domingo, 20 de dezembro de 2009

JANELAS COM VIDROS FOSCOS

Reitero de boa vontade o já aqui escrito anteriormente -tenho por Hugo Cristóvão amizade, admiração e respeito. Julgo-o um jovem político muito bem intencionado, realmente preocupado com a prossecução do bem comum. Considero-o, junto com Luís Ferreira e pouco mais, uma esperança do PS tomarense para os anos mais próximos, caso venham a ter coragem para sair atempadamente do atoleiro em que se atascaram, ao celebrarem um acordo invertebrado, sem objectivos nem rumo, para além das lentilhas, do protagonismo e do imediatismo. Não fora assim e nem escreveria uma frase-resposta, quanto mais um texto.
A ilustração acima mostra a posição de Hugo Cristóvão sobre o caso da limpeza da Janela, no seu blogue "Algures aqui". Se quisesse ser cruel, usaria como título desta peça uma interrogação assassina: O poder cega ?
Não o faço pelo exposto anteriormente, mas parece-me que é disso mesmo que se trata. Vejamos.
Cristóvão louva O Templário por ter apurado os factos referentes ao restauro do Convento e à limpeza da Janela, junto das entidades competentes, "ao fim da terceira semana de notícias". Está no seu direito e na verdade O Templário merece o elogio porque produziu uma bela peça noticiosa. Cumpre, porém, para melhor entendimento dos leitores que sabem realmente ler, formular algumas perguntas. Tem a certeza de que sem as "notícias" anteriores e sem o apelo SALVAR A JANELA DO CAPÍTULO, que José Gaio subscreveu, (mas o Cristóvão não), o assunto teria ocupado duas páginas inteiras do referido semanário ? Conhece algum outro caso em que o IGESPAR tenha facultado, directamente e por intermédio da directora do monumento, explicações públicas sobre obras em curso ou a iniciar ? As "notícias" anteriores a que se refere entre aspas, se outro mérito não tiveram, contribuiram pelo menos para esclarecer os tomarenses em dois aspectos importantes: A - Mostraram que, quando devidamente constrangidas no âmbito da mais estrita legalidade, mesmo as entidades com características autistas e altaneiras condescendem em responder aos eleitores inquietos. Defendem os seus pontos de vista ? Claro que sim. Nem outra coisa era de esperar. B - Mostraram igualmente, e sobretudo, que nos casos melindrosos envolvendo organismos governamentais, os tomarenses não podem contar com a actual maioria autárquica, nem com as várias capelinhas dependentes do Orçamento. É pouco ? Veremos, com o tempo...2013 é já ali adiante e o actual mandato já se encaminha para um enterro de luxo.
Resta a posição do ilustre deputado municipal, que noutras circunstâncias poderia ter vindo a ser presidente do órgão fiscalizador local.
Acha que a Janela precisa de ser limpa. Está no seu pleno direito. Todavia, se fundamentasse devidamente tal ponto de vista, talvez não fosse pior. Trata-se afinal de um dirigente político que ocupa dois cargos para os quais foi eleito, mas igualmente de um docente numa área que tem muito a ver com o património...
E depois, a questão não está em limpar ou não limpar a Janela. Trata-se de definir antes, e de forma detalhada, aquilo que se entende por limpeza. Todos concordarão que devem ser removidos os detritos, as ervas e os excrementos das aves, não só agora mas de forma periódica. O problema aparece quando se fala em remover também, "soit disant" por escovagem, os musgos, os líquenes e por aí fora. Coisa que, tanto quanto se sabe, nunca ninguém ousou fazer nos quinhentos anos que já conta aquela construção manuelina, e que comporta riscos elevadíssimos de vir a causar estragos irremediáveis, na opinião de muitos, incluindo pelo menos um especialista em restauro e manutenção de pedra.
" Mas há muito quem saiba. E sobre questões técnicas deve decidir quem tem obrigação de saber -os técnicos."
A verdade é como o azeite na água; por muito que a tentem diluir, acaba sempre por vir à superfície. Há então, na opinião de Cristóvão, "muito quem saiba". A ser realmente assim, onde estavam e o que fizeram quando por limpeza degradaram gravemente uma série de monumentos, entre os quais os Jerónimos e a nossa Ermida da Conceição, conforme já foi documentado nas tais "notícias" ? As coisas não correram bem ? E porquê ? Quais foram as consequências legais dos estragos causados ? Alguém foi responsabilizado ?
Resta a alusão a "quem tem obrigação de saber -os técnicos". Realmente o Cristóvão, manifestamente sem querer, colocou o dedo na ferida. Eles lá terem obrigação de saber, em virtude dos diplomas e da experiência que detêm ou dizem deter, não há dúvida que têm. O pior é que os factos não mentem -eles realmente não sabem nem se mostram capazes de aprender. Só assim se explica que cometam, ou deixem cometer, de forma sistemática, os mesmos erros. Jerónimos, Torre de Belém, Mafra, Senhora da Conceição, exterior do Corredor do Cruzeiro e parte da fachada sul do Convento de Cristo -a lista dos disparates, das "obras que correram mal", apesar de pagas a peso de ouro, começa a ser demasiado longa.
No caso da Janela do Capítulo, a situação é infinitamente mais delicada. Nunca ninguém a limpou profundamente. Nunca ninguém trabalhou em ornatos tão complexos, tão frágeis e tão desconhecidos em termos de natureza do calcário em que foram lavrados. Nestas circunstâncias, vir com a velha história de que só os técnicos é que sabem e só eles é que são competentes, não passa de relambório de ocasião para tentar intrujar uns e intimidar outros. No fim de contas, o apelo supracitado congregou engenheiros civis, engenheiros químicos, farmacêuticos, técnicos de restauro, gestores, empresários, professores, médicos, etc. etc. Tudo ignorantes ? Tudo palonços ? E os que defendem a aludida limpeza ? Tudo gente tecnicamente competente ? Inteligente ? Empenhada realmente na salvaguarda do património ?
Cá por mim, que não sou técnico nem nunca pretendi ou disse ser, volto a repetir que me parece extremamente suspeita a insistência obstinada na limpeza da Janela e da restante construção manuelina, quando há no Convento coisas muitos mais carecidas de reparação urgente. Mas neste país já nada me admira. Com os problemas económicos e sociais gravíssimos que são cada vez mais numerosos e sem solução à vista, os senhores deputados da Assembleia da República resolveram discutir e votar favoravelmente o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Dado que temos o mais baixo índice de natalidade dos 27, era mesmo o que estava a fazer falta. E depois lastimam-se que os cidadãos se vão progressivamente alheando da política. Com eleitos assim...

Sem comentários: