sábado, 17 de outubro de 2009

NÃO HÁ CAPITALISMO SEM INTERVENÇÃO DO ESTADO

Tem sido o grande tema de discussão por esse mundo fora. De um lado os chamados liberais, que propugnam menos estado, menos burocracia, menos impostos, menos funcionários, menos sindicatos, menos regulamentação da economia e da finança. Do outro os socialistas, os sociais-democratas e os keynesianos, para os quais sem um estado forte e intervencionista, função pública numerosa, sindicatos fortes, segurança social, impostos altos e subsídio de desemprego, não é possível termos um país mais justo para todos.
A recente crise veio mostrar que os liberais não têm razão e que, afinal, a intervenção do estado e as "almofadas sociais" (assistência médica, pensões de reforma, subsídio de desemprego, função pública pesada, ajudas à formação profissional), são condições essenciais para ultrapassar com êxito as crises mais graves, bem como para continuar a permitir o desenvolvimento do capitalismo.
O texto seguinte é da autoria de Pierre Bezback, catedrático de economia na Universidade de Paris IX - Dauphine, uma das grandes escolas francesas de gestão.
"Durante a época dos chamados "trinta gloriosos" (1945/1974), ensinava-se aos estudantes de economia que os ciclos económicos de grande amplitude, e sobretudo as crises, eram coisas do passado. Tinham sido uma característica do capitalismo do século XIX, com a crise de 1929 a constituir o último sobressalto paroxístico dessas doenças agora ultrapassadas.
Quando, em meados dos anos 70, esse crescimento forte e longo foi posto em causa, houve surpresa para a maior parte dos economistas. Explicou-se então o sucedido com um "choque exógeno" -o aumento brutal do preço da energia.
Mas os economistas de obediência liberal explicaram então que esse choque só teve consequências graves devido à rigidez causada por trinta anos de keynesianismo. De acordo com esta tese, a saída da crise estava na desregulamentação, na diminuição da carga fiscal, na reactivação da concorrência, na abertura das fronteiras e na diminuição da importância dos sindicatos. Tudo isto, diziam, tornaria a economia mais reactiva e os agentes económicos mais dinâmicos.
Esta visão das coisas inspirou as políticas económicas seguidas desde o princípio dos anos 80, marcadas pelas privatizações, uma desregulamentação particularmente importante no sector financeiro, bem como a abertura das fronteiras, tornando a concorrência internacional mais viva que nunca.
Esqueceram-se, todavia, que os ciclos e as crises recorrentes que o capitalismo conheceu até aos anos 30, estavam precisamente ligados à forte concorrência de então, à ausência de regulamentação estatal sobre as decisões individuais, à modéstia do esforço fiscal por parte dos cidadãos, bem como ao facto de o Estado se manter quase sempre como mero espectador na área económica (mesmo se, por outro lado, defendia a propriedade privada, proibia as organizações operárias , fechava ou abria as fronteiras e conduzia políticas coloniais mais ou menos activas...).
Esqueceram também as lições da crise de 1929, que suscitou em todos os países o intervencionismo do Estado e regulamentar sem precedentes, na sequência do New Deal nos Estados Unidos.
Esqueceram finalmente que em todos os países o crescimento económico contínuo dos trinta gloriosos deveu-se em grande parte aos investimentos públicos, à estabilização da procura interna, tornada possível pelo aumento do número de funcionários públicos, e ao controle da actividade bancária.
A crise actual mostra de novo que a instabilidade do capitalismo é tanto mais forte quanto o Estado deixa funcionar livremente o mercado. Mostra igualmente que a intervenção do Estado se torna tanto mais importante quanto o capitalismo está mais desenvolvido. O que teria acontecido à economia mundial, se os governos dos grandes países não tivessem injectado somas colossais para ajudar a banca e para relançar a economia ? E se os bancos centrais não tivessem libertado centenas de biliões de dólares e de euros nos mercados monetários ?
Fala-se agora em França num grande empréstimo do Estado, para financiar investimentos estratégicos para o futuro, o que significa claramente que este país só sairá realmente da crise se o Estado voltar a desempenhar o papel que foi o seu durante o dirigismo gaulista (Época em que De Gaulle foi presidente da República).
Não teria sido mais prudente evitar que se criassem as condições que provocaram esta crise, dando demasiada liberdade aos detentores de capitais ?"
Pierre Bezback - Le Monde
Conclusão para o caso de Portugal: Evitam de esperar que o Bloco de Esquerda ou o PCP consigam destruir o capitalismo. Os banqueiros e o Estado acabarão por fazê-lo muito mais rapidamente. É só esperar para ver.
Nota prévia, tradução, adaptação e conclusão de António Rebelo.

2 comentários:

Unknown disse...

Boas.
Cito de memória Karl Marx:"O capitalismo traz no seu seio a génese da sua destruição."

Pensamentos soltos disse...

O capitalismo por incrivel aviva-me a memória, não será preciso andar muito para traz,são memórias de um passado muito recente.