europa fora há cada vez mais alertas, no sentido de os socialistas mudarem de rumo, caso não queiram ficar para trás. Segue-se um excerto do francês Dominique Reynié, Director Geral da Fundação para a Inovação Política.

"Dizer adeus ao socialismo"

... ... ..."A queda do Muro de Berlim significou o fim do comunismo. Em 2008, a crise financeira, conjuntamente com as elevadas dívidas soberanas, punha termo a uma social-democracia já corroída pelo envelhecimento demográfico. A despesa pública, principal instrumento da caixa de ferramentas social-democrata, tornou-se a causa da avaria.
O presidente Hollande não pode nem relançar a economia pela despesa pública, nem implementar as reformas em relação às quais a palavra "socialismo" tem a sua razão de ser. O casamento entre pessoas do mesmo sexo faz partes dessas medidas bem-vindas que ainda se podem implementar, porque são praticamente gratuitas, dando uma ilusão de progresso e de inovação social. Já a criação de mais alguns empregos na função pública e o restabelecimento da reforma aos 60 anos para meia dúzia de funcionários, parecem ser derradeiras afirmações serôdias e onerosas de um socialismo sem fôlego.
O presidente apenas consegue um pouco mais de tempo ao aumentar a pressão fiscal -uma das mais elevadas do Mundo. Trata-se do inconveniente de ser socialista num país em que a direita, nesse aspecto, faz exactamente o mesmo. Essa fiscalidade desencorajadora contribui para gripar as molas das empresas, contribuindo assim para agravar o desemprego. A esquerda governamental encontra-se assim entalada entre a evidência da sua impotência e as suas pretensões ideológicas, as quais lhe permitem talvez circunscrever por agora a esquerda de protesto.
Eleito presidente socialista num contexto em que o socialismo desapareceu, François Hollande descobriu que o novo contexto não deixa qualquer lugar para o socialismo de ontem e que o seu partido não preparou nada para o mundo actual. Após ter inutilmente acusado o capital, depois o euro e finalmente a Alemanha, o presidente deveria dizer adeus ao socialismo e definir enfim uma outra política, susceptível de lhe garantir um lugar digno na história."

Dominique Reynié, Le Monde, 03/05/2013, página 17

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