Dar o corpo à curva...

Quando há três anos comecei a dizer nestas páginas que tínhamos crise para muito tempo, houve quem dissesse a meu respeito o que nem Maomé disse do toucinho. Entretanto caiu um presidente, a crise é cada vez mais agreste, mas apesar disso o novo presidente, Carlos Carrão, continua a achar-se capaz de pilotar a velha e rota barca tomarense até final do mandato. Ou pelo menos assim pensava ainda a semana passada. 

Posteriormente, quiçá também acossado pela incómoda realidade local, pelo menos no que às receitas autárquicas diz respeito, parece ter mudado a espingarda de ombro. Em vez da sua tradicional postura de eleito atento, venerador e obrigado, saiu-se com uma catilinária anti-governamental em plena reunião do executivo, que terá deixado alguns dos presentes boquiabertos.

Sem argumentos próprios consistentes, resolveu recorrer aos da ANMP, e de que maneira. Como se pode ler aqui, ousou questionar o governo do seu partido, no sentido de apurar aquilo que pretende realmente: ajudar as autarquias ou pelo contrário enforcá-las? Trata-se, como decerto quem lê já terá notado, de generalizar abusivamente a penúria municipal tomarense, uma vez que há muitas câmaras praticamente sem dívidas e com menor quebra de receitas. Tal como acontece com o desemprego na Europa.

A infografia abaixo fornece um quadro comparativo com dois grupos de países bem diferenciados. Por um lado, os do Sul (Portugal, Espanha, Itália e Grécia) com elevadas taxas de desemprego (colunas cinzentas) e elevadíssimas percentagens de desemprego jovem (colunas pretas). Por outro lado, os da Europa Central e do Norte (Alemanha, Áustria e Holanda), com taxas de desemprego inferiores a 10%, tanto globais como de jovens. Tal é a situação presente, quer nos agrade ou não. Num caso os países cristãos, onde a Reforma nunca conseguiu singrar; no outro aqueles em que, inversamente, os protestantes representam mais de metade da população. Cada qual fará o favor de sacar as conclusões que entender.

 Le Monde, 14/04/2012, página 11

Quanto ao presidente Carrão, tudo indica que esta sua atitude resultou do desespero que lhe vai na alma, ao concluir finalmente que não tem qualquer hipótese de terminar em boas condições o seu mandato. Começa até a haver dúvidas entre os "laranjas" acerca das suas reais capacidades de governação em época de penúria. De qualquer modo, ao cabo de quase 15 anos de farturas, é mais um autarca com tarimba que se vê forçado a dar o corpo à curva. Agora só lhe falta interiorizar a recente e feliz fórmula sucinta de Miguel Relvas, para todos os autarcas do país: Aprender a gerar valor acrescentado, em vez de gerir riqueza. A vida é dura! E quanto mais para a frente, pior!