O ACASO E A OBSTINAÇÃO

Antonio Rebelo

Já o escrevi, mas reitero-o com satisfação. Considero Luis Ferreira um dos mais promissores políticos tomarenses, caso consiga atempadamente controlar dois excessos. Estou a referir-me à agressividade e à obstinação. Há também, parece-me, alguma intolerância e ódios de estimação, mas issso costuma desvanecer-se com os anos...
Analisando as recentes eleições europeias, Luis Ferreira escreveu, designadamente, que "Parte do eleitorado está aborrecido com o PS e com o Primeiro-Ministro José Sócrates e fez notar isso de forma clara, ao deslocar o seu voto, de forma massiva, para os nulos, para os brancos e especialmente para o voto de protesto, quase todo no Bloco de Esquerda, ma também no PCP e noutros partidos menores. E fez bem, digo eu, porque pode ser que assim as "inteligências" que lá de Lisboa nos vão, sempre, governando, percebam que é absolutamente necessário continuar a alterar comportamentos na nossa sociedade, fazendo-a evoluir... ... mas que há outras formas de o fazer..." (Luis Ferreira, Nota do dia, blogue Vamos por aqui, 12/06/09).
Tudo o que teve a coragem de escrever é verdade. Mas será toda a verdade? Segundo aquele dirigente socialista, a derrocada eleitoral do PS deve-se ao facto de parte do eleitorado estar aborrecido com o partido e com José Sócrates. Terá sido só isso? Na política, como em qualquer outra actividade, nada acontece por acaso. Tudo tem as suas causas. Os interessados é que nem sempre as conseguem identificar com precisão, havendo também casos em que, pelo contrário, procuram escamoteá-las.
O mapa acima, reproduzido do semanário SOL, com a devida vénia, indica a violeta os 57 concelhos nos quais o PS perdeu mais votos em relação às europeias de 2004. Mais precisamente onde o PS perdeu entre 45 e 59,9%. E logo aqui aparece a primeira dúvida metódica. Sendo a acção governamental igualmente sentida em todo o país, porquê esta diferença dos 57 concelhos em relação aos outros 251, se realmente se tratou exclusivamente de aborrecimento para com o governo e o seu líder?
Há depois a estranha distribuição geográfica dos concelhos mais "protestatários"-12 no Algarve, mas apenas 2 no Baixo Alentejo e 1 no Minho. Face à impossibilidade prática de abordar em detalhe todas as regiões do país, fiquemo-nos pelo distrito de Santarém, com 7 concelhos de um total de 21 no tal grupo dos 57. Os concelhos do Ribatejo mais "aborrecidos com o governo e com o primeiro-ministro" são Alpiarça, Cartaxo, Entroncamento, Golegã, Sardoal, Tomar e Torres Novas. Todos com câmaras socialistas, excepto Entroncamento e Tomar. Não é estranho? Se realmente o descontentamento é só com o governo, o que levará os eleitores de alguns concelhos a desviarem o voto do PS, nuns casos em câmaras socialistas e noutros em Câmaras PSD, como em Tomar, por exemplo?
E já que estamos a falar de Tomar e de descontentamento para com o governo, com se poderá explicar o ligeiro aumento de votação no PS, em relação a 2005, nas freguesias de Carregueiros, Casais, Pedreira, Santa Maria dos Olivais e S. João Baptista? E as descidas acentuadas em Além da Ribeira e na Madalena, por exemplo, ambas freguesias do PS? Será só voto de protesto contra o governo actual, num concelho onde o PSD também desceu?
Olhando sem paixão para os resultados dos últimos sete actos eleitorais, constata-se que, salvo nas 5 freguesias já referidas, os resultados conseguidos pelos socialistas tomarenses nestas europeias foram os piores de sempre. Verifica-se igualmente que a evolução dos resultados eleitorais pode ser considerada do tipo "dentes de serra", ou seja, em termos concelhios, sucessivamente 10.673, nas legislativas de 1999, 5.438, nas autárquicas de 2001, 8.911, nas legislativas de 2002, 6.433, nas europeias de 2004, 10.850, nas legislativas de 2005 e 3.654 nas europeias de 2009.
Procurando ser ainda mais preciso, foram sorteadas duas freguesias do concelho. Saíram a Asseiceira e a Serra. Aqui vão as respectivas sucessões de resultados eleitorais, nas datas referidas acima:
Asseiceira - 1006, 578, 887, 631, 1021, 503, 343.
Serra 203, 156, 150, 122, 145, 106, 70.

A partir daqui, cada leitor fará o favor de tirar as conclusões que entender. Uma coisa é certa: Regra geral, os melhores resultados socialistas são sempre os das legislativas. Só que desta vez, mesmo nessas... Porque será?