António Rebelo
Mesmo procurando não sermos alarmistas, havemos de concordar que a recente entrega, a alguns eleitos, conforme preceituado na lei, do relatório da IGF, veio desencadear um processo cujas consequências ainda estão por determinar. Sabendo-se agora que o citado documento era do conhecimento de pelo menos um eleito da maioria desde Maio deste ano, resulta que os eleitores foram deliberadamente enganados, quando se lhes garantiu, por exemplo, que a situação financeira da autarquia estava controlada e que iriam ser efectuados importantes investimentos, designadamente nos propalados museus da Levada. Na verdade, nem uma coisa nem outra. Quanto às finanças controladas, a situação era tal já em 2006, que o município acabou por ultrapassar os limites de endividamento em 1 milhão 562 mil e 400 euros, pelo que nas transferências do FEF do ano seguinte acabou sendo penalizado em igual montante, nos termos da lei. Chamam a isto controlo ?
Sobre os tais importantes investimentos, anunciados para a Levada e para o Flecheiro, não passam de mais uma falácia. O mesmo relatório é muito claro: "No triénio 2005/07 assistiu-se ao desrespeito sistemático do princípio do equilíbrio orçamental em sentido substancial, facto que impediu que o município de Tomar tenha satisfeito os compromissos anunciados a curto prazo." ..."O município de Tomar, no final de 2007 apresentava uma situação financeira de desiquilíbrio conjuntural que justificava o recurso a um processo de saneamento financeiro."
O mesmo documento não esclarece se tal saneamento foi ou não efectuado. O certo, porém, é que, noutra passagem, refere que os atrasos de pagamento a fornecedores por parte da autarquia, passaram de uma média de 234 dias em 2005, para 258 dias em 2006 e 272 dias em 2007. Segundo a auditoria, não só porque determinado vereador escondesse as facturas numa caixa de cartão, para evitar o seu registo na dívida do munícipio, conforme afirmou o presidente da junta de Paialvo em plena AM, sem ser desmentido ou sequer interpelado, o que configura um tipo de organização interna bastante peculiar, mas sobretudo porque "Numa óptica de curto prazo, o município de Tomar viu a sua situação financeira agravar-se... piorando a capacidade para, atempadamente solver os seus compromissos."
Entretanto recorreu a autarquia a um empréstimo de cerca de 4 milhões de euros, para pagar a (alguns) fornecedores, o que permitiu, de forma artifificial, baixar o atraso médio de pagamento para os 180 dias. Não devemos porém esquecer que tal habilidade consistiu apenas em trocar dívidas de curto prazo, mas sem encargos, por dívida de médio/longo prazo, com juros e outros encargos.
No nosso tosco entendimento, dada a grave crise, designadamente financeira, da autarquia, bem como o facto de os eleitores, e a maior parte dos eleitos, terem sido deliberadamente enganados, por uma maioria que não olha a meios para atingir os seus fins, tendo recorrido a mentiras, omissões, "enganos", adiamentos, habilidades, contabilidade criativa, etc., resta à Assembleia Municipal demonstrar coragem e honestidade, aceitando debater abertamente tais questões e tomar as decisões tidas por indispensáveis. Oxalá !
3 comentários:
Essa de um vereador guardar e retardar as facturas de fornecedores numa caixa de cartão para não engrossar o montante dívidas da autarquia por interesses partidários eleitorais e outros não constitui novidade. O ladino vereador em questão não inventou a artimanha... Ela é quase oficialmente praticada e reconhecida por toda a admin. pública e até no sector privado é muito querida...
É claro que existe regulamentação sobre prazos para contabilização das ditas, bem como procedimentos burocráticos a cumprir, tais como prazos para pagamento...
Acontece que o vereador em questão poderá tão somente comportar-se como o patrão dos funcionários, nomeadamente, do responsável da área contabilística. Ora acontece que esses funcionários e o dito responsável estão "obrigados" a comportarem-se como seus empregados, quando na realidade são servidores públicos e não deste ou daquele vereador ou presidente, com os quais têm deveres de colaboração segundo normas bem definidas, mas não a de conivências deste tipo ou de qualquer outro. E aqui é que está o busílis: os responsáveis dos serviços administrativos alinham nestas artimanhas para satisfazer meros interesses particulares dos políticos e, simultaneamente, os seus, prejudicando o interesse público. É por isso que o OE desbarata milhões de euros com não sei quantos milhares de assessores recrutados fora da adm. pública. Pode dar-se até o caso de certos fornecedores enviarem as facturas directamente ao vereador, o que não me parece lícito, e não custa nada verificar se a sua recepção está registada onde e quando devia. Identificar esses fornecedores e a substância dos serviços das facturas guardadas na caixa de cartão, aguça a curiosidade.... Mas se a auditoria fez saltá-las da dita caixa é porque a sua receção estava registada nos serviços. E é aqui que entra o responsável dos serviços, por não exigir em tempo legal a sua devolução para entrarem definitivamente nas continhas. Por escrito, com conhecimento, numa primeira fase ao PC, e depois... Resumindo: as cumplicidades marotas não têm limite e por isso as primeiras páginas dos jornais e a abertura dos telejornais dão foro de espetáculo de entretenimento com a caca da roubalheira que nos humilha, especialmente quando votamos, como eu, num Primeiro Ministro que não teve ainda uma palavra de indignação e de luta contra a corrupção (no caso em questão não será de roubalheira, mas é corrupção).
Os partidos do poder (PS e PSD) estão mesmo acravados naquilo a que chamamos caca. Essa é que é essa!
P.S. - Parece que aliviei o vereador(cargo público) e carreguei sobre os empregados públicos, pagos pelo Estado com dinheiros dos contribuintes.
Simplesmente porque o funcionário público tem, regra geral, uma "noção difusa do Estado e do seu papel, frequentemente confundida com governantes e lideranças políticas". E não devia ser assim, para que as facturas não fossem parar à caixa de cartão por malandrice do vereador...
Se fosse por malandrice,seria naturalmente criticável, porém facilmente resolúvel. O pior é que no caso em epígrafe a referida artimanha tem sido usada por necessidade. A câmara não tem recursos suficientes para honrar a tempo e a horas os seus compromissos,acostumada que está a gastar acima das suas posses. No tempo das farturas, a coisa ainda ia passando; agora com a crise naconal e local, é a via dolorosa sem fim à vista. Por isso qualquer jogada, mesmo que menos ortodoxa, é sempre bem vinda.
Ao que isto chegou !
Sr. Dr. António Rebelo
Leia com atenção todas as declarações de voto do Rosa Dias e Pedro Marques em relação aos Orçamentos Planos (2006, 2007, 2008 e 2009) e as da prestação de contas de 2005, 2006, 2007 e 2008 e verá que está lá muito daquilo que este Relatório da IGAL aponta.
Infelizmente ninguém ligou patavina aos avisos e alertas, nem o Tribunal de Contas, nem a IGAL, nem a maioria Paiva/Curvelo.
Ainda a procissão vai no adro, a IGAL que dê resposta às participações feitas e vai ver-se com quantos paus se faz uma canoa.
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