Já aqui foi referido anteriormente, de forma sucinta, mas valerá a pena aprofundar um pouco, pois afinal está em causa o nosso devir colectivo. Refiro-me à pertinência dos investimentos autárquicos ou, mais simplesmente, à questão do essencial e do acessório ou supérfluo.
Quando aqui se criticou ou critica a política de obras seguida por António Paiva, tem-se em vista exclusivamente evitar que tais erros se repitam. Para isso é indispensável, julgamos nós, explicar exemplificando com factos, de forma a não restarem dúvidas de que apenas nos guiamos pelo concreto e não por construções ideológicas.
Mesmo os menos versados em História saberão, sem dúvida, que há dois mil anos havia aqui na Península Ibérica povoados e até municípios integrados numa grande e brilhante civilização -O Império Romano. Essas localidades tinham sempre, de acordo com o que agora sabemos, elaborados sistemas de abastecimento de água e respectiva rede de esgotos. Um dos melhores exemplos do grande esforço feito para assegurar o abastecimento de água é o imponente Aqueduto Romano de Segóvia, que chegou até nós bastante bem conservado, de tal forma que é hoje uma das principais atracções e o orgulho daquela cidade espanhola.
Como qualquer outro império, o romano cresceu, atingiu o apogeu, declinou e desapareceu da península. Séculos mais tarde, em 1160, os templários decidiram instalar a sua sede em Tomar e aqui se mantiveram, após breve interrupação já com o nome de Cavaleiros de Cristo, até 1834.
A chamada Casa da Ordem sempre foi das maiores e mais ricas do país, de tal forma que foi graças aos seus recursos que o Infante D. Henrique, nomeado seu governador e regedor, em 1420, iniciou a empresa dos descobrimentos.
Sucessivamente, tivemos o Castelo e a freguesia de Santa Maria do Castelo, os dois claustros e os Paços do Infante, o Coro Alto, a Casa do Capítulo e os Paços de D. Manuel, o enorme (5 claustros) Convento Novo e os Paços de D. Catarina. Ou seja, 400 anos de construções, tudo na vanguarda das épocas respectivas. E no entanto, aquando das Cortes de Tomar, que aclamaram Filipe II de Espanha, neto de D. Manuel I e sobrinho de Dª Catarina, com rei de Portugal, em 1581, o Convento de Cristo não dispunha de água corrente. Tinha magníficos dormitórios, grandes claustros, dois grandes refeitórios, a obra-prima do manuelino, várias cisternas e poços, mas água canalizada não.
O novo soberano e a sua corte, que oficialmente apenas decidiram fazer cortes em Tomar ao saberem que em Lisboa grassava a peste, terão sofrido tanto com a falta de água, em quantidade e em qualidade, que o rei resolveu mandar fazer um aqueduto para abastecimento do Convento, ainda antes de regressar a Espanha. Encomendada ao italiano Filipo Terzi, a obra que hoje conhecemos viria a ficar concluída em 1613/14.
Temos assim que, mais de dez séculos após o auge do Império Romano, das suas fontes e dos seus balneários, uma das mais ricas e mais poderosas casas do país, habitada por cerca de 200 pessoas de forma permanente, e por mais do dobro em ocasiões especiais, quando aqui se encontrava a corte, ou havia capítulo geral, viveu entre 1160 e 1613 sem água corrente. E foi necessário que um rei estrangeiro aqui tivesse parado acidentalmente para que se conseguissse um sistema de abastecimento permanente de água corrente.
Temos assim que, mais de dez séculos após o auge do Império Romano, das suas fontes e dos seus balneários, uma das mais ricas e mais poderosas casas do país, habitada por cerca de 200 pessoas de forma permanente, e por mais do dobro em ocasiões especiais, quando aqui se encontrava a corte, ou havia capítulo geral, viveu entre 1160 e 1613 sem água corrente. E foi necessário que um rei estrangeiro aqui tivesse parado acidentalmente para que se conseguissse um sistema de abastecimento permanente de água corrente.
Como claramente resulta do que acabamos de apresentar, a tendência para preferir o vistoso, o grandioso, o monumental, o espalhafatoso ao útil, não é de hoje nem de ontem. Tem séculos e forte probabilidade de fazer parte da nossa herança civilizacional. O Centro Cultural de Belém, a Expo 98, os estádios do Euro, a nova basílica de Fátima, ou o TGV não são meros frutos do acaso. É por isso importante, neste ano de eleições, em que atravessamos uma grave crise cujo fim ainda se não vislumbra, que os tomarenses pensem muito bem antes de decidirem onde colocar a cruz. Em particular nas eleições autárquicas de Outubro próximo. O paleio vai ser, tudo indica, mavioso mas oco, como habitualmente. Os eleitores devem portanto insistir no sentido de que pretendem linguagem concreta, substantiva, simples, entendível por todos, chã; e não programas, discursos ou intervenções cheios de ideias gerais, onde cabe tudo e mais alguma coisa, que são autênticas avenidas rumo ao poder pessoal, sem qualquer hipótese realista de controlo pelos seus pares. Nunca esquecer o que já nos aconteceu, particularmente durante os mandatos dee António Paiva. É mais fácil e vale mais prevenir que remediar.
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