sábado, 6 de agosto de 2011

Parece ser a nossa sina...


Do Diário de Notícias - Revista NS, 06/08/2011, capa e página 30

A experiência adquirida além-fronteiras ensinou-me que parece termos uma sina que nos persegue. Somos muito simpáticos, muito prestáveis, muito hospitaleiros, muito eficazes, muito versáteis, muito sociáveis, mas quando menos se espera, falhamos. O que explica a usual falta de confiança dos estrangeiros em relação ao nosso potencial. Temos pouca credibilidade e ainda menos fiabilidade, enquanto povo, por esse mundo fora.  Desagradável, não é? As coisas, porém, são o que são; não aquilo que gostaríamos que fossem.
Atente-se neste excerto de uma bela peça hoje publicada no DN - Revista NS. No que concerne a Tomar, as fotos são bonitas e o texto até se lê com muito agrado. O pior é que o seu autor se despistou numa longa recta:  "D.  Afonso Henriques, em 1160, entregou aos templários o castelo de Tomar, onde construíram o Convento de Cristo" ?!?!
Dois erros crassos na mesma frase, dão mesmo vontade de citar o Diácono Remédios: "Ai valha-nos Deus!!!"
Para que não subsistam dúvidas, aqui fica a reposição da verdade, tal como consta da vasta bibliografia disponível e ao alcance de qualquer um: 1 - Na sequência da conquista de Santarém, o nosso primeiro rei doou aos templários a igreja de S. Tiago de Santarém e o termo de Ceras - Alviobeira. Só mais tarde, tanto quanto se sabe devido à falta de água, Gualdim Pais decidiu mudar-se para Tomar, onde iniciaram então a edificação do castelo "por nome Thomar", conforme lápide na escadaria do lado direito, quando vista a partir da Porta do Sol. Por conseguinte, D. Afonso Henriques nunca poderia ter dado aos templários uma coisa que, em 1160, ainda não existia. 2 - O chamado Convento de Cristo é afinal o "Convento Novo", o conjunto de construções iniciadas no reinado de D. João III, após a reforma da Ordem de Cristo, em 1529, que a transformou numa congregação de frades, quando antes e durante séculos fora  uma "comandaria" de cavaleiros/comendadores. Esta mudança forçada implicou a expulsão dos anteriores membros da ordem, pelo que estes não tiveram qualquer participação na construção do Convento, mas apenas no Coro Manuelino, uma vez que também o Infante D. Henrique, a partir de 1420 e com a bênção do Papa, lhes forçara um pouco a mão, ao mandar edificar os seus paços, hoje arruinados em grande parte, no espaço entre a alcáçova do castelo e a Charola.
Reposta assim a história tal como veramente acontecida, resta esperar que, doravante, a autarquia providencie aos jornalistas que nos visitam guias com menos imaginação e muito mais leituras. Será pedir demasiado? Afinal está em causa a imagem desta terra, que é de todos nós, em cujo regimento e em tempos idos um cabo de corneteiros foi despachado e, sem o saber, muito premonitório: "Quem sabe, sabe! Quem não sabe passa a corneta a outro, que não há cornetas que cheguem para todos!" Ainda hoje, volvidos mais de 40 anos, a situação se mantém. Há coisas que nunca mudam, mesmo num mundo em acelerada transformação.

Sem comentários: