Era para escrever sobre o previsto cortejo fúnebre "Uma flor pela saúde em Tomar". Para dizer que não entendo e explicar a minha posição. Já não sei bem como, o pensamento foi indo da inicial incompreensão até uma entrevista lida ontem. O fio condutor foi a constatação de que Tomar está afinal na periferia da periferia da periferia da Europa. Onde as coisas realmente são decididas.
Aqui vai a tradução dos principais excertos da citada entrevista: "Este livro é um grito de raiva, de revolta. Escrevi-o em Outubro, de enfiada. Ditei-o, porque viajo muito. Estava e estou chocadíssimo com a inanidade das intervenções políticas; com a vacuidade do debate.
... ...Falamos dos nossos problemazinhos sem olharmos para o resto do mundo. Acontece que é do exterior que vêm as ameaças mais graves. O capitalismo entrou numa crise profunda, não se prevê por agora qualquer retorno à normalidade. Nada voltará a ser como antes... ... A direita mente quando nos pretende convencer de que trabalhando mais voltaremos a ter crescimento económico. É falso! É sobre este ponto que a esquerda deve despoletar o confronto de ideias. Estamos lançados para anos e anos de fraco crescimento económico; talvez mesmo de recessão. Há que dizê-lo com clareza e começar desde já a pensar um mundo que terá de ser radicalmente novo.
Estou pessimista, pois a crise financeira ainda não foi resolvida. É verdade que a situação é agora ligeiramente melhor na zona euro, mas o nível do endividamento americano é faraónico. Na China, há a expectativa de uma redução dos preços do imobiliário, da ordem dos 50% no mínimo. Sucede que essa bolha é quatro vezes maior que a dos subprimes, que desencadeou a actual crise. Por conseguinte, quando a bolha chinesa rebentar, os estragos vão ser incomensuráveis. Antes de mais, portanto, é urgente o retorno a um pouco de estabilidade.
Julgo ser impossível um crescimento económico sustentado porque não padecemos de uma só, mas de várias crises em simultâneo. Supondo que consigamos enquadrar e regulamentar a finança internacional, serão necessários ainda assim longos anos para desendividar os Estados. E temos também o "pico do petróleo" que faz dobrar os sinos pelo nosso modelo de prosperidade. Acabou a era do petróleo barato. O consumo continua a crescer, enquanto que as reservas disponíveis são cada vez menos. O aumento dos preços é assim tão inevitável como importante. O que vai agravar o poder de compra. A recessão está aí. O rápido crescimento económico acabou de vez.
... ... Relendo Chateaubriand, Léon Blum, Hannah Arendt, Georges Friedmann, apercebêmo-nos que todos previram o fim do trabalho. E na época respectiva estava-se em situação de pleno emprego. Por conseguinte, a redução do tempo de trabalho não estava ligada ao desemprego. Na verdade, depende exclusivamente da produtividade, que cresce continuamente. Esquecêmo-nos de ser radicais nas nossas maneiras de pensar. O que trava a busca de novas formas de regulação societal.
No futuro teremos sociedades menos mercantis, menos dependentes da competição, menos cúpidas, organizadas em função de mais tempo livre."... ...
Michel Rocard, Le Monde, 26-27/02/2012, página 4
Michel Rocard, Mes points sur les "i", Odile Jacob, Paris, Fevereiro 2012, 19€
O francês Michel Rocard, 82 anos, enarca, inspector de finanças aposentado, fundou o PSU, aderiu ao PSF, foi presidente de câmara, deputado, ministro e primeiro-ministro. Actualmente é conselheiro do Partido Socialista Francês.
Se depois de terem lido tudo isto ainda tiverem vontade de participar na já referida marcha funerária, que vos faça bom proveito.
5 comentários:
DE:
Um bom texto.
Lembro-me de, trinta anos atrás, na Alemanha, as associações patronais, de trabalhadores e o próprio Governo terem colocado em cima da mesa este objetivo: atingir a médio prazo meio ano a trabalhar e meio ano de ócio para todos os trabalhadores. Decorria esta ambição do revolucionário meio de produção, o computador, a informática. En França, há não sei quantos anos atrás, decretou-se a proibição de horas extraordinárias, rigor no encerramento das empresas na hora limite, e os seguranças das mesmas tinham ordens para pôr fora dos locais de trabalho os trabalhadores "viciados", alienados, "forçados", que ficavam a trabalhar depois do horário de trabalho. O objetivo era combater o desemprego e aumentar a competitividade. Curioso, não é?...
Tenho pena de não ter depois acompanhado a evolução destas medidas, provavelmente abandonadas(?) por não interessarem ao Capital. Bastará verificar o que se passa com o setor bancário, cujos trabalhadores (muitos deles) são obrigados a excesso de horas sem remuneração, com anúncios constantes de mais despedimentos. Refiro só o setor dos banqueiros, por ser deveras elucidativo...
Professor parabéns pelo texto que pode ter diversas leituras.Depende de os neuronios estarem todos alinhados e virados para o mesmo lado ou nem tanto assim.
Mas gostaria que me desse a sua opinião sobre mais uma estupenda iniciativa da comissão de saude da A.Municipal(sempre vai fortalecer a floricultura) e ainda como pensa que se vai "casar"com outra também brilhante ideia do voluntarioso colaborador do Dr.P.Marques,o conhecido e também eminente jurista J.Simoes.
Antecipadamente grato.
PS- poderá ser da minha proverbial iletracia e bronquite cerebral mas parece-me que os frequentadores do seu espaço: cantoneiro , leão e o apelidado de "mocinho bem vestido" pelo comentador que se queixa modestamente que todos gostam de falar de política com ele , alinham todos pelo mesmo club.Assim a modos de aparecerem 6 milhões a dizerem-se da Académica desde pequeninos.
DE: Cantoneiro da Borda da Estrada
Senhor José Correia,
Bem que pode esforçar-se no papel de bandarilheiro, picando à meia dúzia num volteio, que os aplausos estão reservados para o toureiro.
Pegue as coisas... pelos cornos, e não ande por aí às espetadelas - pelos flancos.
Assim não dá para lidar.
Curioso que o senhor cantoneiro recomenda exactamente o que raramente faz.
E nao revela grande conhecimento dos temas que aborda( sentido único).
Mas tomo boa nota.
Cumprimentos
Éh páh, o Jota Correia, agora aqui o iletrado sou eu!
Traduza lá, em moedas de vinte e cinco tostões, a sua mirabulante teoria do bem vestido, do leão e do cantoneiro serem do mesmo club, a ver se eu chego lá, porque realmente me considero muito limitado neste particular!
Rai's parta, eu até sou do Sporting, carago! nunca posso ser dos seis milhões...
Oh Jota Correia, páh, você ponha-se a pau, que em vez de bronquite, ainda lhe chegam ao cérebro as três doenças...se é que não estão já lá enquistadas!
Nota: em privado, se quiser, eu digo-lhe quais são as três doenças, embora não seja difícil lá chegar.
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