domingo, 14 de fevereiro de 2010

A EUROPA, A CRISE E O ORÇAMENTO MUNICIPAL

Enquanto em Portugal toda a comunicação social anda muito entretida com o futebol, com a alegada acção clandestina do primeiro-ministro, e com as cachopices dos senhores deputados da oposição, que tão depressa tudo fazem para provocar a queda do governo, como logo a seguir se recusam a votar uma moção de censura, "por causa da crise", segundo alegam; por essa Europa fora a imprensa, a rádio e a TV continuam a acompanhar e a noticiar o essencial -a previsível evolução da crise e as suas consequências. Ontem o jornal EL PAÍS publicou a infografia supra, com o título "A economia europeia afrouxa". Para cada país, os dados em fundo branco referem-se à variação do PIB entre dois trimestres de 2009, do lado esquerdo; e à variação do PIB de 2008 para 2009, no quarto trimestre de cada um dos anos, do lado direito. Os dados em fundo castanho indicam a média anual do PIB em 2009, em relação a 2008.
Resulta destes elementos que a crise continua, embora com menos ímpeto, mas está longe de terminar. Pelo contrário, após alguma ténue recuperação, designadamente na Alemanha e em França, a situação económica voltou a agravar-se. Vivem portanto num mundo virtual todos os que proclamam que a crise está ultrapassada. É o caso evidente de José Sócrates, quando afirma não ser necessário um rigoroso plano de austeridade, com forte redução das despesas públicas, para conseguir um défice inferior a 3% em 2013, alegando que com o esperado crescimento económico vamos conseguir. O optimismo é sempre boa política, salvo quando todos percebem que se trata de pura fantasia. Neste caso, até o ex-ministro socialista Daniel Bessa veio dizer que para conseguir reduzir o défice a menos de 3% até 2013, graças ao crescimento económico, será necessário que o PIB cresça ao ritmo mínimo de 5% ao ano, durante os quatro anos que faltam. Coisa que já não acontece há mais de 20 anos, acrescentamos nós.
-E o que temos nós a ver com tudo isso, perguntarão com o habitual ar sisudo e bem informado os costumeiros especialistas locais de coisa nenhuma. -Tudo, respondemos nós. A actual maioria não aprovou há pouco uma hipótese de orçamento prevendo um aumento das receitas e despesas da ordem dos 11% ? Pois aí radica o problema. A não ser que se venha a descobrir no concelho petróleo ou qualquer outro produto igualmente valioso, onde tencionam ir buscar as previstas receitas ?
Pelas bandas do Estado, naturalmente a braços com uma acentuada quebra nos impostos recebidos, o melhor que poderá acontecer à autarquia será a efectiva transferência dos previstos 13.746.054. Quanto às outras receitas orçamentadas, se conseguirem cobrar metade, já será bem bom. O total dará, nesse caso, 23.221.947. Tendo em conta que só o pessoal custa 10.037.000, o serviço da dívida atinge 3.821.914 e a prevista aquisição de bens e serviços orça em 11.317.645, temos um total de 25.176.559. Ou seja perto de dois milhões mais que as receitas previstas numa óptica realista. Há a possibilidade de recurso à banca ? Pois há. Mas a Grécia está aflita por se ter habituado a falsificar os dados estatísticos. Exactamente o mesmo que tem feito a autarquia tomarense, ao empolar sistematicamente os dados dos orçamentos anuais. Todas as autarquias fazem o mesmo ? É provável. Porém, vários vigaristas não constituem desculpa para outros tantos prevaricadores.
Querem os leitores saber o que leva os autarcas a inflarem sistematicamente os orçamentos ? Segundo os próprios prevaricadores, trata-se de cabimentar quanto mais coisas melhor, para a hipótese de haver fundos europeus disponíveis. Na verdade, tudo indica que se trata sobretudo de poder cobrar taxas mais elevadas, uma vez que são fixadas em função dos investimentos orçamentados. Além disso, permitem iludir os eleitores, fazendo-lhes crer que a situação orçamental não é tão má como a oposição e os críticos a pintam.
Por exemplo, neste caso de Tomar, para uma hipótese de orçamento de 61 milhões, um serviço anual da dívida de 3.821.914, corresponde a pouco mais de 5%. Mas se a receita efectiva se ficar pelos 23.221.947, como vimos acima, então teremos uma percentagem superior a 16 %, o que faz toda a diferença em termos de juros a cobrar pelos bancos, e pode influenciar tanto os potenciais investidores como os eleitores. Afinal, quando há dívidas, alguém vai ter de as pagar, de uma maneira ou de outra. Ou não será assim ? Sobretudo quando, como acontece designadamente em Tomar, até já se contraiu dívida bancária apenas e só para liquidar outras dívidas, e não para investimento. A chamada consolidação ou "cavalaria"...

6 comentários:

Anónimo disse...

É natural que, bastante tempo depois de admirar o seu estilo prosaico e corrosivo, se encontre nos seus dizeres algumas contradições. A mais berrante incide no facto de criticar um orçamento elevado, quando em vários bitaites que assina se propõe a recuperar a igreja de São João Baptista, os Pegões, etc, etc.

Simples assimetrias normais de quem é especialista em tudo, mas em coisa nenhuma. Ou não será assim, pergunto eu ? :)

Alexandre Miguel Lopes Teixeira de Oliveira

Sebastião Barros disse...

Meu caro senhor Alexandre:
Apesar do seu estilo muito peculiar, faço mais um esforço no sentido de tentar estabelecer uma plataforma mínima de convivência entre cavalheiros.
Iniciando, devo esclarecê-lo que nunca me proclamei especialista em coisa alguma. Mas considero que nada do que é humano me é estranho. Tal como admito ser um grande zero em música, em física quântica, em energia nuclear, em ayamara, um dialecto dos índios peruanos, etc. Detesto, porém, armar em carapau de corrida, ou ao pingarelho, se preferir, pelo que procuro nunca usar a prosápia, a soberba, a auto-suficiência, a presunção, ou a jactância, e por aí adiante.
Quanto às minhas posições, que cada qual tem inteira liberdade para qualificar como entender, desde que respeite a verdade factual, concedo que não estou isento de poder cair nalguma ou algumas contradições, como acontece a todos, em maior ou menor proporção. O senhor está isento desse pecado venial ?
Sobre o caso por si focado, conviria que ambos falássemos a mesma língua, o que não me parece ser inteiramente a situação. Por exemplo, nunca emiti nem emito bitaites, mas sim opiniões devidamente fundamentadas, apoiadas em factos reais. Também nunca me propuz A RECUPERAR. Simplesmente propuz recuperar a actualmente pobre fachada de S. João Baptista, (onde fui baptizado), e os muito degradados Pegões (onde brinquei em pequeno), com as verbas poupadas da supérflua e muito perigosa limpeza do exterior da nave manuelina, incluindo a Janela. Já entendeu agora ?
Compreendo que a minha facilidade de escrita (estou a escrever isto directamente para o computador, sem qualquer rascunho prévio) que pressupõe igual capacidade de raciocínio, possam irritar alguns nitidamente menos dotados. Mas não me parece bem que se insulte o próximo, só porque é mais dotado do que nós, e tem a coragem de pensar de maneira diferente, publicando aquilo que pensa.

Aceite os meus cumprimentos e escreva sempre, procurando não insultar. Se concorda realmente com a limpeza/lavagem da construção manuelina, tenha a bondade de dizer porquê, naturalmente com os factos e/ou argumentos devidamente estruturados. Em vez de começar por afirmar que os outros são uns incapazes, que confundem bexigas de porco com lanternas eléctricas.

António Rebelo

Maria disse...

Só respondo com uma frase bem antiga, que é sempre verdadeira:"Quando o mar bate na rocha, quem se lixa é o mexilhão". Neste caso, o mexilhão somos nós. Eles gozam à brava a brincar aos políticos, viciam as regras do jogo, e nós vemos o País esbroar-se, tal como veremos a Janela, um dia destes.
Maria

Anónimo disse...

Ao melhor estilo socrático, desviou a minha questão principal para outras acessórias, inflamando-se em supostas faltas de respeito que não existiram. Limito-me a comentar com uma linguagem parecida com a dos textos que me são apresentados, embora saiba que preciso de muitos anos para atingir a excelência de tal dialecto.

Em português corrente, a minha pergunta era única e simplesmente esta:

LIMPAR A JANELA SERÁ, OU NÃO, MUITO MENOS DISPENDIOSO QUE ARRANJAR/CONSERTAR/REPARAR O AQUEDUTO DOS PEGÕES E A FACHADA DA IGREJA DE SÃO JOÃO BAPTISTA ?

Espero que assim já me consiga responder de uma forma cabal e sem rodeios.

Os melhores cumprimentos,

Alexandre Miguel Lopes Teixeira de Oliveira.

Sebastião Barros disse...

Meu caro senhor Alexandre:

Feitas as consultas necessárias, a raspagem seguida de pintura a "branco velho" da fachada de S. João Baptista, bem como a limpeza sumária e reparação do Aqueduto de Pegões ficariam (ficarão) muito mais baratas do que eventual limpeza de todo o exterior da Nave manuelina, incluindo a Janela, que é o que está previsto fazer. Basta usar como base de cálculo os 76 mil euros que custou o teste de apenas alguns metros quadrados há pouco concluído, e os mais de dois anos de trabalhos, necessários para limpar, de forma adequada e segura, a fachada da Catedral de Notre-Dame, em Paris...
Para além de muito mais dispendiosa, a prevista limpeza/lavagem da Janela é supérflua, inútil, prejudicial, perigosa, e indiciadora de uma mentalidade "clean", ou modernaça, pouco conforme com a protecção do património. Já pensou o que seriam as Pirâmides, o Santo Sepulcro, Petra, Machu Pichu ou Angkor Vat, devidamente lavadinhos e com aspecto modernaço ? Então porquê e para quê a Janela ? Porque somos um país de labregos, a pretenderem esconder a terra que ainda trazem agarrada às botas ?
Amar o património com todos os sinais do seu passado, não é um defeito mas uma qualidade.

Anónimo disse...

Obrigado então pelo esclarecimento, embora ache que a restauração de todo o aqueduto seria bem mais dispendiosa.

Quanto à janela, acredito que possam existir mentes brilhantes que veneram a requalificação da mesma por questões de vaidade, ou até mesmo económicas. Na minha simples opinião, penso que o adequado seria apenas assegurar uma manutenção adequada da mesma, porque mesmo todos os monumentos que referiu devem ser alvo de cuidados especiais. E a janela não poderá ficar ao abandono, sabendo-se lá que riscos correrá se não for feita uma intervenção segura. Contudo, também não concordo se transformarem a janela em algo que ela não é, despojando-a dos seus traços únicos - aí estamos de acordo !

Alexandre Miguel Lopes Teixeira de Oliveira