segunda-feira, 24 de maio de 2010

O EQUÍVOCO POLÍTICO TOMARENSE

Foi há mais de 40 anos, mas nunca mais me saiu da memória. Estávamos num seminário para doutorandos. O catedrático anunciou o tema e indagou se alguém pretendia falar sobre determinado capítulo da minha tese sobre o mercado turístico. Inscreveram-se três candidatos. A dada altura, um deles começou a debitar uma análise que me pareceu inadequada, porque partia de pressupostos falsos. O doutorando orador tinha, pensei eu, treslido o que eu escrevera. Ou, no mínimo, interpretara mal o que lera. Concluída a sua intervenção, que durara cerca de 7 minutos, pedi a palavra e interpelei-o, vincando que as suas conclusões só podiam ser falsas, uma vez que partiam daquilo que eu não tinha escrito, e não do real conteúdo da tese em debate.
A sua resposta foi lapidar -Uma vez escrita, começou ele, a obra deixa de pertencer ao autor. O seu significado é exactamente aquele que cada leitor lhe der, nunca o que o autor pretendeu.
Entretanto mudei de país, de língua e de século, mas a situação mantém-se. Desta vez na área da política activa. Os senhores autarcas de Tomar insistem, apesar das evidências em sentido contrário, que sabem muito bem o que estão a fazer, que têm senão um projecto, pelo menos ideias e planos. Trata-se obviamente de um lamentável equívoco, porquanto aquilo que conta, tanto agora como sobretudo em 2013, não é o que eles pensam mas o que os eleitores entendem. E o que entendem neste momento é que a cidade voga à deriva.
Até agora tem havido, praticamente desde o 25 de Abril, um entendimento tácito entre os autarcas, os subsídiodependentes e o lobby das obras públicas. Todos se têm esforçado para encontrar a melhor maneira de beneficiar dos fundos públicos, nacionais ou comunitários. De tal modo que se gerou o hábito do sempre mais -mais fundos disponíveis, mais e maiores subsídios, mais e mais dispendiosas empreitadas.
Como muito bem disse o secretário do tesouro do novo governo britânico, a época da fartura dos dinheiros públicos acabou. Mesmo em Inglaterra, que continua ser uma das grandes potências europeias. Agora imagine-se em Portugal, habitual beneficiário das esmolas de Bruxelas. E em Tomar, conhecida cliente das de Lisboa.
Hernâni Lopes preveniu que o tempo em que no nosso país uns ganhavam e outros perdiam, pelo que se justificavam greves e reivindicações, chegou ao fim com o desmantelamento das barreiras alfandegárias e a adopção do euro. Estamos agora, acrescenta, na fase seguinte, em que todos ganhamos ou todos perdemos, consoante as opções que mais ou menos livremente fizermos. Nestas condições, aqui em Tomar, o tempo trabalha contra os senhores autarcas, salvo no que concerne à sua contagem para efeitos de aposentação. É trágico mas é assim.
Para os dois eleitos pelo PS o futuro é ainda mais problemático, uma vez que, por mero acaso (o mais provável) ou de forma deliberada, lhes atribuiram os pelouros mais armadilhados da autarquia. Nas obras e no urbanismo, a crescente inactividade vai provocar incidentes e crises de toda a ordem, com culpas para o respectivo vereador responsável. Outro tanto sucederá, com mais gravidade, no Turismo, Cultura, Desporto e Defesa Civil. Com cada vez menos recursos disponíveis, para subsídios, manifestações, viaturas ou contratação de artistas, quem é que vai calar todos os que até agora iam molhando a sopa no orçamento autárquico?
De forma que, no modesto entendimento do autor destas linhas, não adianta os eleitos persistirem na afirmação de que têm planos, pois ainda que fosse verdade, já chegavam tarde. Deixou de haver disponibilidade orçamental para os devaneios de cada eleito. Ainda bem!
Trabalhar no arame político, com uma vasta rede orçamental de protecção, não é avaria nenhuma. Actuar sem qualquer protecção é que exige elevadas qualidades e gabarito muito acima da média. É nas tormentas que se conhecem os bons marinheiros, dizem para as bandas da Nazaré. Amen!, exclamo eu. Em 2013, haverá menos dúvidas no eleitorado. E menos oportunistas entre os candidatos. Não há mal que sempre dure, nem bem que se não acabe. Ou vice-versa, consoante quem lê.

5 comentários:

Anónimo disse...

"Em 2013, haverá menos dúvidas no eleitorado. E menos oportunistas entre os candidatos."

Ó homem, você está tão, mas tão, mas tão enganado!

Unknown disse...

A seu tempo veremos!

Anónimo disse...

É a oportunidade que faz o ladrão. No dia em a sustentabilidade do investimento a realizar se revelar condição para a sua prossecução, deixaremos de ter os oportunistas da política que surgem frequentemente ao lado dos empreiteiros.

Anónimo disse...

chefe o PPD/PSD vai ganhar sempre em tomar, pode tirar o cavalinho da chuva que isto nunca vai virar um mar de "rosas" !

Unknown disse...

Os resultados das eleições só são conhecidos, e ainda bem, após a contagem dos votos legalmente entrados nas urnas eleitorais.
Cada qual tem o direito de pensar e de dizer aquilo que entender. Convirá no entanto ter sempre em conta a realidade envolvente. Só as crianças é que têm uma acentuada tendência para confundir os seus desejos com a realidade dos factos.