sexta-feira, 9 de abril de 2010

COMO O ESTRANGEIRO NOS VÊ

O sistema político francês comporta dois parlamentos, a Assembleia Nacional, homóloga da nossa Assembleia da República, e o Senado, com poderes constitucionais para apoiar, emendar ou rejeitar os diplomas aprovados por aquela. O senador Marini, eleito pela zona de Oise, publicou recentemente (ver ilustração supra), na secção "Debates/Decifrações" do "Le Monde", uma análise na qual se refere detalhadamente a Portugal. Tratando-se de um político veterano, qualificado em economia, dado que é Relator da respectiva comissão especializada do senado francês, mas fora da luta política portuguesa, pareceu-nos que a sua opinião terá algum interesse para os nossos leitores. Acrescente-se que o senador Marini é da UMP, o partido que apoia o presidente Sarkozy, seu fundador e actual líder "de facto". Eis o que escreveu aquele parlamentar gaulês, unicamente na parte que se refere ao nosso país.

"Em Portugal, país fortemente vigiado e pressionado pelos mercados financeiros e pelas agências de notação, o governo elaborou um programa de estabilidade tendo por base hipóteses de crescimento manifestamente modestas. E decidiu submetê-lo ao parlamento, no qual apenas dispõe de uma maioria relativa. Após ter implementado, a partir de 2000, uma primeira correcção orçamental, que diminuiu o défice público de 6,5% para 2,5% do PIB, este pequeno país vê-se agora na obrigação de repetir esse esforço.
Apesar disso, Portugal está englobado, de forma injusta, na injuriosa lista dos PIGS (Portugal, Irlanda, Grécia, Espanha) pelos operadores dos mercados financeiros. Apesar de não padecer de crise financeira, ou imobiliária... Apenas de uma acentuada queda das exportações para Espanha, que sofre uma verdadeira crise de modelo económico, e cujas dificuldades são de outra amplitude...
Comparando os dados monetários ou macro-económicos de Portugal com os da França, constata-se que são praticamente idênticos. E no entanto, graças a Deus, as condições de financiamento da dívida francesa nos mercados internacionais continuam estáveis, enquanto que as referentes a Portugal se deterioraram nitidamente... Certamente porque os que nos observam do estrangeiro consideram que a França tem mais possibilidades de recuperar e de melhorar a sua competitividade na fase de ultrapassagem da crise.
Terão razão ? Ousará o nosso governo imitar o português, submetendo o programa de estabilidade à votação do parlamento ? Terá o nosso governo a intenção de cumprir o seu programa, ou tratar-se-á apenas da nova edição da dupla linguagem, à qual não escapou nenhum dos anteriores programas de estabilidade dos últimos dez anos ? Uma linguagem aparentemente rigorosa para Bruxelas e para os nossos parceiros, uma outra compassional para a opinião interior, recheada de promessas naturalmente sem financiamento ! Os analistas financeiros sabem isso muito bem, mas continuam a considerar que a França pode vir a ter êxito na sua ultrapassagem da crise, graças às reformas que facilitarão a sua competitividade.
Exactamente no momento em que o pobre Portugal surge como o novo elo mais fraco da zona euro, Christine Lagarde (Ministra das Finanças, em França) critica os esforços egoistas da Alemanha para aumentar ainda mais o seu saldo positivo exterior. Agindo desta forma, apanha em contra-pé os habituais raciocínios das agências de notação financeira. É claro que podemos ser sensíveis à sua argumentação, que tende a federar todos os estados preocupados com a predominância económica, ou até política da Alemanha. Mas que modelo alternativo temos para lhes propor ?"... ... ...

Philippe Marini, Le Monde, 07/04/10, página 17

Notas, tradução e adaptação de António Rebelo

1 comentário:

Anónimo disse...

Surgiram hoje informações de que as exportações portuguesas cresceram quase 8 por 100 nos últimos três meses. Grande marca!

José Sócrates é um prodígio político em Portugal. Quer queiram ou não.

Mais uma boa razão para ter sido acertada a aliança do PS local com o Psd local.

O PSD, dê os "passos" que der, não vai ter hipótese.

Sócrates come-os todos, porque é pragmático; e do pragmatismo fogem os políticos portugueses como o diabo da cruz.

O artigo de Philippe Marini só abona em favor de Sócrates.