Entre a cidade e o Convento de Cristo, o desentendimento é gravérrimo e multi-secular. Desde os alvores da nacionalidade até 1834, porque as ordens vinham lá de cima. Após essa data e até agora, porque as ordens deviam ir cá de baixo, em conformidade com o regime que a todos nos rege, mas não. Vêm de Lisboa, não se percebe bem porquê. A este imbróglio quase milenar juntam-se agora as cada vez maiores exigências do mundo contemporâneo, transformando a questão numa série de nós difíceis de desatar, designadamente porque os dirigentes que temos e temos tido possuem certamente imensas e admiráveis qualidades, mas a coerência e a pertinência não fazem de modo nenhum parte do rol.
Quem segue com atenção essa pujante actividade prurifacetada que é o turismo, já terá constatado duas grandes tendências conexas -o aumento exponencial do turismo ambiental, naturalmente pedestre, e o cada vez mais necessário afastamento do trânsito automóvel em relação aos monumentos, em prol da defesa do património, para o qual os gazes de escape são um poderoso veneno. Para não irmos por essa Europa ou por esse Mundo fora, basta atentar no que tem sido feito na Batalha ou em Alcobaça, monumentos integrados na mesma rota turística do nosso Convento de Cristo.
Na Batalha, a estrada nacional nº 1, que passava mesmo junto ao mosteiro, foi sendo sucessivamente desviada, exactamente com a argumentação de que era necessário proteger aquela obra de arte da poluição e das vibrações do solo provocadas pela trânsito. Infelizmente, também neste caso, a clássica e muito portuguesa falta de coerência e de pertinência, permitiu que mais tarde instalassem parques de estacionamento à ilharga do mesmo monumento. Assim a modos que como num jogo de afasta daqui/aproxima dali.
Em Alcobaça, os arranjos são mais recentes e muito mais pertinentes e adequados. O trânsito e o estacionamento foram proibidos em todo o imenso largo fronteiro ao monumento, que foi requalificado, mantendo as quase centenárias casas de banho, sempre impecáveis e com guarda. Outra terra, outros usos...
Enquanto isto, em Tomar queixam-se os comerciantes que os visitantes do Convento, cerca de 150 mil por ano, não vêm ou raramente vêm cá abaixo, ao mesmo tempo que o presidente da câmara afirma pretender desenvolver o turismo, como solução para a manifesta crise que a todos aflige. É neste quadro que a autarquia, persistindo na implementação de projectos que já demonstraram a sua falta de adequação e/ou de oportunidade, resolveu agora proceder à adjudicação do arranjo urbanístico da envolvente ao Convento de Cristo, e do percurso pedonal Cidade-Castelo através da Mata dos Sete Montes. Trata-se de dois erros crassos e monumentais, para não usar palavras mais fortes, que envergonhariam quem escreve e quem lê. Há que manter o nível.
Desde logo, se o grande problema local é o facto de os turistas irem ao Convento e não descerem à cidade, não é seguramente facultando-lhes parqueamento lá em cima que eles passarão a vir cá abaixo. Ou será ? Dirão as múmias do costume, que os actuais locais de estacionamento estão muito degradados, que nos envergonham, que as casas de banho... É verdade, sim senhor. Uma coisa porém é a manutenção periódica, muito mais barata; outra muito diferente, as onerosas obras novas, que depois se vão degradando, por falta de adequada manutenção. De qualquer forma, mais cedo ou mais tarde, consoante a capacidade de quem nos administra para acompanhar o progresso, o trânsito automóvel terá de ser banido lá de cima. E sem veículos também não haverá estacionamento.
No caso do percurso pedonal através da velha Cerca do Convento, trata-se sobretudo de um projecto hipócrita. O que se pretende na realidade é instalar um colector dos esgotos do Convento, actualmente a céu aberto próximo da Torre da Condessa, até ao cimo da Rua da Graça (Av. Cândido Madureira). O tal arranjo do percurso pedonal, com instalação eléctrica e tudo, quando a Mata fecha às cinco da tarde e o Convento idem idem, é apenas um pretexto para sacar verbas da União Europeia, no quadro de QREN. Como se os cidadãos fossem todos lorpas e os autarcas umas sumidades...
Acresce que o referido percurso já existe há séculos. Apenas não é utilizado por falta de adequada sinalização e informação, porque o portão da Torre da Condessa está sempre fechado, e porque quem chega ao Convento de autocarro ou automóvel, é evidente que não vai descer à cidade a pé. Tal como salta aos olhos que havendo parques lá em cima, ninguém deixa o carrinho cá em baixo para ir a pé por aí acima. Por conseguinte, a incoerência é manifesta entre os dois projectos -os parques tornam o percurso supérfluo; o percurso torna os parques desnecessários.
Perante isto, os Independentes por Tomar, apresentaram ontem uma declaração de voto, na qual consideram existirem situações "que não se encontram devidamente fundamentadas", que "em determinados casos o júri pronunciou-se e tomou decisões sobre matérias para as quais não tinha competência", e que não constam do processo "elementos essenciais à sua apreciação e decisão pelo Executivo Camarário." Alegam finalmente que "este processo devia ser integralmente analisado do ponto de vista jurídico e objecto de competente parecer."
Estas alegações são graves e os atropelos evidentes. Bem andaram por conseguinte os vereadores IpT ao apresentarem tal declaração. Contudo, mandam a verdade e a franqueza dizer que estamos perante mais um caso evidente de política à moda de Tomar. Quais as decisões que não estão devidamente fundamentadas ? Quais os casos concretos em que o júri se pronunciou sem que para tal tivesse competência ? Quais os elementos fundamentais que não integram o processo ? Mistério... Continua subjacente entre os senhores juristas e os senhores autarcas, que estas coisas devem ser só para iniciados, que a arraia-miúda serve para pagar impostos e para votar, mas manifestamente não percebe nada destas matérias. E quanto menos se lhe disser melhor... Pensam eles de que.
E que tal, de uma vez por todas, começar a chamar as coisas pelos nomes, a falar claro e a urinar a direito ? É que já vai sendo tempo ! Afinal o 25 da Abril já foi há 35 anos e a paciência popular também tem limites... Mesmo em Tomar, cuja população é sobejamente conhecida pelo seu conformismo e pela sua passividade.
7 comentários:
Na mouche!
A actuação camarária, de alguns anos a esta parte, está em sacar verbas a Bruxelas, via QREN ou QCA. Pouco interessa que os projectos sejam sustentáveis ou façam sentido. O que interessa é sacar a massa, esquecendo o que custa a manutenção destas infra-estruturas (no futuro) e ainda que alguém também irá contribuir financeiramente para a respectiva contrapartida nacional (no presente).
Nunca daremos Tomar por alcavala a alguém
http://charolinha.blogspot.com/
Bom dia.
Se me permite levanto-me e aplaudo.
Começou a guerrilha política nas reuniões de Câmara.
Declaração de voto dos Independendentes por Tomar:
"Propõe o Sr. Presidente da Câmara a revogação da deliberação tomada na última reunião de 30 de Outubro de 2009 que designou como Vereadores a tempo inteiro os Srs. José Becerra Vitorino e Luis José da Silva Ferreira, a qual é eficaz e teve consequências com a nomeação dos Srs. Vereadores a tempo inteiro e a delegação e subdelegação de competências, cuja execução também já teve lugar.
Na proposta ora apresentada o Sr. Presidente da Câmara afirma que estes Srs. Vereadores não se ausentaram da sala e que também não tomaram parte na referida deliberação.
No entendimento dos Vereadores Independentes por Tomar qualquer membro do Executivo Camarário que esteja presente numa reunião, se não puder participar e deliberar sobre qualquer assunto, terá de viva voz manifestar essa sua declaração de vontade e ausentar-se previamente no início da discussão desse assunto.
Ora, na reunião de 30.10.2009, o que efectivamente aconteceu é que esses Srs. Vereadores nunca declararam que não participavam, não se ausentaram da sala e assinaram a minuta da deliberação então tomada.
De todos os membros do Executivo Camarário só os Vereadores Independentes por Tomar, para além do Sr. Presidente da Câmara, é que se pronunciaram sobre o este assunto e manifestaram, de forma clara e inequívoca, o seu voto.
Face à deliberação tomada em 30.10.2009 e ao teor da proposta ora apresentada pela Sr. Presidente da Câmara, colocam-se ainda outras questões, que são, nomeadamente, a de saber se os referidos Srs. Vereadores, ao não se terem declarado impedidos, não se terem ausentado da sala e terem assinado a deliberação, expressaram ou não o seu voto e, caso o não tenham feito, se é possível - o que, aliás, se nos não afigura - estarem presentes na reunião e absterem-se de votar.
Tendo em conta o atrás exposto os Vereadores Independentes por Tomar votam contra."
Apesar de votarem contra a proposta foi aprovada pela maioria PSD/PS. Presume-se que irá ser a votação habitual dos temas mais "acesos".
Sugiro ao Sr. Presidente que siga a intenção do Presidente da assembleia municipal e que também permita que as reuniões do executivo municipal sejam acompanhadas via online no sítio da Câmara Municipal ou dos orgãos de comunicação social.
Quem não pesca nada da matéria do seu post sou eu.
Que me parece mais que evidente que o senhor sabe do que escreveu, é um facto. Até o li duas vezes.
Que a "declaração de voto" é um conjunto de banalidades, sem conteúdo algum, não restam dúvidas.
Só não percebo porque o Presidente da Câmara não o "requisita" (pagando), para assessorar a autarquia nestas e noutras questões
com os seus pareceres muito bem fundamentados.
Mesmo assim... - surtudos estes autarcas, disporem de um munícipe que diariamente lhes disponibiliza opiniões, críticas,etc..
O seu blogue é um autêntico serviço público - à borla.
Muito abrigado amigo Caiano, mas não há razão para tanto. Limito-me, como sempre, a exercer activamente os meus direitos de cidadania. E tencinono continuar a fazê-lo enquanto também pagar impostos. Viva república ! Viva a liberdade ! Assim gritava o saudoso Carvalhais quando entrava no Café Paraíso. Assim grito eu.
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No caso do percurso pedonal através da velha Cerca do Convento, trata-se sobretudo de um projecto hipócrita. O que se pretende na realidade é instalar um colector dos esgotos do Convento, actualmente a céu aberto próximo da Torre da Condessa, até ao cimo da Rua da Graça (Av. Cândido Madureira). O tal arranjo do percurso pedonal, com instalação eléctrica e tudo, quando a Mata fecha às cinco da tarde e o Convento idem idem, é apenas um pretexto para sacar verbas da União Europeia, no quadro de QREN. Como se os cidadãos fossem todos lorpas e os autarcas umas sumidades...
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Sopram-me da campa do lado que tal é apenas mais um projecto nado e criado na cabecinha de uma sumidade que já foi Presidente da Câmara e agora lida com dinheiros públicos (nacionais e comunitários).
Parece que se gaba de ser muito bom a sacar verbas dos cofres de Bruxelas e aspira a grandes voos nas empresas de construção da praça. Até a uma próxima face oculta...
Deixe-me adivinhar: Pa...pa...pa...Paiva!!!
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