terça-feira, 15 de setembro de 2009

DEMOCRACIA, ELEIÇÕES E ILUSÕES

Foto El País
São de enorme importância as eleições que aí vêm, não só por causa da crise em que estamos mergulhados, mas igualmente para acabar com determinadas ilusões.
Se o leitor reparar com alguma atenção na fotografia supra, há grandes hipóteses de vir a reconhecer sem esforço os rapazes que nela figuram. São os célebres 4 de Liverpool, progenitores da melhor música moderna. Como pode ver, inicialmente eram adolescentes como quaisquer outros. Nem sequer usavam ainda os célebres cabelos compridos. Foi a fama mundial adquirida que os transformou e os levou à progressiva desagregação, seguida de separação definitiva.
Ocorre sensivelmente a mesma coisa com a democracia. Ao princípio "governo do povo pelo povo", tem vindo a degenerar (ou a aperfeiçoar-se, dirão os que dela vivem) até se transformar naquilo que temos hoje. Como se verificou na prática que não é possível "o povo" governar-se a si próprio, apareceu a necessidade de escolher delegados-representantes, os quais por sua vez escolhem quem governe e participam nesse governo.
No caso português, a própria escolha dos delegados-representantes está viciada, uma vez que os eleitores apenas são chamados a seleccionar uma lista de nomes que, na maior parte dos casos, nem conhecem, e que foram previamente indicados por um aparelho partidário ou por um grupo restrito de cidadãos. Não há, portanto, entre nós eleições primárias, nem eleições uninomimais, o que tende a desmotivar os eleitores, uma vez que antes de serem chamados a escolher já houve escolhas bem menos participadas, ou claras e justas.
Ainda assim, é uma obrigação importantíssima cumprir o dever de votar, apesar das evidentes imperfeições do sistema. Abster-se é o mesmo que estar-se nas tintas, acobardar-se, ser desleal para com os seus concidadãos. E resulta quase sempre em situações pouco conformes com a realidade, tal como ela é na verdade. Na actual campanha eleitoral há forças de extrema-esquerda, lideradas por pessoas aparentemente de elevado gabarito intelectual, as quais apesar disso (?) não hesitam em tentar ludibriar os eleitores, acenando-lhes com cenários à primeira vista sedutores, mas mortíferos se levados à prática.
A situação é, actualmente, esta: somos o único país da Europa onde, no mais recente escrutínio livre realizado, os dois partidos da extrema-esquerda obtiveram 25% de votos, o que corresponde a um em cada quatro. Lá fora, primeiro houve alguma surpresa e subsequente alarme. Porém, feitas as contas, tudo visto e ponderado, concluíram que era apenas uma ilusão de percentagens. Cá dentro, foi e continua a ser diferente. Os dirigentes de pelo menos uma dessas forças, entusiasmados em excesso com o inesperado resultado alcançado, começaram a "construir castelos em Espanha", mesmo antes de terem conquistado o país vizinho. Um deles afirma até convictamente, na televisão e nos comícios, que o seu partido está pronto a assumir responsabilidades governamentais. Só?! E todavia...
E todavia, o que aconteceu é bastante diferente, como se passa a tentar explicar. Em virtude do crescente desinteresse pela política, provocado por diversos factores, entre os quais está a crise, a cada vez maior complexidade do mundo, a importância do futebol e a manifesta falta de educação cívica, a que convém adicionar a gritante ignorância em relação aos assuntos europeus, muitos eleitores inscritos pensaram ser mais confortável, fácil, ou prático, não exercerem o seu direito de voto na Europeias. Para facilitar as coisas, digamos que andaram à roda de metade = 50%. Daqui resultou a tal ilusão das percentagens.
Geralmente muito mais motivados, até porque se trata de votos de protesto, de vingança e de inveja, e os deixados por conta da sociedade adoram essas atitudes, contados os votos, a referida extrema-esquerda obteve um em cada quatro. Contudo, se em vez de ter havido 50% de abstenções, a participação eleitoral tivesse sido igual a 100%, os mesmos resultados corresponderiam apenas a 12,5%, o que seria bem diferente e não teria provocado tantas afigurações. Mas não foi assim, dirá o leitor inflamado. Pois não; mas mostra bem que quando os eleitores resolvem não exercer o seu direito, depois também não têm qualquer autoridade ética para criticar, ou sequer estranhar, eventuais percentagens estrambóticas conseguidas por partidos situados nas margens do sistema. É só para prevenir, dado que eleitor prevenido...

3 comentários:

Frei Gualdim disse...

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Foi a fama mundial adquirida que os transformou e os levou à progressiva desagregação, seguida de separação definitiva.
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Deduzimos que se "não tivessem adquirido a fama" ainda estariam a tocar juntos...

ACADÉMICO disse...

BEATLES FOR EVER!

A cantar (músicas destas ) é que a gente se entende!

E o resto são cantigas!

Pensamentos soltos disse...

."No caso português, a própria escolha dos delegados-representantes está viciada, uma vez que os eleitores apenas são chamados a seleccionar uma lista de nomes que, na maior parte dos casos, nem conhecem, e que foram previamente indicados por um aparelho partidário ou por um grupo restrito de cidadãos".

Concordo plenamente e acrescento, no caso das eleições legislativas, conhece-se o cabeça de lista(candidato vísivel) nas não o resto dos membros que poderão formar o governo caso seja eleito, isto por ex., do caso de Sócrates dizer que pode mudar os ministros, tudo bem mas quais? Não sabemos, só depois da votação do candidato.