segunda-feira, 22 de março de 2010

O AUTARCA, A MARISA, O RONALDO E OS TURISTAS

Uma das duas lontras do Fluviário de Mora, numa fotografia de Miguel Manso/Público

Após a publicação do post anterior, chegaram-nos alguns comentários menos abonatórios sobre o autarca de Mora, que acusam de ser "um reaccionarão". Perante tal injustiça e para que os seguidores deste blogue possam fundamentar posições mais conformes com a realidade, resolvemos publicar na íntegra a reportagem do PÚBLICO de ontem, nsaturalmente com os nossos agradecimentos ao conceituado periódico.

"Ele tem bigode e ela também. O casal mais fotografado do Alentejo prepara-se para uma merecida festa. Depois de uma manhã passada a treparem às rochas e a mergulharem na água, nada melhor do que o recanto de palha seca para repousarem os pequenos corpos roliços e peludos, encimados por uns olhitos a brilhar de curiosidade.
Faz hoje três anos que Mariza e Cristiano Ronaldo se tornaram as estrelas da companhia. O casal de lontras asiáticas faz as delícias de todos quantos visitam o Fluviário de Mora, um oceanário dedicado à fauna dos rios que pôs definitivamente no mapa a pequena vila do Alto Alentejo. Ainda por cima sem um cêntimo que fosse do Governo Português. Único no país, tem atraído magotes de gente, que assiste maravilhada ao espectáculo proporcionado pelos peixes nos seus diferentes ecossistemas, da nascente à foz.
A brincadeira saiu cara aos comunistas que governam Mora. Foram anos a caminhar para Lisboa, a pedir autorizações aos diversos organismos de tutela, a exigir os milhões prometidos no tempo do executivo de Santana Lopes, e que acabariam por nunca chegar. Mesmo beneficiando de apoios comunitários, a autarquia teve de desembolsar 7,7 milhões de euros, uma fortuna para um concelho envelhecido que não chega sequer às 6 mil almas.
Os prémios arrecados pelo fluviário -distinguido em 2008 como o melhor museu português- acabaram por ser uma bofetada de luva branca na administração central. Ou, como um dia foi posta a questão, "uma espinha atravessada na garganta do governo". As palavras são de José Sinogas, o presidente de câmara que agarrou a ideia em 2001, depois de o vizinho Alandroal ter desistido dela. A escolha do atelier Promontório para conceber o edifício branco a lembrar os antigos celeiros alentejanos revelou-se também acertada. Disso são prova as distinções internacionais com que a obra foi galardoada.
A vida na terra, essa, ganhou outro fôlego. "É o talho que vende mais carne, o padeiro que vende mais pão...", exemplifica o sucessor de Sinogas, Luís Simão. Os restaurantes e as pensões do concelho são dos que mais têm lucrado com o filão do turismo, mas não são os únicos. Às três dezenas de postos de trabalho criados pelo fluviário , o autarca acrescenta a abertura de uma fábrica de embalagem de medicamentos, depois de o proprietário ter conhecido o concelho, por lá ter ido em peregrinação aos peixes.
Coisa pouca para os 450 mil visitantes que por aqui passaram até hoje ? O fluviário foi um ponto de partida. A partir de agora, a dinamização da economia local passa por criar complementos a esta oferta turística que façam com que quem, por enquanto, vem de passagem fique por estas bandas mais uns dias. Luís Simão quer criar um parque aventura e um centro de interpretação ambiental nas proximidades da casa dos peixes, bem como um roteiro das igrejas do concelho. Outra aposta forte da autarquia é a Estação Imagem... ...
Seja como for, é preciso resolver aquele que é visto como o principal problema da casa dos peixes: não ser suficientemente grande. O smal is beautiful pode fazer sentido quando se percebe que as espécies mais importantes do fluviário em termos de biodiversidade medem escassos centímetros -é o caso do minúsculo saramugo, um peixe que não existe senão no Guadiana-, mas são os hóspedes de maiores dimensões que enchem as medidas aos visitantes. Como a anaconda, uma cobra que triplicou de tamanho desde que aqui chegou à custa de uma dieta gourmet de codornizes, pitéu que exige que lhe seja servido ligeiramente aquecido no micro-ondas. Neste momento, o percurso que se desenvolve no fluviário é visitável em 45 minutos e depois disso pouco mais resta ao turista do que saborear a gastronomia alentejana -o que dificilmente será sequer uma opção para um terço dos visitantes, os miúdos das escolas.
Prometido há bastante tempo mas sempre adiado, o alargamento do fluviário está agora previsto para daqui a um ano. Custa mais um milhão e a autarquia conta arranjar outra vez fundos comunitários. "Penso que desta vez também vai ser apoiado pelo Estado Português", observa o presidente do Turismo do Alentejo, Ceia da Silva, que elogia a "perspectiva visionária" da autarquia quando, em 2001, arriscou o investimento. "Este é talvez dos projectos públicos mais conseguidos nas últimas décadas na região". salienta, "e o equipamento mais visitado de todo o Alentejo. O que a região terá de fazer é aproveitar este fluxo de turistas". Ali tão perto, o mercado espanhol ainda não foi devidamente explorado.
"As câmaras têm de virar-se para estes modelos de desenvolvimento económico", defende Ceia da Silva. O presidente da câmara de Mora fala com menos rodeios: "Não é o dinheiro que se atribui aos clubes de futebol que desenvolve um concelho". Na terra, nem mesmo um dos seus adversários políticos, o vereador socialista Catarro Simões, se atreve a censurar a aposta. "O fluviário tem é que crescer, para não cair na monotonia", vai avisando. "E a ampliação deve merecer o apoio da administração central."
Alterações no projecto científico e pedagógico deverão setr discutidas no mês que vem entre os responsáveis do fluviário e técnicos do Instituto de Conservação da Natureza, que ali se vão deslocar. Mário Silva, um dos directores deste organismo, explica que uma aposta ainda maior nas espécies autóctones pode grangear ao local um prestígio científico acrescido -ainda que o seu encanto para os visitantes fique à partida muito aquém do dos espécimes exóticos, como a anaconda ou as lontras asiáticas. Aquários mais pequenos podem fazer, no entanto, com que os minúsculos saramugos ganhem o protagonismo que os seus vizinhos tropicais teimam em roubar-lhes por serem mais coloridos.
"Esta foi uma grande pedrada no charco numa região deprimida como o Alentejo", diz o presidente do fluviário, o vereador Manuel Pinto. "Contribuiu para atenuar substancialmente a situação social e económica do concelho."
"Deve ser a única empresa municipal que dá lucro em todo o país", refere, por seu turno, o presidente da Câmara de Mora, assegurando que, apesar de ter pedido três milhões emprestados à banca para financiar o projecto, a autarquia continua de boa saúde financeira. No primeiro ano de funcionamento, parte dos proveitos do fluviário foi usada para oferecer uma ambulância aos bombeiros. No segundo, as crianças do 1º ciclo do concelho receberam computadores Magalhães. "Se calhar, o Governo viu com maus olhos ser Mora a ter este projecto, e não uma câmara socialista", discorre o presidente da autarquia. Depois, enterra o machado de guerra: "O que mais me agrada no fluviário ? As lontrazinhas. São muito queridas".
ana.henriques@publico.pt

Nota final de Tomar a dianteira

Homem cauteloso, o autarca morense não disse nem uma palavra sobre um aspecto essencial da excelente e proveitosa experiência de turismo cultural -a maneira muito eficaz como o fluviário tem sido promovido junto do mercado potencial. Não vá o diabo tecê-las, é realmente melhor nunca esquecer que o silêncio é de ouro e que o segredo continua a ser a alma do negócio.
Tomar a dianteira sabe como as coisas têm sido e continuam a ser feitas. Apesar disso, tendo em conta o respeito, a consideração e a admiração que nos merecem os autarcas comunistas (apesar de não sermos da cor), nada diremos também sobre assunto tão sensível. Quem quiser bolota que trepe !

9 comentários:

Cantoneiro da Borda da Estrada disse...

Delicioso!
É por isso que admiro tanto o poder local e os seus autarcas.

Mas nos últimos anos houve um desvio: alguns são muito espaventosos, não fazem o trabalhinho simples de casa, perderam humildade, ligação e carinho pelos eleitores, pela terra. Trabalham para outros "públicos".

As pessoas têm apego ao lugar, ao seu município, que está diretamente vinculado à vida quotodiana. Aqui os munícipes e os autarcas conhecem-se diretamente.

São formas diferentes de fazer política, mas nos últimos 15 anos surgiram no poder autárquico fornadas de políticos que só pensam em usá-lo como trampolim para outros voos e interesses pessoais.

E isso dá cabo do municipalismo. É preciso barrar o caminho aos Comissários distritais dos partidos, destruidores da boa política autárquica, ao serviço de outros interesses das cúpulas partidárias.

É sempre fantástico haver bons exemplos.

Essa é que é essa!

Anónimo disse...

E é preciso ir a Mora para ver lontras? Não chega ver as que andam por aí? São lontras de sequeiro mas não deixam de estar bem lustrosas e anafadas!!!

Anónimo disse...

Mau caro DR. António Rebelo,

"Invejo" a sua subtileza nas mensagens que sempre vai dando aos nossos autarcas.

Este exemplo do concelho de Mora é ilucidativo da abertura de espírito que o meu tem, ao contrário dos nossos autarcas que primam pela ausência de modéstia e de muito mais...

O autarca de Mora (o presidente) faz uma referência pouco elogiosa ao governo central, e com muita razão, porque tem razões bastantes, tal como muitos de nós, para não deixar de o fazer.

Por cá, e você é testemunha disso, os nossos autarcas vivem num outro planeta, têm uma visão do desenvolvimento sustentado, quer na vertente do Turismo quer noutras, muito ao jeito dos charlatões...

São incapazes de analisar as várias sugestões que aqui, neste blog, vão surgindo, e que poderiam ser utilizadas como forum de trocas de impressões sobre a melhor maneira de abraçarmos o futuro desta terra.

A verdade é trágica: os nosso autarcas, todos eles, para mal dos nossos pecados, são míopes e autistas. Veja-se, por exemplo, a fixação do Luís Ferreira em Pedro Marques é tal que o dito não passa de um embuste para "encanto" de alguns dos seus apaniguados (entre eles, aqueles que ontem eram os seus maiores inimigos).

Quando não se tem unhas para a guitarra que nos foi colocada na mão, vamos arranjando as desculpas mais desfarrapadas que nos vier à cabeça para não sermos confrontados (o que é uma ilusão) com a nossa sobreba incompetência mais do que provada.

Pobre Tomar!!!

Anónimo disse...

Dr. Rebelo,
Depois do meu comentário sobre a referência às crianças, cuja actividade nada tem a ver com a questão da dívida do União de Tomar - pelo contrário...
Fui ver as notas mais recentes sobre as notícias do que se passa nas reuniões de Câmara e dou com uma nota sobre uma proposta do Vereador Carlos Carrão, aprovada por unanimidade sem a participação da Vereadora/Presidente da Assembleia Geral, Graça Costa, para a Câmara pagar um jantar de homenagem a antigos jogadores do U. Tomar, no montante estimado de 3.200€...
Isto foi aprovado na reunião do passado dia 18 de Fevereiro e sabe qual o argumento apresentado por Carlos Carrão? No ano passado já se pagou o mesmo valor noutro jantar...
É preciso ter lata para alguém vir dizer que a Câmara tem que ajudar o União de Tomar. Mais???????

Anónimo disse...

Três mil e Duzentos Euros? Seiscentas e Quarenta Notas?

Isto só pode não ser verdade!

Mas que Presidente de Câmara é este? É a ele que deve ser pedida responsabilidade.

Anónimo disse...

Inveja. Só inveja.

Anónimo disse...

Inveja de quê? Do jantar ou da dívida do União? Para isto estar perfeito só falta mesmo é que aqueles que criaram a dívida, vão ao jantar... e já agora que o Presidente da Câmara também vá e seja criticado por não ajudar o União... :)
Desculpem o tom mas isto é anedótico

Anónimo disse...

Sejam lontras e continuem a deitar dinheiro público no União. Afinal a Ordem é rica e os frades até são poucos...

Anónimo disse...

Dr.António Rebelo, muito obrigado.
Os Tomarenses nunca chegaram a ser esclarecidos sobre a dimensão e transversalidade deste Projecto que nasceu em Tomar. O seu embrião iniciou-se no espaço do Flecheiro contíguo ao leito do Rio Nabão. Este Projecto ao ser desenvolvido noutro local, CABEÇÃO-MORA teve ajustamentos e correcções, mas o seu objectivo e conteúdo mantiveram-se intactos para que Projectistas, técnicos, empresas construtoras e Politicos Locais se orgulhassem com o melhor que se executa na Europa. Não posso fazer aqui uma descrição exaustiva deste grande Projecto que teve pormenores técnicos muito dificeis, porque era uma nova experiência para todos. Mas a minha grande derrota foi que Tomar perdesse também esta excelente oportunidade, a nossa cidade de Tomar e o Concelho não mereciam perder, mas tudo fizeram alguns que se dizem Tomarenses para que se perdesse.
O Flecheiro-Fluviário era um Projecto semelhante, com diferenças técnicas devido ao local, com condicionantes geotécnicas, mas que permitia o movimento flutuante de uma galeria por equilibrio hidrostáctico. Este Projecto no Flecheiro executava-se ao longo do desenvolvimento do leito menor com galerias de plataforma, contemplava também as intervenções com adaptação e reconstrução nos açudes da Matrena, Marianaia e obra no dique de entrada no Flecheiro, garantindo a biodiversidade e a recuperação do Ecossistema contínuo. A recepção da rede de esgotos urbanos ficaria no emissário adjacente à banqueta superior do leito. Esta obra na 2ªa Fase tinha o grande objectivo de permitir conhecer o circuito da lampreia em ambiente natural, antes, durante e após a desova, era um exemplo único com grande valência ao nivel cientifico, didáctico e do Turismo. O Projecto foi pensado para que fosse obtida a elegibilidade máxima com uma comparticipação muito elevada. Apenas a Autarquia tinha de pagar o dobro do que pagou pela fonte cibernética. Os Técnicos das diferentes entidades ficaram muito entusiasmados logo com o Estudo Prévio e maximizaram as comparticipações e apoios, até contactaram duas Universidades Estrangeiras para se assumirem como parceiras e utilizarem duas salas de observação em permanência. O Projecto Tomarense estava muito bem concebido porque se desenvolvia em zona muito previligiada. Mas não foi possivel que esta oportunidade ficasse em Tomar porque os garotos do PS, oportunistas, vaidosos e incapazes como luis ferreira, hugo cristóvão e carlos silva, queriam conhecer e apresentar o Projecto; luis ferreira telefonou ainda ao Sr. Arq.º Mário Pedro para que este lhes desse cópia do trabalho, este recusou e além disso o Draft do trabalho não estava nas suas mãos, porque estavam a ser executadas as diferentes especialidades. Mas luis ferreira, hugo cristóvão e carlos silva sempre entenderam que este projecto era demasiado grande para Tomar. Mas estavam errados porque um Concelho do ALENTEJO com 6 mil habitantes aproximadamente conseguiu executá-lo com todas as adaptações o que implicou também custos acrescidos. Os ajustamentos ao projecto no ALENTEJO não permitiram maximizar a elegibilidade em todos os Programas e Sub-Programas, tal como estava previsto em Projecto no Flecheiro. O trabalho efectuado não se perdeu totalmente, ficou em Portugal, por coincidência também no ALENTEJO.
Até breve