domingo, 21 de novembro de 2010

A CRISE PORTUGUESA VISTA POR UM JORNALISTA ESTRANGEIRO

DESEMPREGO, RECESSÃO, AUSTERIDADE: PORTUGAL DESLIZA IRREMEDIAVELMENTE PARA A POBREZA

REPORTAGEM

"É a crise sem bolhas e uma terrivel ressaca sem sequer ter havido bebedeira. Portugal afunda-se numa atonia económica, sem ter sofrido os delírios bancários da Irlanda, as loucuras imobiliárias da Espanha, ou mesmo as violentas manifestações gregas. De todos os países sobre-endividados da UE, é aquele que mais dificuldades tem para compensar as suas fraquezas recenceadas pelos analistas, com vantagens. Não está sob a ameaça de uma bancarrota imediata, mas sim sem perspectivas de retoma.
Em Lisboa, todos os interlocutores se despedem pedindo desculpa por não encontrarem o que quer que seja de positivo no horizonte. A indústria? "O nosso aparelho produtivo foi destruído pela integração europeia", lastima Carvalho da Silva, secretário geral da CGTP, a principal confederação sindical do país. Nestes últimos anos, sofrendo de falta de competitividade, Portugal assistiu ao desaparecimento dos principais exportadores. No norte, as empresas têxteis que ainda resistem vão fechando pouco a pouco, vítimas da concorrência asiática. A agricultura? "Foi igualmente laminada pela transição acelerada para o terciário", constata Fernando Rosas, historiador e ex-deputado do Bloco de Esquerda (anticapitalista).
A ajuda económica estrangeira? "Durante estes últimos trinta anos, a economia nacional nunca singrou graças ao crescimento económico, geralmente fraco, mas em virtude dos subsídos europeus", explica o sociólogo António Barreto. "Tivemos as remessas dos emigrantes, as subvenções da UE, o endividamento das famílias e das empresas, graças às facilidades de crédito proporcionadas pelo euro. Tudo isso acabou definitivamente."
Temos assim que o futuro de Portugal se resume neste momento a um ano de 2011 que vai ser "terrível", dizem os observadores. Com o desemprego que atingirá máximos históricos, superiores a 11,5%, com uma recessão que poderá mergulhar além dos previstos -0,2% do PIB, e sobretudo, com a entrada em vigor do orçamento mais rigoroso de sempre, destinado a reduzir o défice das contas públicas de 7,3% para 4,6% do PIB, até dezembro de 2011.
O governo socialista vai reduzir os vencimentos dos funcionários, aumentar o IRS e o IVA, diminuir as prestações sociais e os investimentos do Estado. Medidas que vão agravar o empobrecimento da classe média, num país onde cada vez mais trabalhadores auferem o salário mínimo de 475 euros mensais. Por ricochete, esta política vai aumentar ainda mais o número de empregos de recurso, que vão permitindo sobreviver, tal como a amplitude da precaridade, que cada vez reduz mais o emprego estável, mesmo na função pública.
Ante uma austeridade sem precedentes, reacção do mesmo tipo: uma greve geral, marcada para quarta-feira 24, convocada pelas duas centrais sindicais: CGTP, próxima do Partido Comunista, e UGT, próxima do PS, que está no poder. Carvalho da Silva diz que tem com objectivo, entre outros, "colocar o movimento sindical como uma força que pode contribuir para a renovação do sistema político."
A crise política portuguesa está com efeito intimamente ligada à agonia de uma prática do poder que muitos portugueses rejeitam. O primeiro-ministro José Sócrates (PS), em maioria relativa no parlamento, governa de forma passiva. Em 2009 conseguiu vencer as eleições, concedendo aos funcionários aumentos que agora lhes retira. Os trabalhadores estão revoltados, não só por aquilo que consideram uma traição, mas também pela incapacidade do governo para prever atempadamente o agravamento da crise, durante todo o primeiro semestre deste ano. Mentira deliberada, ou simples incompetência? Sejam quais forem as suas culpas, o governo no pode ser sancionado pelas urnas antes da eleição presidencial de 2011.
Até lá, a política portuguesa está por assim dizer vitrificada. O orçamento passou, com a abstenção do PSD (direita), encantado por deixar as medidas impopulares para os socialistas. E este joguinho entre as duas formações que alternam no poder, cada vez irrita mais os observadores. "Nada distingue as duas políticas clientelares. São dois agrupamentos de pessoas organizadas para tomar conta do orçamento do Estado", clama o sociólogo Manuel Villaverde Cabral.
"Até agora, ninguém conseguiu suscitar a adesão dos vários partidos em torno de um programa comum, que tomaria as medidas adequadas e a aplicaria com rigor", lastima António Barreto. Antigo exilado do tempo da ditadura, vê-se forçado a interrogações que julgava definitivamente ultrapassadas na história de Portugal: "Vamos ser capazes de resolver esta crise em democracia? Ou vamos acabar por recorrer a mais um governo autoritário?"


Jérôme Fenoglio, enviado especial do jornal "Le Monde" 20/11/10
Tradução e adaptação de António Rebelo

3 comentários:

Anónimo disse...

Desferreirem-se...e desrebelem-se!!!
Ar puro para Tomar!

Anónimo disse...

De palermas estamos excepcionalmente bem servidos.Como se pode constatar pelo comentário anterior, cuja relação com o post não se vislumbra.

Anónimo disse...

Que culpa tenho eu que sejas míope e estejas apalermado por esse astigmatismo galopante?

Se o saudoso Dr. Campos fosse vivo,ainda metia uma cunhazita para o consultares com urgência.

Mas agora é que não sei o que te recomende.

Para vislumbrar...já vi que tás aviado.

OLHA...desengoma-te,desferreira-te, e o resto não digo senão já sei o que me espera.

Tás a mancar,não estás?