Agora que se iniciou o novo ano escolar, pareceu oportuno publicar a habitual crónica de João Duque, no EXPRESSO - ECONOMIA. Pode ser que contribua para que finalmente os papás se convençam de que se a descendência não é assim muito brilhante, a culpa pode muito bem não ser dos profs de português e de matemática... E se o Ministério da Educação deixasse de ser o Ministério da Facilitação, dando liberdade aos docentes para ensinarem sem se preocuparem com as estatísticas, seria ouro sobre azul.
Caso contrário, tendo em conta as gravosas imposições dos "troiqueiros", sairia bastante mais em conta instalar em cada escola do ensino básico (por agora, mais tarde poderia alargar-se o âmbito) uma máquina automática, emissora de diplomas contra a introdução da importância correspondente. Muito mais expedito, tal sistema permitiria libertar as salas de aula e os profs só para aqueles alunos que querem mesmo aprender. Aos outros bastaria "ir à máquina". E o resultado final não seria diferente.
"Imaginem que num concurso para recrutamento de professores do primeiro ciclo do ensino básico (instrução primária), o director do colégio decidia começar a perguntar aos candidatos, diplomados em ciências da educação, durante as entrevistas de selecção, a tabuada ou os rios do país onde se situa o colégio... Imaginem que, para espanto do director do colégio, tinha candidatos que não sabiam responder a essas perguntas triviais!
Imaginem que nos anos posteriores ao início da aplicação deste procedimento pelo incauto director, os candidatos a esse colégio caem vertiginosamente em quantidade, tudo porque se espalha a ideia de que "se vais lá ele pergunta-te a tabuada" ou, "se te candidatas ao tal colégio, tens de estudar"!
A simples ideia peregrina de perguntar a candidatos a docente do ensino básico a tabuada ou os rios do país já é suficientemente pavorosa para classificar o sistema de ensino que gerou tais professores diplomados em ciências da educação. Mas a ideia do aviso a alguém, adulto e diplomado, de que tem de estudar antes de responder a perguntas sobre a tabuada ou os principais rios do país, deixa-me apavorado.
Infelizmente, este país é Portugal e o colégio situa-se na região do Entroncamento.
A TVI passou uma reportagem sobre a tragédia de um jovem que, aparentando a idade de dezasseis anos, apenas sabe escrever o nome, não sabendo ler nem escrever. Mas o drama nacional é que este jovem está no oitavo ano do ensino regular básico (para quem não sabe, antigo 4º ano do liceu!) e não sabe ler nem escrever. À pergunta da jornalista "E como é que andas no oitavo ano?", ele responde a rir-se e num encolher de ombros: "Não sei! Porque me passaram!"
Se isso é uma tragédia, nem sei como classificar a resposta da responsável pela escola, para justificar a injustificável situação na base da integração do jovem: "Ele tem tido alguma satisfação com a escola; hoje falta menos do que já faltou no passado". E quando acossada pela jornalista, a professora responde abespinhada: "O sistema dá resposta às situações que melhor integrem o crescimento do aluno!"
Este jovem é o Marco, é português, diz saber mais ou menos a data de nascimento e a escola é portuguesa! E sobre a escola responde: "Ai a escola! Para mim é uma morte!"
Se um sistema de educação permite estes dois pequenos exemplos que acabo de relatar está corroído, minado e tem consequências graves irrecuperáveis. Gerações educadas por professores que não sabem a tabuada e que perante erros do tipo 7x8=54, não sabem corrigir, gerações que avançam nos estudos porque o ensino é "integrador do crescimento dos alunos", é um sistema que não serve para nada, porque estes meninos no futuro nem saberão fazer contas para pedirem dinheiro emprestado aos mercados internacionais, de modo a pagarem a sopa importada que têm de comprar.
Nos anos 70, um velho pastor sueco foi julgado em tribunal porque não sabia ler nem escrever. E foi mandado para a escola para cumprir a pena: aprender! Um jovem como o Marco nem emigrante poderá ser um dia, porque não sabe ler ou escrever. E um escritor fantasioso como Ruth Rendell escreve um brilhante livro, aterrador, sobre a matéria: "Julgamento na pedra".
Meu caro Nuno Crato: ou tu dás cabo deles, ou eles dão cabo disto tudo!"
João Duque, jduque@iseg.utl.pt, Expresso - Economia, 17/09/2011
O título, a nota prévia e a conclusão são de Tomar a dianteira
Quem começou a leccionar neste país no tempo de Veiga Simão como Ministro da Educação de Marcelo Caetano, sabe que -salvo circunstâncias excepcionais- cada professor era instado a chumbar pelo menos 20% dos alunos de cada turma. Quarenta anos mais tarde, alteraram-se radicalmente as prioridades. Os professores são constrangidos a passar todos os alunos, pois chumbar algum redunda numa carga de tarefas administrativas susceptível de inibir mesmo o mais corajoso. Assim se enganam os pais, os próprios alunos, os eleitores e os organismos internacionais.
Somos assim e por isso estamos como estamos.
1 comentário:
Inspirado numa reportagem da TVI.. (esqueceram-se de ler nos dentes do Marco a sua idade), o Sr. Duque conta-nos uma história exemplar, a do Marco, português, 16 anos, 8 de escolaride, que não sabe ler e escrever (só o nome) e está no 8º. ano (equivalente ao 4º. ano do Liceu, realça, para evidenciar a desconformidade com o lado peripatético).
O Marco é uma coisa. Para o Duque
o Marco é um calhau de arremesso.
O Duque é Professor Doutor Catedrático e muito mais que pode ser conhecido no seu currículo (ou Ficha Técnica...) em
"http://www.iseg.utl.pt/docentes/docentes.php?opc=6&qual=1139&lang="
É autor de publicações da Ass. Portuguesa de Bancos e foi nomeado por Miguel Relvas para presidente da Comissão de Análise de Serviço Público de Com. Social.
Sabemos agora que é Mestre em Patologia.
E descobriu: o Marco é uma pedra de arremesso. Uma Coisa.
Quase me esquecia: o Duque era residente no "Plano Inclinado".
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