Provando mais uma vez que quem vê caras não vê massas cinzentas, esta senhora, Monique Canto-Sperer, é uma das grandes "cabeças" europeias e mundiais. Talvez um próximo Nobel. Formada em filosofia, dirige há quatro anos a "École Normale Supérieure de Paris", uma das "Grandes Écoles" mais prestigiadas de França. Para os nossos leitores terem uma ideia dos seus níveis de exigência, bastará referir que apenas aceitam em cada ano os primeiros 40 classificados do concurso nacional, que este ano registou 4.500 candidatos. Só podem concorrer os candidatos com o "bac" (equivalente ao nosso 12º ano) + dois anos de preparação específica, em liceus de élite, para os quais também tiveram de concorrer, prestando provas escritas e orais.
Numa altura em que entre nós se fala em acabar com os "chumbos", como se ainda existisse no nosso país algum tipo de avaliação rigorosa, salvo raras excepções (IST, Católica, ISEG, e pouco mais), pareceu-nos útil citar algumas declarações desta ilustre intelectual, sobretudo para o corpo docente/decente do ensino superior desta região...
"Formar pela investigação científica significa reunir duas exigências: solidez dos conhecimentos e dos métodos, incitamento constante para descobrir coisas novas, para criar, para inovar. O doutoramento é isso mesmo -definir uma tese que ninguém tenha postulado antes, demonstrar a sua veracidade, e provar que ela vai enriquecer o estado da arte na disciplina respectiva. Assim se adquire um funcionamento intelectual aberto à inovação e à criatividade, posteriormente útil em qualquer profissão de alto nível. ... ...
Não há perda de qualidade na investigação científica francesa. Apenas uma certa formatação das consciências, imposta em muitas fileiras de élite. A questão fundamental do ensino superior é esta: Que tipo de consciências pretendemos formar? Nos Estados Unidos, as primeiras universidades foram concebidas a partir de uma importante participação da sociedade civil, como forma de responder à referida questão. Os estudantes americanos undergraduate não sabem muito, mas aprenderam a ser inventivos: fazem perguntas complexas, contestam, argumentam. Em França temos excelentes fileiras selectivas, mas com demasiado "empinanço" e formatação das consciências. Enquanto isto, nas universidades a formação de base dos estudantes é com frequência insuficiente.
Na nossa escola, a ENS, rue d'Ulm, há anos que nos afastamos de tais concepções. Procuramos associar por todos os meios exigência nos conhecimentos, qualidade da formação geral e incitamento à investigação científica. Exigência e liberdade, eis o nosso lema; porque se a consciência não é livre, não consegue inventar nada. Nós conseguimos porque os nossos alunos são excelentes, mas com a qualidade geral dos estudantes franceses, porque não implementar este modelo na maior parte do ensino superior?... ... ...
O concurso de entrada na nossa escola, sobretudo em letras, é igualmente um teste psicológico, convindo ter depois de admitido evidentes capacidades de resistência. Estamos a tentar, com outras Grandes Escolas, uma evolução do nosso concurso, no sentido de se apurar igualmente o nível de cada aluno no fim dos dois anos preparatórios. Pensamos poder criar para Letras algo idêntico ao que já existe para Ciências -um "banco de exames" comum a várias Grandes Escolas, o que nos permitirá garantir uma via académica para um terço dos alunos de preparatória, nas escolas de gestão, institutos de estudos políticos, ou outras fileiras selectivas. Actualmente, num total de 4.500 alunos que se apresentam às provas dos exames de admissão, só 200 entram nas cinco escolas normais superiores. ... ... ...
Para diversificar a origem social elitista dos nossos alunos, há que modificar os programas do ensino básico e secundário, reforçando o carácter progressivo e normativo das aprendizagens. A escola é um lugar onde se aprende o que não sabemos, e não um lugar onde exprimimos o que julgamos saber. É imperativo reinstalar métodos de aprendizagem que permitam aos alunos provenientes de camadas sociais modestas adquirir os conhecimentos e as práticas societais de que não puderam beneficiar até então. ... ... ...
Os políticos, sobretudo à esquerda, são quase todos contra qualquer forma de selecção. Acontece até que alguns deles fazem tudo o que é possível para conseguir que os seus filhos e outros familiares consigam lugar nas Grandes Escolas, ao mesmo tempo que vão contestando a selecção e propondo a sua supressão imediata... Os nossos alunos não podem ser considerados como privilegiados, porque, além das suas reais capacidades, decidiram dedicar a sua juventude ao trabalho árduo. Alguém tem dúvidas sobre a pertinência do Conservatório Nacional de Música? Pois a nossa tarefa é semelhante. Recebemos 40 matemáticos por ano, para com eles constituir um viveiro de futuros medalhados Fields (equivalente ao Nobel da Matemática). Pois bem, dos mil alunos de matemática saídos da nossa escola desde 1950, oito obtiveram a Medalha Fields, uma percentagem única no mundo. Quem pensa que estamos ultrapassados, pelo que já não servimos para nada, fará o favor de meditar neste facto. Os resultados é que contam.
Cristophe Barbier/Olivier Roller (foto)/ L'EXPRESS
Tradaptação António Rebelo/Tomar a dianteira
3 comentários:
GRANDE TEXTO!
É DESTES QUE TODOS NECESSITAMOS...SERIEDADE, RIGOR, EXIGÊNCIA. CONNOSCO, E COM AQUELES A QUEM DEVEMOS O DEVER DE FORMAR
É, são para alguns. Uma infíma parte. E para os outros?
Por cá quando se fala de educação não será legítimo aspirar a melhor do que jogos estatísticos de sucesso, passagens administrativas, Novas Oportunidades, CEFs e EFAs de qualidade e eficácia duvidosas. Não será legítimo aspirar a que quem dirige os destinos do ME faça um pouco mais do que importar resultados de modelos, sem sequer procurar conhecê-los e saber como se atingiram os resultados que exaltam? Não será legitímo, já que se mostram incapazes de definir um rumo para a educação em Portugal, que, pelo menos, mostrem conhecimento sobre o que falam, em vez de debitar discursos de circunstância, sem substracto, nem coerência. Quando falam dos modelos Nórdicos, supostamente sem "chumbos" (não tem a ver com caça)esquecem-se de dizer que estes países já em 1850 tinham atingido perto dos 100% na irradicação da iliteracia, que as turmas não têm mais de 15 alunos, que as escolas do 1º ciclo, não têm mais de 50, que se privilegiam as escolas pequenas e próximas das comunidades...que os alunos com dificuldades têm um acompanhamento individualizado e sistemático? Por isto, e como resultado não necessitam de "chumbar" alunos. Por cá nada disto interessa, porque queremos a lua sem ter feito nada para a alcançar. Será que já se deram conta que nos EUA e em Inglaterra, países que há vinte anos enveredaram pela megalomania da sustentabilidade contabilística e organizaram mega escolas, estão a braços com níveis insustentáveis de insucesso e marginalidade nas escolas? Será que já se deram conta que, nestes países, a palavra de ordem volta a ser "small is beautiful" e se caminha para a reactivação de escolas pequenas e a concepção espaços de aprendizagem humanizados e mais próximos das necessidades dos alunos. Concluem,actualmente, os estúpidos, que o que pouparam nesse tempo já gastaram em triplo, a resolver os problemas que a poupança criou...por cá, que somos espertos, temos a eterna tendência de nada aprender com os outros, embora nos armemos em modernaços e pseudo entendidos, vamos exactamente cometer o mesmo erro, vinte anos depois, que é a marca do nosso atraso endémico. Não importa que as comunidades percam o único espaço que os liga à cultura e à aprendizagem - as associações para jogar à bisca e beber copos, não as substituem - nem que se afastem crianças de três anos do seu meio, obrigando-as a viagens diárias de 1 hora , para as atirar para os mega qualquer coisa...é tudo a bem da sustentabilidade que alguns pagam e outros embolsam. Como somos ricos podemos perfeitamente andar atrás dos outros a cometer os seus erros e a navegar à vista. Quando temos um ME incapaz de aprender, como podemos exigir que na escola se aprenda. Em França, pelo menos conseguem ter 8 prémios Nobel da Matemática, e duzentos alunos a entrar por ano numa escola que forma elites...são quantos milhões de habitantes? As taxas de insucesso representam o quê, atingem quem? Mas, pelo menos, têm verdadeiras elites.
É, são para alguns. Uma infíma parte. E para os outros?
Por cá quando se fala de educação não será legítimo aspirar a melhor do que jogos estatísticos de sucesso, passagens administrativas, Novas Oportunidades, CEFs e EFAs de qualidade e eficácia duvidosas. Não será legítimo aspirar a que quem dirige os destinos do ME faça um pouco mais do que importar resultados de modelos, sem sequer procurar conhecê-los e saber como se atingiram os resultados que exaltam? Não será legitímo, já que se mostram incapazes de definir um rumo para a educação em Portugal, que, pelo menos, mostrem conhecimento sobre o que falam, em vez de debitar discursos de circunstância, sem substracto, nem coerência. Quando falam dos modelos Nórdicos, supostamente sem "chumbos" (não tem a ver com caça)esquecem-se de dizer que estes países já em 1850 tinham atingido perto dos 100% na irradicação da iliteracia, que as turmas não têm mais de 15 alunos, que as escolas do 1º ciclo, não têm mais de 50, que se privilegiam as escolas pequenas e próximas das comunidades...que os alunos com dificuldades têm um acompanhamento individualizado e sistemático? Por isto, e como resultado não necessitam de "chumbar" alunos. Por cá nada disto interessa, porque queremos a lua sem ter feito nada para a alcançar. Será que já se deram conta que nos EUA e em Inglaterra, países que há vinte anos enveredaram pela megalomania da sustentabilidade contabilística e organizaram mega escolas, estão a braços com níveis insustentáveis de insucesso e marginalidade nas escolas? Será que já se deram conta que, nestes países, a palavra de ordem volta a ser "small is beautiful" e se caminha para a reactivação de escolas pequenas e a concepção espaços de aprendizagem humanizados e mais próximos das necessidades dos alunos. Concluem,actualmente, os estúpidos, que o que pouparam nesse tempo já gastaram em triplo, a resolver os problemas que a poupança criou...por cá, que somos espertos, temos a eterna tendência de nada aprender com os outros, embora nos armemos em modernaços e pseudo entendidos, vamos exactamente cometer o mesmo erro, vinte anos depois, que é a marca do nosso atraso endémico. Não importa que as comunidades percam o único espaço que os liga à cultura e à aprendizagem - as associações para jogar à bisca e beber copos, não as substituem - nem que se afastem crianças de três anos do seu meio, obrigando-as a viagens diárias de 1 hora , para as atirar para os mega qualquer coisa...é tudo a bem da sustentabilidade que alguns pagam e outros embolsam. Como somos ricos podemos perfeitamente andar atrás dos outros a cometer os seus erros e a navegar à vista. Quando temos um ME incapaz de aprender, como podemos exigir que na escola se aprenda. Em França, pelo menos conseguem ter 8 prémios Nobel da Matemática, e duzentos alunos a entrar por ano numa escola que forma elites...são quantos milhões de habitantes? As taxas de insucesso representam o quê, atingem quem? Mas, pelo menos, têm verdadeiras elites.
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