sexta-feira, 16 de outubro de 2009

E OS MÉDICOS ? E OS MÉDICOS ?

Le Monde Education, 14/10/09, página 11

Nota prévia
Na sequência das nossas traduções sobre a formação de professores, houve logo quem nos questionasse sobre os médicos e o ensino da medicina entre nós. O que se compreende. São muito bem pagos, ou pelo menos têm fama disso, consituem uma elite, ainda não estão proletarizados (por enquanto?) e exercem uma profissão cujo acesso é extremamente difícil e artificialmente limitado.
Aqui em Tomar a dianteira, como é sabido, temos os meios de saber e a coragem para o dizer. Fomos por isso procurar e publicamos agora, em duas traduções, parte daquilo que conseguimos.
O quadro acima mostra, da esquerda para a direita e de cima para baixo: 1ª coluna - designação oficial de cada uma das 32 unidades de ensino da medicina em França; 2ª coluna - percentagem dos alunos dessa unidade classificados entre os primeiros mil no concurso de internato (ECN -Prova classificadora nacional); 3ª coluna - relação proporcional professores/alunos nessa mesma unidade de ensino; 4ª coluna -total de professores catedráticos da unidade; 5ª coluna - total de alunos autorizados a matricular-se no 2º ano em cada unidade de ensino.
Resulta deste quadro que, tendo a França um pouco mais de 60 milhões de habitantes, e Portugal 10 milhões, dividindo os totais por 6, obtemos 5 unidades de ensino da medicina em Portugal. Estamos quantitativamente bem. 940 professores catedráticos de medicina. Onde é que eles estão ? 1173 estudantes matriculados no 2º ano de medicina. Alguma vez lá chegaremos ?
Nestas condições, porque é com factos concretos que nos poderemos entender, terão razão os médicos portugueses, quando dizem, aos doentes interessados em ir tratar-se no estrangeiro, "Fazemos tão bem ou melhor que lá fora" ? A dúvida metódica é sempre útil para o progresso da ciência.
"QUANDO AS UNIDADES MÉDIAS DE ENSINO MÉDICO COMPETEM DE IGUAL PARA IGUAL COM AS DE PARIS"
"Os estudantes de medicina, sobretudo os do 6ºano, vão auscultar com muita atenção os resultados do inquérito comparativo realizado pela "Agência de avaliação da investigação científica e do ensino superior (AERES em francês), em 2008, o primeiro deste tipo que se faz em França, a partir das performances em formação e em investigação científica das 32 faculdades de medicina com cursus completo.
Ninguém pode impedir todos aqueles que querem pensar que as faculdades do alto da tabela são melhores que as outras. E no entanto não é assim. Como sublinha a própria AERES, no seu estudo já citado, "as faculdades de medicina não mostram diferenças importantes em pessoal hospitalo-universitário; e os seus respectivos resultados tanto em formação como em investigação, divergem bastante". Assim, um forte enquadramento hospitalo-universitário e numerosas unidades de investigação permitem resultados elevados nessa área, mas não obrigatoriamente na formação dos estudantes. Não é, portanto, porque não dispõe dos meios necessários para desenvolver unidades de investigação, que uma pequena faculdade de província deixa de formar bons médicos.
"Não há uma relação real entre a capacidade para ser um bom médico e o resultado obtido no concurso de internato. Esse concurso mostra quem obteve os melhores resultados, mas não diz se virão a ser igualmente bons médicos", sublinha Jean-François Dhainaut, presidente da AERES.
As tabelas classificativas também não têm em conta nem os critérios sociais, nem os factores geográficos dos estudantes
(estudar em Paris, nos seus arrabaldes ou na província, não são realidades comparáveis). Não será portanto surpreendente que uma grande universidade, com uma importante relação proporcional professor/estudante, obtenha performances de formação superiores às de uma faculdade mais pequena. Assim, o exercício comparativo só é "justo" quando efectuado com critérios similares. Como é que se pode comparar, por exemplo, uma faculdade com mais de 400 professores catedráticos, com uma outra que tem quatro vezes menos ?
Inversamente, este tipo de comparação torna-se muito interessante quando mostra que as faculdades de média dimensão, como Tours, Clermond-Ferrand ou Nantes, que têm só cerca de 130 professores catedráticos e 200 estudantes por ano (do segundo ao sexto, uma vez que a selecção foi efectuada no final do primeiro ano), jogam praticamente de igual para igual com Paris-Descartes, com os seus 461 catedráticos e 377 alunos por ano. Conseguir bons resultados com muitos recursos, é bom. Obter bons resultados com menos recursos, é melhor.
A eficácia das faculdades refere-se unicamente aos resultados dos seus estudantes respectivos nos exames. A sua eficiência, pelo contrário, correlaciona esses mesmos resultados com os meios ao seu dispor, designadamente em enquadramento docente. Noutros termos, à relação proporcional professores catedráticos/alunos admitidos, que é afinal a do numeros clausus.
Consciente dos actuais limites do seu trabalho, a AERES já está a analisar uma nova vaga de questionários, cujos resultados serão talvez tornados públicos no final do ano universitário, e terão em conta factores mais qualitativos e menos numéricos. Para além da comparação entre faculdades, o que interessa à AERES é igualmente encorajar alternativas de formação, para os estudantes que chumbam no final do primeiro ano. "O afluxo de estudantes ao primeiro ano da licenciatura consome meios muito importantes que poderiam ter sido afectados à formação posterior", sublinha Benoît Schlemmer, vice-presidente da Conferência Nacional dos Directores das Faculdades de Medicina.

Ma.D. Le Monde
Nota prévia, tradução e adaptação, António Rebelo

2 comentários:

Unknown disse...

Bom dia.

Se ocorresse uma vez nada diria, seria levado como mera gralha e passaria. Acontece que ocorre três vezes "medecina". Salvo melhor opinião, e qualquer Acordo Ortográfico, deverá escrever-se "medicina".

Penso eu de que...

Sebastião Barros disse...

Os meus agradecimentos ao prezado leitor Caiano Silvestre, a quem agradeço a correcção ortográfica. Errei realmente, coisa que resulta do francês "médecine". Vá sempre escrevendo, amigo Caiano ! E coragem. Amanhã é sempre outro dia !
A.R./S.B.