O editorial da revista francesa L'EXPRESS, cuja tradução vai a seguir, nada tem que ver connosco, pacatos e satisfeitos cidadãos tomarenses. À primeira vista, claro; porque aprofundando... Permitam-nos, por isso, algumas pistas de leitura: 1 - Tentar compreender a presente situação política em França; 2 - Mudar os nomes, o local e a escala, de forma a apurar as similitudes com a situação portuguesa actual; 3 - Mudar outra vez os nomes, o local e a escala, para comparar com a situação tomarense.
Dirão que nada têm a ver umas coisas com as outras. E exemplificarão com o facto de Cavaco não ter perdido as legislativas, enquanto que Sarkozy acaba de perder as regionais. Têm razão. Mas em Portugal quem governa é o primeiro-ministro, que por sinal até perdeu a maioria absoluta, o que constituiu uma derrota para ele. E mesmo aqui à beira Nabão... 4 - Sem necessidade de mudar o que quer que seja, comparar a linguagem e o conteúdo com a alegada "má lingua" aqui do blogue...
"MAIS DEPRESSA !"
"Entre as várias doenças profissionais, há a silicose dos mineiros e o autismo para os presidentes da República. Todos foram por ela atingidos, tendo o povo sido forçado a multitudinárias manifestações de cólera: De Gaulle em Maio de 68, Mitterrand com a manifestação a favor do ensino livre, em 1984, Jacques Chirac com as greves de novembro de 1995... E agora, uma vez mais, o aviso das urnas eleitorais resulta do alarme da rua. Oxalá esta deflagração das eleições regionais incite Nicolas Sarkozy a ouvir o país. A sua política de combate à crise, a governança da coisa pública e a estratégia de reorganização da direita, acabam de ser rejeitadas pelos franceses. Deve, portanto, alterar tudo, e a tímida remodelação ministerial de 22 de Março, não constitui de forma alguma resposta suficiente.
Na verdade, a França necessita de uma ruptura da ruptura, que não se limite à pausa já anunciada pelo presidente, imediatamente antes das regionais, para finais de 2011, mas pelo contrário, uma forte aceleração, imediata e irreversível. Não com o objectivo de aplicar em marcha forçada o programa do candidato Sarkozy, desvalorizado de forma irremediável pela crise, mas tendo em vista a execução das reformas mais essenciais. A das pensões e dos custos sociais, antes de mais nada: que a franqueza dos debates salve finalmente o sistema francês de uma vez por todas ! A das finanças públicas, logo a seguir: que a verdade dos números seja a base de novo rigor consensual, com sacrifícios suportados por todos, de forma equilibrada ! A do ensino, enfim: que o mais essencial de todos os serviços públicos torne a ter brilho, ambições, disciplina, responsabilidades e meios materiais !
Geralmente surdo face às cóleras do povo francês, saberá Nicolas Sarkozy escutar os novos profetas, que lhe dirão como inventar a França de 2012, em vez de reencontrar a de 2007 ? Infelizmente, o presidente não estima muito os que pensam de maneira diferente. Procura convencê-los em vez de tentar compreendê-los. Não gosta de se complementar, gosta que com ele concordem. Detesta mudar, prefere mudar as coisas.
Houve uma época em que também a esquerda queria mudar as coisas -e até mesmo a vida. Despida das suas ilusões, curtida pelas derrotas, ainda não conseguiu concluir a lenta mutação, iniciada após o desastre eleitoral de 2002. Se a marcha triunfal de domingo passado lhe der a audácia necessária, a esquerda pode agora convencer o povo de que está finalmente preparada para governar de novo. Para isso, tem de escolher o mais rapidamente possível, em todo o caso antes da próxima primavera, um candidato ou uma candidata, que poderá finalmente pintar um projecto para a França que não seja a aguarela baça das sínteses de congressos, ou das alianças tímidas das colectividades locais. Um projecto debatido antes das eleições primárias, será certamente uma sopa morna. As eleições primárias antes da redacção do programa, serão a garantia de um prato saboroso, picante e de sustância.
Porque a época é de urgências, cada um dos campos deve acelerar as suas actividades. Mudar depressa, mais depressa ! Tanto para a direita como para a esquerda já não é sem tempo. Porque, para a França, se calhar até já é demasiado tarde."
Christophe Barbier, L'Express, 25/31/03/10, página 3
Nota introdutória, tradução e adaptação de António Rebelo
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