Este país é só para funcionários?

Indicações na Porta de S. Tiago, entrada usual para os visitantes do Convento de Cristo. Quem não souber ler inglês ou português, que peça a quem saiba! Horários à vontade dos senhores funcionários do monumento. Encerramento às 18 horas no Verão. Francamente! Fechado a 1 de Janeiro, Sexta-feira Santa, Domingo de Páscoa, 1º de Maio e Dia de Natal.

 Fachada norte do Convento de Cristo, hoje, domingo de Páscoa, às 15 horas.

Viaturas estacionadas junto à fachada norte do Convento de Cristo, hoje cerca das 15 horas...

Escrevia aqui há dias um comentador francês que a pátria de Molière tem os seus problemas, alguns dos quais bem graves e preocupantes, mas que na área da cultura ainda nenhum outro país se lhe compara. E acrescentava que no campo político então, os gauleses estão muito à frente. Há neste momento dez candidatos à presidência da república, entre os quais três trotsquistas!!! Realmente original.

Também nós portugueses temos as nossas peculiaridades, geralmente pouco ou nada agradáveis para com quem nos visita. Estive hoje das 14 às 15 horas junto à Porta de S. Tiago, entrada para Convento de Cristo. Contei 118 forasteiros, que bateram todos com o nariz na porta fechada. A maioria com ar estrangeiro. Os indígenas já conhecem os hábitos da casa. Só um casal de ucranianos resolveu meter conversa comigo, para se informar. Vieram de Odemira, onde moram. Foram-se embora desiludidos. Disseram-me que coisas assim nem no tempo dos soviéticos. Fica o registo.

As múmias empalhadas de uma certa esquerda arqueológica vão, se calhar, indignar-se porque lá estou eu outra vez contra os trabalhadores do sector público, contra os direitos dos trabalhadores em geral e contra os direitos adquiridos. Não é o caso nem o problema. Procuro apenas encontrar melhores caminhos para o futuro desta martirizada terra.

Direitos dos trabalhadores? Direitos adquiridos? Direitos dos funcionários públicos? Pelo caminho que as coisas levam, se não encontramos maneira de dar a volta por cima, um dia destes nem o direito de receber ao fim do mês estará garantido, quanto mais agora certas mordomias de outros tempos...

Se os bombeiros, os hospitais, os polícias, os GNR, as centrais eléctricas, os militares, os transportes urbanos, os aeroportos, os hipermercados, etc. funcionam todos os dias, quer chova, quer faça sol, porque raio hão-de os monumentos e os museus encerrar justamente nos dias em que, por ser feriado, há mais visitantes? Será que os trabalhadores das actividades acima indicadas, e tantos outros, não têm também os seus direitos?

Tomemos este caso do Convento de Cristo no Domingo de Páscoa, alargando-o depois a outros locais de visita. 118 potenciais visitantes numa hora. Admitamos que apenas 50% acabariam por pagar os 6 euros de entrada. Seriam mesmo assim 59x6 = 354€ numa hora. A multiplicar por 6, (três horas de manhã e três de tarde) = 2124€ x 9 (Alcobaça, Batalha, Museu da Arte Antiga, Museu dos Coches, Sintra, Mafra, Queluz, Jerónimos e Torre de Belém) = 19.116€ x 5 (Ano Novo, Sexta Feira Santa, Páscoa, 1º de Maio e Natal) = 95.580€. Sem contar com todas aquelas horas perdidas, no verão, quando os monumentos encerram às 18 e só escurece entre as 21 e as 22 horas...

Felizmente e como é sabido, somos um país rico e sem problemas de défice público ou de dívida externa. E depois a Europa tem lá muito para nos dar; é preciso é saber pedir! Caso assim não fosse, estaríamos realmente a desperdiçar verbas que muito úteis seriam, nomeadamente para actividades de relançamento...

No meu fraco entendimento, o que este caso mostra é que: A - Este país é cada vez mais só para funcionários públicos instalados; B - Os dirigentes do IGESPAR percebem tanto de gestão turística dos monumentos que tutelam, como eu de viola de gamba!

Em boa hora e numa primeira vaga, o governo retirou a autonomia ao IGESPAR, integrando-o na Direcção-Geral do Património. Falta agora o mais importante: retirar-lhe a tutela operacional dos monumentos dos quais os seus técnicos superiores se julgam donos e senhores. Já tarda!